1 O processo de definição de prioridades de pesquisa e inovação em doenças negligenciadas
 

 

As doenças negligenciadas apresentam alta incidência , geralmente em segmentos mais empobrecidos da população, não obtendo maior visibilidade social. Como conseqüência o investimento em terapêutica, tecnologia para diagnóstico e vacinas é precário e a utilização do recurso disponível é insuficiente.

 

1.1 Apresentação

A aprovação da Agenda Nacional de Prioridades de Pesquisa em Saúde (ANPPS) e da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde (PNCTIS) marcou o início de uma nova etapa de fomento à pesquisa em saúde conduzida pelo Ministério da Saúde.

Essas diretrizes foram amplamente debatidas e pactuadas por gestores e pesquisadores da área da ciência, tecnologia e inovação em saúde, além de representantes do controle social presentes na realização da 2ª Conferência, Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde (2ª cnctis ), no ano de 2004.

As ações de fomento adotadas pelo Departamento de Ciência e Tecnologia - Decit, órgão responsável por fomentar pesquisa em saúde no âmbito do Ministério da Saúde, passaram a ser pautadas por essas diretrizes.

Para viabilizar a implementação da ANPPS e da PNCTIS tornou-se necessária a ampliação das parcerias. Destacam-se as participações do CNPq e da FINEP que contribuiu qualitativamente com a sua experiência na área do fomento à pesquisa, e das áreas técnicas do Ministério da Saúde, que apontaram as necessidades de estudos para aperfeiçoamento das políticas. É importante ressaltar também a participação da academia, sempre que solicitada, com contribuições importantes para a diversificação e o refinamento dos métodos utilizados para a definição de prioridades de pesquisa em saúde.

Em 2006, é claramente intensificado o processo de busca por metodologia mais adequada para a definição de prioridades de pesquisa em saúde. Em março de 2006 o Decit coordenou a realização da oficina Prioridades de Pesquisa em Saúde: Editais Temáticos 2006.

Para apoiar a utilização da metodologia foi convidado o professor Andrés de Francisco, representante do Global Forum For Health Research .

Apesar da diversidade dos temas abordados, a experiência foi bem sucedida, resultando na definição de prioridades de pesquisa para todos os temas, com importante pactuação e consenso entre gestores e pesquisadores, rendendo significativos subsídios para o aperfeiçoamento do processo.

“A PNCTIS pauta-se por três princípios constitucionais: universalidade, integralidade e eqüidade. A aplicação desses princípios deve corresponder ao compromisso político e ético para com a produção e à apropriação de conhecimentos e tecnologias que visem contribuir para a redução das desigualdades sociais em saúde, em consonância com o controle social” PNCTIS.

A composição do elenco de temas prioritários definidos pela ANPPS considerou esses princípios e o Decit tem pautado suas ações objetivando contribuir para a melhoraria da equidade em saúde e diminuir as desigualdades regionais e sociais. Esse esforço pode ser percebido na seleção dos temas para compor os editais de 2006. Foram lançados editais nos temas: Determinantes sociais em saúde, Populações vulneráveis - abrangendo saúde da população negra, saúde da pessoa com deficiência, população masculina e envelhecimento populacional de saúde da pessoa idosa, complementando-se com edital dedicado às doenças negligenciadas.

Além das iniciativas nacionais existe um movimento internacional expresso pelo relatório publicado pela Commission on Health Research and Development, em 1990, que aponta a necessidade de pautar as questões referentes às doenças negligenciadas. Esse documento representa um marco para a discussão sobre o tema, principalmente porque demonstrou o “desequilíbrio 90/10” onde somente 10% dos investimentos em P&D são direcionados para os problemas de saúde de 90 % da população mundial”. OMS, Comissão de Macroeconomia e Saúde, 2000.

Este relatório contribuiu para a criação do Fórum Global para a Pesquisa em Saúde, em 1996, e até hoje significa importante registro sobre a insuficiência de recursos para P&D em doenças da pobreza. Em que pesem muitas iniciativas serem implementadas ou financiadas para contrabalançar este desequilíbrio, essas áreas permanecem profundamente carentes de recursos.“ OMS, Comissão de Macroeconomia e Saúde, 2000.

As doenças negligenciadas apresentam alta incidência , geralmente em segmentos mais empobrecidos da população, não obtendo maior visibilidade social. Como conseqüência o investimento em terapêutica, tecnologia para diagnóstico e vacinas é precário e a utilização do recurso disponível é insuficiente.

Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), por intermédio do relatório da Comissão da OMS – Macroeconomia e Saúde no ano de 2000, essas doenças podem ser distribuídas em dois grupos , de acordo com as características:

Grupo 1: Doenças negligenciadas
  • Incidem em países ricos e pobres, mas uma grande proporção dos casos está nos países em desenvolvimento - HIV/AIDS, Tuberculose.
  • Existem alguns incentivos de mercado para P&D nos países desenvolvidos, mas o nível de investimento não é proporcional à carga global da doença.
Grupo 2: Doenças mais negligenciadas
  • Incidem exclusivamente ou primordialmente nos países em desenvolvimento. Ex: Doença do Sono, Doença de Chagas, Leishmanioses, Esquistossomose.
  • Quase não existem incentivos para P&D e essas doenças praticamente não são objeto de pesquisa pelos países desenvolvidos.

Nesse contexto, de acordo com a Agenda Nacional de Pesquisa em Saúde (ANPPS) e reiterando a importância do Ministério da Saúde apoiar a realização de pesquisas nessa área, o Departamento de Ciência e Tecnologia (Decit) programou uma chamada pública dedicada às doenças negligenciadas.

Diante da complexidade da discussão, a direção do Decit convidou para coordenar o processo o diretor do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS/FIOCRUZ), professor Carlos Morel que, além de reconhecida experiência nacional e internacional em doenças negligenciadas, foi também coordenador do Programa Especial de Pesquisa e Treinamento em Doenças Tropicais da OMS (TDR/OMS), por um longo período.