1.2 Metodologia
 

As prioridades de P&D&I identificadas no processo analítico podem ser relacionadas com a necessidade de combate a três tipos de “falhas” – de ciência, de mercado ou de saúde pública – pelo desenvolvimento de diferentes tipos de inovações em saúde.

 

Início do Processo

O primeiro passo para concretização da iniciativa foi a definição da cooperação técnica entre o Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS/FIOCRUZ) e o Decit. Em seguida, para organização do processo, foi realizada uma reunião colegiada, com a participação das instituições coordenadoras do processo e especialistas convidados para representar cada agravo e áreas técnicas do Ministério da Saúde.

Nessa reunião surgiram e foram pactuadas as estratégias para realização de uma oficina de trabalho, de âmbito nacional, com o objetivo de conhecer o estado da arte e definir as prioridades de pesquisa para cada doença.

Definição do elenco de doenças negligenciada

Uma decisão importante, e que exigiu muita discussão, referiu-se à seleção do elenco de doenças negligenciadas a ser contemplado na chamada pública. Para elucidar a questão resgatou-se a evolução histórica do conceito de Doenças Negligenciadas, quando foi lembrado que essa discussão teve inicio em 1977, com a Fundação Rockefeller instituindo o Programa Great Neglected Diseases of Mankind que durou até o ano 2000. Nesse contexto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e os Médicos Sem Fronteiras (MSF) propuseram classificar as doenças em Globais, Negligenciadas e Mais Negligenciadas.

Inicialmente, foram consideradas as 10 doenças definidas atualmente pelo Programa Especial de Pesquisa e Treinamento em Doenças Tropicais da OMS (TDR/OMS) como negligenciadas e, a partir desse elenco, foram selecionadas as seis doenças prioritárias em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em Saúde.

Critérios para a Composição dos grupos de trabalho

O critério de escolha para a seleção dos pesquisadores participantes da fase preparatória da oficina de trabalho foi baseado na análise de produtividade de suas publicações no período 2000-2006, segundo o Web of Knowledge do Institute for Scientific Information relativos a cada doença negligenciada selecionada.

Para compor os grupos de trabalho da Oficina foi adotado o mesmo critério. A seleção dos gestores para compor os grupos de trabalho foi definida em conjunto com as áreas de controle de doenças e gestão de programas do Ministério da Saúde.

Percurso metodológico

A discussão passou a ser subsidiada pelo estudo de priorização de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em doenças negligenciadas, estudo esse desenvolvido por instituições internacionais, a partir da década de 90. O estudo propõe a categorização em dois modos: Modos 1 e 2 para compreender a geração de conhecimento, conforme detalhamento e adaptação constante do quadro abaixo:

1994: Diferentes modos de produção de conhecimento:

Modo 1 – Os problemas são identificados e resolvidos num contexto acadêmico que obedece a interesses de comunidades específicas.

Ex: CNPq, HHMI

Modo 2 – A busca do conhecimento visa uma aplicação prática

Ex: TDR, FINEP/MCT, Decit/MS e indústria.

Essa iniciativa, parceria do Departamento de Ciência e Tecnologia/MS (Decit) com a cooperação técnica do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde – (CDTS/FIOCRUZ) para Doenças Negligenciadas, encontra-se inserida no Modo 2. A expectativa é de que esse esforço resulte em aplicações práticas dos produtos da pesquisa, incentivo à transdisciplinaridade, com composição de equipes heterogêneas e controle de qualidade com critérios sociais, políticos e econômicos.

1997: O Quadrante de Pasteur e a pesquisa “inspirada no uso”

  • Fracasso do modelo linear que separa a pesquisa básica da aplicada
  • Ciência básica
  • Necessária? SIM
  • Necessária e suficiente? NÃO
  • Um novo modelo:
  • O plano conceitual bidimensional (Stokes, 1997)

Para o método do TDR, as 10 doenças negligenciadas podem ser agrupadas em 3 categorias conforme descrição abaixo:

Categoria 1 - Doença do sono – Dengue - Leishmaniose
  • Doenças emergentes ou fora de controle.
  • O foco deve ser na geração de novos conhecimentos e no desenvolvimento de novas intervenções e sistemas.
Categoria 2 - Malária – Esquistossomose - Tuberculose
  • Apesar de existir uma estratégia de controle, a carga da doença persiste.
  • As atividades de P&D cobrem um amplo espectro, mas estão focadas no desenvolvimento e testes de novas intervenções e estratégias.
Categoria 3 - Doença de Chagas – Hanseníase – Filariose e Oncocercose

As estratégias de controle são eficazes, a carga da doença diminui e planeja-se sua eliminação como problema de saúde pública.

A pesquisa procura melhorar as atuais atividades de controle e eliminar os riscos.

Para Morel, 2006 as três categorias necessitam de estratégias distintas de intervenção conforme demonstra a matriz abaixo:

 

Disability Adjusted Life Years -(DALY) - Anos de vida perdidos ajustados por incapacidade .

Uma contribuição fundamental para análise epidemiológica de cada agravo deu-se com a utilização da base conceitual do Estudo de carga Global de doenças cujo indicador empregado é o (DALY) Disability Adjusted Life Years - Anos de vida perdidos ajustados por incapacidade. O estudo foi fundamental para a compreensão da morbi-mortalidade das doenças crônico-degenerativas e transmissíveis e a equipe da ENSP/FIOCRUZ que coordenou esse trabalho no ano de 1998 apresentou na oficina de trabalho o potencial da metodologia e destacou os resultados significativos sobre a saúde no Brasil obtidos a partir da utilização do método.

Critérios de priorização do Programa Especial de Pesquisa e Treinamento em Doenças Tropicais da OMS (TDR/OMS)

Os critérios de priorização desenvolvidos pelo Programa Especial de Pesquisa e Treinamento em Doenças Tropicais da OMS (TDR/ OMS) em P&D nortearam a definição de prioridades de pesquisa em doenças negligenciadas. Com o objetivo de compor um marco referencial para cada doença selecionada e que contemplasse a categorização da doença, matriz estratégica e produtos específicos, foi adotado o “Processo em 7 Etapas” inscrito na priorização de P&D do documento TDR. O instrumento consiste em um roteiro de perguntas para elucidar o problema e contextualizar a situação de cada doença, conforme descrição abaixo:

Categorização da doença

  • Qual o tamanho e a natureza da carga da doença, e qual a sua tendência epidemiológica?
  • Qual é a estratégia de controle da doença?
  • Por que persiste a carga da doença?
  • Quais são as necessidades e as prioridades de P&D?
  • O que já está sendo feito em P&D?

Matriz estratégica

  • Quais as vantagens comparativas do TDR?
  • Definição das prioridades estratégicas para a doença em tela.

Percorrida toda essa etapa, estabelecidas as bases conceituais e definida a metodologia mais adequada para a eleição de prioridades de pesquisa em doenças negligenciadas, elaborou-se o roteiro para discussão dos grupos de trabalho, como segue:

Roteiro para discussão dos grupos

Processo analítico

  1. Qual a natureza e o tamanho da Carga da Doença e quais as tendências epidemiológicas?
  2. Quais são as atuais intervenções disponíveis e as estratégias de controle da doença?
  3. Quais os maiores problemas e desafios no controle da doença?
  4. Quais atividades de P&D&I seriam necessárias para enfrentar esses problemas e desafios?
  5. Quais atividades de P&D&I já estão em andamento? Existem novas oportunidades?
  6. Quais seriam as atividades de P&D&I em que o Programa Doenças Negligenciadas teria uma vantagem comparativa de atuação, em comparação com programas já existentes?
  7. Quais devem ser as prioridades específicas de P&D&I a constarem do próximo Edital Decit?
  8. Que recomendações encaminharia ao Decit sobre estratégias de financiamento:
  9. Projetos de grande, médio ou pequeno porte?
  10. Apoio individual ou redes?
  11. Estudos multicêntricos?
  12. Apoio a grupos emergentes?

Como devem, prioritariamente, ser investidos os 30% dos recursos do Edital que obrigatoriamente têm que ser aplicados nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste?

Natureza das inovações desejadas

As prioridades de P&D&I identificadas no processo analítico acima podem ser relacionadas com a necessidade de combate a três tipos de “falhas” – de ciência, de mercado ou de saúde pública – pelo desenvolvimento de diferentes tipos de inovações em saúde , de acordo com o esquema abaixo:

 
Tipo de “falha”
Causas
Exemplos
Necessidades
Modalidades de inovação
Exemplos
Ciência Conhecimento insuficiente impede o desenvolvimento de intervenções sanitárias eficazes Não sabemos ainda como desenvolver vacinas contra doenças parasitárias; “hiato 90/10” Mais pesquisa básica ou estratégica; maior envolvimento do setor produtivo Novos produtos, novas estratégias de P&D&I Bioinformática, genômica na identificação de novos alvos e drogas como fosmidomicina; PDPs; Lei de Inovação 2004
Mercado Custos elevados de intervenções existentes restringem uso ou acesso por populações marginalizadas Alto custo de medicamentos antiretrovirais e de combinações de antimaláricos DT de processos mais baratos de produção; novas estratégias de financiamento Novos métodos e processos; Novas estratégias de financiamento; Novas políticas orçamentárias Parcerias para o desenvolvimento de produtos; Fundos Globais; CPMF; filantropia; doação de medicamentos
Saúde Pública Incompetência, descaso, crises, guerras, corrupção, fatores culturais ou religiosos impedem acesso a intervenções baratas ou mesmo gratuitas Dificuldades na erradicação da pólio; oposição das indústrias de alimentos e de fumo a estratégias de combate à obesidade e ao tabagismo Controle social; educação; participação da sociedade civil; políticas de direitos humanos; boas práticas Processos; estratégias; políticas Dias nacionais de vacinação; campanhas por mais exercício físico; Convenção da OMS contra o tabaco