Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial da União
O Secretário de Atenção à Saúde, no uso de suas atribuições,
Considerando a importância do papel que desempenham os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) para a melhoria da qualidade da atenção à saúde, para a prescrição segura e eficaz, para a atualização e democratização do conhecimento, para a melhoria da qualidade da informação prestada aos doentes e para a melhoria dos processos gerenciais dos programas assistenciais;
Considerando a necessidade de se estabelecer critérios de diagnóstico e tratamento de enfermidades, e, observando ética e tecnicamente a prescrição médica, promover o uso racional dos medicamentos para o tratamento de doenças por meio de regulamentação de indicações e esquemas terapêuticos;
Considerando que os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas são resultado de consenso técnico-científico e são formulados dentro de rigorosos parâmetros de qualidade, precisão de indicação e posologia;
Considerando a necessidade de estabelecer mecanismos de acompanhamento de uso e de avaliação de resultados, garantindo assim a prescrição segura e eficaz;
Considerando a necessidade de se promover ampla discussão desses Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, possibilitando a participação efetiva, na sua formulação, da comunidade técnico-científica, associações médicas, profissionais da saúde, associações depacientes, usuários e gestores do Sistema Único de Saúde (SUS) e da população em geral;
Considerando a necessidade de atualizar o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas - Doença de Gaucher, estabelecido pela Portaria SAS/MS nº 449, de 08 de julho de 2002; e
Considerando a Portaria SAS/MS nº 375, de 10 de novembro de 2009, que aprova o roteiro a ser utilizado na elaboração de PCDT, no âmbito da Secretaria de Atenção à Saúde - SAS, resolve:
Art. 1º Submeter à Consulta Pública o PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS - DOENÇA DE GAUCHER, constante do Anexo deste Ato e o Termo de Esclarecimento e Responsabilidade dele integrante.
Parágrafo único. O Protocolo Clínico e o Termo de Esclarecimento e Responsabilidade, de que trata este Artigo, encontramse disponíveis, também, no sítio: www.saude.gov.br/sas.
Art. 2º Estabelecer o prazo de 40 (quarenta) dias a contar da data da publicação desta Consulta Pública, para que sejam apresentadas sugestões, devidamente fundamentadas, relativas ao Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas de que trata o art. 1º desta Consulta Pública.
§ 1º As sugestões devem ser encaminhadas, exclusivamente, para o seguinte endereço eletrônico: pcdt.consulta2010@saude.gov.br, especificando o número da Consulta Pública e o nome do Protocolo no título da mensagem.
§ 2º As sugestões enviadas deverão, obrigatoriamente, estar fundamentadas em:
I. Estudos Clínicos de fase III - realizados no Brasil ou exterior; e
II. Meta-análises de Ensaios Clínicos.
Art. 3º Determinar que a Secretaria de Atenção à Saúde, por meio do Departamento de Atenção Especializada, coordene a avaliação das proposições apresentadas, elaborando a versão final consolidada do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas ora submetido à Consulta Pública, para que, findo o prazo estabelecido no art. 2º deste Ato, seja aprovado e publicado, passando a vigorar em todo o território nacional.
Art. 4º Estabelecer que, durante o período da consulta pública, e até que seja publicada a versão final consolidada, as Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios deverão utilizar as Diretrizes Terapêuticas ora submetidas à consulta, no que couber, na regulação assistencial.
Art. 5º Esta Consulta Pública entra em vigor na data de sua publicação.
ANEXO
PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS
DOENÇA DE GAUCHER
1. METODOLOGIA DE BUSCA DA LITERATURA
Foram utilizadas as bases de dados Medline/Pubmed, EMBASE e livros-texto de Medicina, limitadas aos idiomas inglês, português e espanhol e ao período de publicação (até 06/08/2010). Dados não publicados foram obtidos por meio da revisão de relatórios submetidos pelos fabricantes às agências reguladoras de medicamentos.
Busca na base de dados Medline/Pubmed:
Utilizando-se os termos "Gaucher disease"[Mesh] AND "Therapeutics"[Mesh] restringindo-se para artigos em humanos, utilizando-se os filtros "Clinical Trial", "Meta-Analysis", "Practice Guideline", "Randomized Controlled Trial", "Review", "Guideline" e "Controlled Clinical Trial", obteve-se 105 artigos.
Busca na base de dados EMBASE:
Utilizando-se os termos 'Gaucher disease'/exp AND 'Therapy'/exp, restringindo-se para artigos em humanos, utilizando-se os filtros [cochrane review]/lim OR [controlled clinical trial]/lim OR [meta analysis]/lim OR [randomized controlled trial]/lim OR [systematic review]/lim, obteve-se 51 artigos, sendo três repetidos. Dos 49 artigos identificados no EMBASE, quarenta e dois eram diferentes daqueles identificados no Medline/Pubmed.
Busca em livros-texto:
O livro UpToDate, disponível no site www.uptodateonline.com, versão 18.2 foi consultado no dia 06/08/2010. Foram utilizados os capítulos referentes às manifestações clínicas e tratamento da doença de Gaucher.
Escolha dos artigos para inclusão no PCDT:
Todos os artigos e relatórios foram revisados, sendo incluídos neste PCDT aqueles que versavam sobre estratégias de tratamento medicamentoso da doença de Gaucher. Assim sendo, este PCDT aborda duas estratégias de tratamento para a doença de Gaucher: a terapia de reposição enzimática (ou terapia de substituição enzimática) com imiglucerase, alfavelaglicerase ou taliglucerase alfa, e a terapia de inibição de síntese de substrato (ou terapia de redução de substrato) com miglustate.
2. INTRODUÇÃO
A doença de Gaucher (DG) é a mais comum das glicoesfingolipidoses e a primeira a ter tratamento específico com terapia dereposição enzimática (TRE). É uma doença autossômica recessiva, causada pela atividade deficiente da enzima beta-glicosidase, que compromete o metabolismo lipídico resultando em acúmulo de glicocerebrosideo nos macrófagos1-9. As principais manifestações clínicas da DG decorrem do comprometimento hematológico (anemia, plaquetopenia), visceral (hepatomegalia, esplenomegalia) e esquelético (dor óssea, osteopenia). Segundo o Departamento de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde, existem atualmente 610 pacientes com DG em tratamento com terapia de reposição enzimática no Brasil.
Três formas clínicas da DG são reconhecidas:
- Tipo 1 (não neuronopática ou forma crônica não-neuronopática do adulto): é a forma mais freqüente da DG. Os pacientes podem ser assintomáticos ou apresentar graus variados de hepatoesplenomegalia, manifestações hematológicas e envolvimento ósseo. A sobrevida dos pacientes pode ser semelhante à da população nor-mal(6).
- Tipo 2 (neuronopática aguda ou forma infantil neuronopática): é associada com hepatoesplenomegalia, alterações neurológicas graves e morte, usualmente nos primeiros 2 anos de vida. Não há evidência de eficácia do tratamento específico (terapia de reposição enzimática ou inibição de síntese de substrato) nesta forma da doença(2-5).
- Tipo 3 (neuronopática subaguda ou forma juvenil neuronopática): as manifestações clínicas (hepatoesplenomegalia, anemia/trombocitopenia e envolvimento ósseo) iniciam geralmente na infância e costumam ser mais graves que aquelas apresentadas pelos pacientes com o tipo 1, além de estarem associadas à disfunção neurológica lentamente progressiva. O óbito ocorre geralmente entre a segunda e a quarta década de vida (1-5;7-9).
2.1. CRITÉRIOS DE GRAVIDADE
A gravidade da DG é variável mesmo considerando a mesma forma clínica. Será considerado portador de DG grave, para fins deste protocolo, aquele paciente que apresentar pelo menos uma das manifestações clínicas abaixo relacionadas - desde que secundárias à DG- e que são reversíveis ou passíveis de melhora com o tratamento:
a) sintomas gerais incapacitantes: dores ósseas NÃO decorrentes de lesão óssea irreversível (tais como osteonecrose, osteosclerose, e compressão vertebral), dor abdominal, fadiga, limitação funcional aeróbica caracterizada por dispnéia aos médios ou grandes esforços ou caquexia;
b) hepatomegalia grave (quando o fígado atingir a fossa ilíaca);
c) esplenomegalia grave (quando o baço atingir a fossa ilíaca);
d) contagem de plaquetas igual ou menor do que 20.000/mm3;
e) contagem de plaquetas entre 20.000 e 50.000/mm3, desde que associada a episódios recorrentes de sangramento, que devem ser clinicamente significativos e secundários à DG, devendo ser comprovados por laudo médico;
f) hemoglobina menor do que 8 g/dL;
g) falência renal (clearance da creatinina menor do que 30 ml/kg/min), secundária à DG;
h) acometimento hepático (aumento de, no mínimo, duas vezes de AST e ALT, ou prolongamento do tempo da protrombina (abaixo de 70% em relação ao controle), tendo sido descartadas hepatites infecciosas, uso de medicamentos como anticoncepcionais e de antiinflamatórios não-esteroides como causa dessas alterações;
i) acometimento cardio-pulmonar clinicamente significativo, evidenciado, respectivamente, por meio de ecocardiograma ou radiografia simples ou espirometria, secundário à DG;
j) mieloma múltiplo;
h) DG tipo 3.
3. CLASSIFICAÇÃO ESTATÍSTICA INTERNACIONAL DE DOENÇAS E PROBLEMAS RELACIONADOS À SAÚDE (CID-10)
- E75.2 Outras esfingolipidoses - doença de Gaucher
4. DIAGNÓSTICO
As típicas células de Gaucher são encontradas na medula óssea, no tecido esplênico ou no tecido hepático. Entretanto, células similares têm sido descritas em muitas outras doenças (3-4). O método de escolha para o diagnóstico da DG é a medida da atividade da enzima beta-glicosidase, por ensaio fluorométrico, em leucócitos do sangue periférico. Em indivíduos afetados, a atividade da beta-glicosidase em leucócitos costuma ser 0%-15% da atividade normal, mas os valores de referência variam de acordo com o laboratório executor 2 - 8 , 10 - 11. Em casos duvidosos, está indicada a realização da medida da atividade da beta-glicosidase em fibroblastos ou a análise do gene GBA. Na presença de valores duvidosos também em fibroblastos, deve ser realizada a análise do gene GBA. Como as mutações p.L444P e N370S correspondem à maioria dos alelos dos pacientes brasileiros, recomenda-se, nos casos que permaneçam duvidosos após a análise da atividade enzimática em fibroblastos, que a análise do gene GBA inicialmente inclua a pesquisa destas duas mutações. A presença dos genótipos p.N370S/370S, p.N370S/L444P e p.L444P/L444P confirma o diagnóstico de doença de Gaucher. A probabilidade de persistência de dúvida diagnóstica com a aplicação desta estratégia é reduzida; caso isto aconteça, os pacientes deverão ser encaminhados para avaliação em serviços especializados referenciais.
Para o diagnóstico clínico, é necessária a existência de manifestações clínicas associadas à DG. Em relação à doença tipo 3, a possibilidade dos sinais neurológicos serem secundários à outra doença (por exemplo, paralisia cerebral por hipóxia perinatal) deve ser excluída.
5. CRITÉRIOS DE INCLUSÃO
5.1. PARA TRATAMENTO COM TERAPIA DE REPOSIÇÃO ENZIMÁTICA (TRE)
Serão incluídos neste protocolo de tratamento da DG com TRE os pacientes que apresentarem todos os critérios maiores e pelo menos um dos critérios menores abaixo relacionados.
5.1.1. CRITÉRIOS MAIORES
a) Diagnóstico clínico de DG tipo 1 ou tipo 3. O diagnóstico clínico pressupõe a existência de manifestações clínicas associadas à DG. Em relação à doença tipo 3, a possibilidade dos sinais neurológicos serem secundários à outra doença (por exemplo, paralisia cerebral por hipóxia perinatal), o que deve ser realizado por meio de avaliação clínica;
b) Diagnóstico bioquímico de DG, realizado por meio da demonstração de redução significativa da atividade da enzima betaglicosidase em leucócitos ou fibroblastos, ou diagnóstico molecular de DG, conforme descrito no item 4 deste Protocolo.
5.1.2 CRITÉRIOS MENORES
a) Anemia caracterizada por hemoglobina menor que 10 g/dL, excluídas outras causas de anemia;
b) Plaquetopenia caracterizada por contagem de plaquetas menor que 50.000/mm3, excluídas outras causas de plaquetopenia;
c) Sangramento espontâneo ou em decorrência de trauma mínimo, excluídas outras para tanto;
d) Hepatomegalia ou esplenomegalia moderadas ou graves, de acordo com achados de exame físico (palpação e percussão) e de ecografia abdominal. Hepatomegalia e esplenomegalia serão consideradas moderadas quando o fígado/baço forem palpáveis entre umbigo e pelve, e grave quando atingirem a fossa ilíaca;
e) Sinais radiológicos de comprometimento esquelético reversível (tais como osteopenia, osteoporose, infiltração da medula óssea, deformidade em frasco de Erlenmeyer);
f) Sintomas gerais incapacitantes: dores ósseas NÃO decorrentes de lesão óssea irreversível (tais como como osteonecrose, osteosclerose, e compressão vertebral), dor abdominal, fadiga, limitação funcional aeróbica caracterizada por dispnéia aos médios ou grandes esforços ou caquexia;
g) Crescimento inapropriado: menores de 19 anos com velocidade de crescimento abaixo do percentil 25 ou estatura com me-nos de dois desvios padrão para a idade e sexo por pelo menos 6 meses. Para aferição do crescimento, deverão ser utilizadas as seguintes curvas de crescimento da OMS: curva de evolução da estatura de acordo com a idade/sexo de zero a 5 anos (13) e curva de evolução da estatura de acordo com a idade/sexo de 5 a 19 anos (14);
h) Comprometimento de pelo menos um dos seguintes órgãos, desde que atribuíveis à DG: coração (as alterações devem ter sido evidenciadas por ecocardiograma), pulmão (as alterações devem ter sido evidenciadas por raio X e ou espirometria) ou rim (presença de proteinúria e ou aumento da creatinina);
i) Mieloma múltiplo;
j) Esplenectomia;
l) DG tipo 3.
5.2. TERAPIA POR INIBIÇÃO DE SÍNTESE DE SUBSTRATO
Serão incluídos neste protocolo de tratamento da DG com inibição de síntese de substrato os pacientes que apresentarem todos os critérios abaixo relacionados:
a) Diagnóstico clínico de DG tipo 1 ou tipo 3. O diagnóstico clínico pressupõe a existência de manifestações clínicas associadas à DG. Em relação à doença tipo 3, a possibilidade dos sinais neurológicos serem secundários à outra doença (por exemplo, paralisia cerebral por hipóxia perinatal), o que deve ser realizado por meio de avaliação clínica;
b) Diagnóstico bioquímico de DG, realizado por meio da demonstração de redução significativa da atividade da enzima betaglicosidase em leucócitos ou fibroblastos, ou diagnóstico molecular de DG, conforme descrito no item 4 deste Protocolo.
c) Possuir idade igual ou superior a 18 anos;
d) Apresentar condição médica que contra-indique o uso de TRE, tais como: reação de hipersensibilidade à TRE mediada por IgE; reação grave à TRE de acordo com o julgamento do médico assistente. A ocorrência dessas condições deve estar documentada por meio de laudo médico.
6. CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO
6.1. TRE COM IMIGLUCERASE
Serão excluídos do protocolo de tratamento da DG com TRE com imiglucerase os pacientes que apresentarem ao menos uma das seguintes situações:
a) DG tipo 2;
b) DG assintomática (10-12);
c) DG oligossintomática, ou seja, pacientes com manifestações clínicas leves e que não apresentem quaisquer dos critérios menores relacionados nos itens 5.1;
d) reação de hipersensibilidade a algum dos componentes da imiglucerase.
6.2. TRE COM ALFAVELAGLICERASE
Serão excluídos do protocolo de tratamento da DG com TRE com alfavelaglicerase os pacientes que apresentarem ao menos uma das seguintes situações:
a) DG tipo 2;
b) DG assintomática (10-12);
c) DG oligossintomática, ou seja, pacientes com manifestações clínicas leves e que não apresentem quaisquer dos critérios menores relacionados nos itens 5.1;
d) reação de hipersensibilidade a algum dos componentes da alfavelaglicerase.
6.3. TRE COM TALIGLUCERASE ALFA
Este Protocolo prevê o uso rotineiro de taliglucerase alfa somente após a sua aprovação e registro pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Serão excluídos do protocolo de tratamento da DG com TRE com taliglucerase alfa os pacientes que apresentarem ao menos uma das seguintes situações:
a) DG tipo 2;
b) DG assintomática (10-12);
c) DG oligossintomática, ou seja, pacientes com manifestações clínicas leves e que não apresentem quaisquer dos critérios menores relacionados nos itens 5.1;
d) reação de hipersensibilidade a algum dos componentes da taliglucerase alfa;
e) idade inferior a 18 anos - o uso de taliglucerase alfa em pacientes nessa faixa etária é excepcional.
6.4. ISS COM MIGLUSTATE.
Considerando o tratamento com inibidor de síntese de substrato, serão excluídos do protocolo de tratamento os pacientes que apresentarem ao menos uma das seguintes situações:
a) DG tipo 2;
b) gestantes;
c) idade inferior a 18 anos;
d) reação de hipersensibilidade ao medicamento ou reação anafilática.
7. CENTROS DE REFERÊNCIA
Recomenda-se a estruturação de serviço especializado referencial e composto por equipe multidisciplinar capacitada para desempenhar as seguintes funções:
- avaliar todas as solicitações de início de tratamento;
- administrar os medicamentos de TRE, pelo menos durante os primeiros seis meses de tratamento - após este período, pode ser considerada a possibilidade de transferência das infusões para um local mais próximo da residência do paciente;
- avaliar todos os casos de mudanças de doses ou de estratégia de tratamento (TRE ou inibição de síntese de substrato);
- realizar monitoramento/acompanhamento dos pacientes; e
- avaliar todos os casos especiais.
8. TRATAMENTO
O tratamento da DG envolve o tratamento de suporte e o tratamento específico. A primeira conduta inclui medidas como: 1) realização de aconselhamento genético; 2) tratamento sintomático (por exemplo, uso de analgésicos para controle da dor óssea; uso de bisfosfonados para controle da osteoporose; uso de anticonvulsivantes); e 3) terapia de reabilitação, no caso de pacientes com DG tipo 3.
São duas as estratégias atualmente utilizadas para tratamento específico da DG: a TRE e a inibição de síntese de substrato. A TRE é a estratégia mais antiga e específica (e, por isto, mais segura) consistindo na administração endovenosa (quinzenal) de formas artificiais (recombinantes) da enzima (beta-glicosidase) que o paciente com DG não produz em quantidade suficiente. A reposição da enzima possibilita a conversão do substrato da mesma (glicocerebrosídeo) em seu produto (lactosilceramida), diminuindo o acúmulo do glicocerebrosídeo e, conseqüentemente, o desenvolvimento de toda a cascata de eventos bioquímicos que acabam por ocasionar as manifestações clínicas apresentadas pelos pacientes.
O mecanismo de ação dos inibidores de síntese de substrato (miglustate) é diferente. O miglustate é um imino açúcar análogo à glicose, que age como inibidor da atividade da glicosilceramida sintase, enzima que converte ceramida em glicocerebrosídeo; a inibição desta enzima pelo miglustate ocasiona redução da síntese de glicocerebrosídeo e de todos os glicoesfingolipídeos dele derivados. Portanto, a diminuição da concentração intracelular do glicocerebrosídeo seria decorrente da inibição da sua síntese e não da sua conversão em lactosilceramida, como ocorre na TRE. O miglustate além de interferir na síntese de um componente importante da célula neuronal (o glicocerebrosídeo), inibe, também, outras enzimas (como as dissacaridases intestinais) e tem efeito chaperona (segundo estudos in-vitro, pode aumentar a atividade de enzimas como a beta-glicosidase (15), de forma que o seu efeito não se restringe à rota metabólica afetada pelo DG. Isto, pelo menos em parte, parece explicar os efeitos adversos associados ao uso deste medicamento16. Embora, do ponto de vista teórico, o miglustate seja potencialmente vantajoso em relação à TRE quanto à penetração na barreira hemato-encefálica e osso, por ser uma molécula menor, não existem evidências suficientes, no momento, que embasem estas hipóteses ou o uso concomitante de ambas as estratégias de tratamento. As evidências atualmente disponíveis sugerem que TRE é superior à inibição de síntese de substrato, e que não existe benefício clínico com o uso concomitante de ambas (17).
8.1. TERAPIA DE REPOSIÇÃO ENZIMÁTICA (TRE)
As enzimas recombinantes para a TRE na DG diferem entre si principalmente em relação à forma de produção, à sequência de aminoácidos e ao padrão de glicosilação:
- Imiglucerase é produzida em células de ovário de hamster chinês e a seqüência de aminoácidos da proteína difere em um aminoácido em relação à seqüência da proteína endógena humana (Arg495Hist);
- Alfavelaglicerase é produzida em células humanas, por meio do processo de ativação gênica, e a seqüência de aminoácidos da proteína é semelhante à seqüência normal;
- Taliglucerase alfa é produzida em células de cenoura; a seqüência de aminoácidos da proteína é semelhante à seqüência da beta-glicosidase humana, diferindo da glicocerebrosidase humana por 2 aminoácidos na porção N-terminal e 7 aminoácidos na porção C-terminal.
As estruturas cristalográficas das três enzimas são bastante similares, e a alfavelaglicerase e a imiglucerase também possuem cinéticas enzimáticas similares (10).
8.1.1. IMIGLUCERASE
A imiglucerase está aprovada para tratamento dos pacientes com DG pelas agências americana (Food and Drug Administration, FDA), européia (European Medicines Agency, EMA) e brasileira (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, ANVISA) de regulação de medicamentos. Em função da DG ser doença rara, a evidência da melhora dos pacientes, apesar de ter sido demonstrada em um ensaio clínico pequeno (n= 30 pacientes, sendo que 15 receberam alglucerase e 15 imiglucerase), foi considerada suficiente, em 1994, pela agência reguladora norte-americana, FDA. A permissão para comercialização da imiglucerase nos Estados Unidos da América (EUA) ocorreu mesmo sem ter o laboratório fabricante realizado, ensaios clínicos de fase III que permitissem o cálculo de dose mínima eficaz. Assim, a dose utilizada na maioria dos países ficou sendo a preconizada por esse pequeno estudo, ou seja: 60 U/kg/infusão (inf) a cada 15 dias (18).
O relatório do International Collaborative Gaucher Group Registry (ICGG) de 1995 sugeriu que a velocidade da resposta hematológica tem relação direta com a dose de imiglucerase utilizada. Entretanto, a taxa de redução do volume hepático e esplênico observada nessa série de casos de quase 1.000 pacientes foi igual após 12 meses de tratamento19. A maioria dos especialistas concorda que 120 U/kg/mês (60 U/kg/inf a cada 15 dias) é uma dose desnecessariamente elevada para a maioria dos pacientes20-22, inclusive para tentativas de estabilização da doença neurológica apresentada por pacientes com DG tipo 3 (23). Os autores são categóricos ao afirmar que mesmo a presença de comprometimento ósseo, por si só, não justifica a utilização de doses maiores (21-22,24-26). Esquemas de doses menores (30 U/kg/mês) administrados com maior freqüência (3 vezes por semana) têm demonstrado similar eficácia na prevenção de fraturas (22,24-26). A incidência de falha ou ausência de resposta hepática ou esplênica é semelhante com doses de 15, 30 ou 130 U/kg/mês (27).
Em 1996, a Conferência de DG do Instituto Nacional de Saúde dos EUA, o National Institute of Health (NIH), concluiu que, devido ao alto custo do tratamento, era imperativo determinar a me-nor dose efetiva, inicial e de manutenção, a dose de melhor custo efetividade para resposta clínica, definir que indicações clínicas são apropriadas para tratamento e estabelecer métodos uniformes para otimizar as medidas de desfechos clínicos (28).
Em 1997, Beutler publicou uma revisão sistematizada de toda a literatura disponível, demonstrando que não existe correlação entre aumento de doses (15, 30 e 130 U/kg/mês) e redução da taxa de falha do tratamento. Nesse estudo, a variação de dose de 30 a 130 U/kg/mês não evidenciou qualquer diferença na taxa de resposta clínica (27).
Em 1998, Grabowski et al. apresentaram uma análise dos seus 175 casos mais os 83 casos do ICGG. Com base na análise após seis e 12 meses de tratamento dos 175 casos, concluiu-se que não existe consistência na relação entre aumento da dose e eficácia, com doses entre 5 e 60 U/kg/inf a cada 2 semanas. A maioria dos pacientes recebeu doses entre 15 e 60 U/kg/inf a cada 14 dias e estas doses produziram, na essência, resultados idênticos. Quando os autores incluíram na análise os outros 83 pacientes, apareceu uma tendência indicativa de que a maior redução do volume esplênico seria obtida com doses acima de 15-30 U/kg/inf a cada duas semanas, somente no sexto mês de tratamento. Entretanto, após 12 meses, a resposta esplênica foi idêntica à observada com o volume hepático, ou seja, não houve diferença entre as doses (29).
A resposta do tecido ósseo à TRE é mais lenta e não au-menta com o aumento da dose. Atenuação óssea e mesmo fraturas podem ocorrer nos locais de lesões antigas, inclusive nos pacientes tratados com 60 U/kg/inf (120 U/kg/mês) por longos anos (30). Beutler comparou os dados apresentados por Rosenthal et al.30 com os do grupo de Elstein et al. (22): o primeiro grupo de autores administrou 130 U/kg/mês e o segundo, 30 U/kg/mês. Não houve diferença na resposta óssea avaliada por espessamento da cortical óssea em ambos os grupos de tratamento27. Meta-análise publicada em 2010 mostrou que a TRE com imiglucerase é bastante efetiva na melhora do envolvimento da medula óssea, mas que o seu efeito na densidade mineral óssea é ainda desconhecido(31).
Esquemas de doses menores (30 U/kg/mês) administrados com maior freqüência (3 vezes por semana) têm demonstrado similar efetividade (21-22,24-26) e eficácia na prevenção de fraturas26. No Canadá, a dose média de início de tratamento com imiglucerase, em 1999, foi de 66,4 U/kg/mês32. Em 2000, o grupo do NIH admitiu pela primeira vez que a dose eficaz mínima para as manifestações não esqueléticas pode ser atingida tanto com esquemas de doses menores (15 U/kg/inf a cada 14 dias) quanto com os de doses maiores (60 U/kg/inf a cada 14 dias). Segundo os autores, a dose limiar de resposta dos macrófagos parece ser 10 a 15 U/kg/inf a cada duas semanas(33-34). Ensaios clínicos prospectivos, com maior tamanho amostral, comparando doses de imiglucerase, não foram ainda rea-lizados(35-37). A comparação retrospectiva, a longo-prazo, de desfechos da TRE em dois centros de tratamento, um usando doses relativamente menores (mediana de dose: 15 a 30 U/kg a cada quatro semanas) e outro doses maiores (mediana de dose: 80 U/kg a cada 4 semanas), em pacientes adultos, não demonstrou diferença, entre as coortes, em relação ao aumento dos níveis de hemoglobina e plaquetas, e da melhora da hepatoesplenomegalia. Os pacientes usando doses maiores apresentaram uma melhora mais rápida dos níveis plasmáticos de quitotriosidase (biomarcador da doença) e do envolvimento da medula óssea medido por ressonância magnética (38).
8.1.2. ALFAVELAGLICERASE
A alfavelaglicerase foi aprovada para tratamento dos pacientes com DG, em 2010, pelas agências americana (FDA), européia (EMA) e brasileira (ANVISA) de regulação de medicamentos.
A eficácia da alfavelaglicerase foi determinada em um estudo randomizado, de fase III, duplo-cego, paralelo, multicêntrico, que avaliou duas doses deste medicamento (45 e 60 U/kg/inf a cada duas semanas) por 12 meses, em 25 pacientes virgens de tratamento (7 pediátricos). Houve melhora, em ambos os grupos, de todos os parâmetros estudados: hemoglobina (aumento de 24%, no grupo com 45 U/kg/inf, e de 23% no grupo 60 U/kg/inf), plaquetas (aumento de 66% em ambos grupos), volume esplênico (redução de 40% e 50%, respectivamente), volume hepático (redução de 6% e 17%, respectivamente)10.
Dois outros estudos compararam a alfavelaglicerase com a imiglucerase: no primeiro, um estudo de fase II/III, não-randomizado, aberto, não-controlado, 40 pacientes com quadro clínico estável (idade superior a dois anos), previamente tratados com imiglucerase, substituiram o tratamento com imiglucerase pelo tratamento com velaglucerase afla (a dose de alfavelaglicerase utilizada foi semelhante àquela de imiglucerase que o paciente estava recebendo, com uma variação de 15 a 60U/kg por infusão). O estudo indicou que não houve alteração, em um intervalo de 12 meses, dos desfechos avaliados (níveis de hemoglobina e plaquetas, e volume hepático e esplênico). O outro estudo (fase III, randomizado, duplo-cego, paralelo) comparou, em pacientes virgens de tratamento, 60 U/kg/ por infusão de alfavelaglicerase e de imiglucerase. Não foram encontradas diferenças entre os grupos nos parâmetros estudados10.
Em relação à segurança, observou-se que o medicamento foi geralmente bem tolerado. A maioria dos eventos adversos foram leves ou moderados, e não ocorreram eventos adversos sérios associados ao tratamento (10).
8.1.3. TALIGLUCERASE ALFA
A eficácia da taliglucerase alfa foi estudada em um ensaio clínico multicêntrico, ainda não publicado, com duração de nove meses e que incluiu 31 pacientes com idade maior ou igual a 18 anos. Trata-se de um ensaio clínico duplo-cego, randomizado, onde um grupo de pacientes recebeu 30 U/kg/inf a cada 2 semanas de taliglucerase alfa, e o outro recebeu 60 U/kg/inf a cada 2 semanas. Os critérios de inclusão englobavam a presença de esplenomegalia e trombocitopenia, e a ausência de tratamento com TRE ou inibição de síntese do substrato no ano anterior à inclusão. O desfecho primário foi o volume do baço, e os desfechos secundários o nível de hemoglobina e de plaquetas e o volume do fígado. Os pacientes de ambos os grupos do estudo (30 e 60 U/kg/inf) apresentaram melhora do volume esplênico (média de redução de 8,5%), do volume hepático (média de redução de 10%), dos níveis de hemoglobina (média de aumento de 1,4 g/dL) e plaquetas (média de aumento de 20.214 no grupo 30 U/kg/inf, e de 47,063 no grupo 50 U/kg/inf) e melhora da fração de gordura na ressonância magnética do osso (dados não publicados), sendo que somente no desfecho níveis de plaquetas foi encontrada diferença significativa entre os grupos.
Em relação aos eventos adversos, os mais freqüentes foram os de hipersensibilidade, cefaléia e prurido, os quais ocorreram com freqüência similar nos grupos de 30 e 60 U/kg por infusão. Oito por cento dos pacientes apresentaram reações de hipersensibilidade. Aproximadamente 6% dos pacientes desenvolveram anticorpos IgG à taliglucerase alfa, mas não foi observada associação entre o desenvolvimento da resposta de anticorpos e as reações de hipersensibilidade.
Estudos envolvendo o uso de taliglucerase alfa em criança, e em pacientes que fizeram uso prévio de imiglucerase, estão sendo realizados; entretanto, os seus resultados ainda não estão disponíveis. Porém, as evidências disponíveis justificam o tratamento dos doentes de DG com taliglucerase alfa, quando houver indisponibilidade de imiglucerase ou alfavelaglicerase,.
Assim, neste protocolo de tratamento, a TRE (independente da forma recombinante da enzima a ser utilizada) deve ser iniciada, em pacientes adultos sem doença grave, com a menor dose eficaz (15 U/kg/inf, com infusões a cada 15 dias)27,34,39-40. Ajuste de doses para 30 U/kg/inf a cada 15 dias serão permitidos nos casos em que nenhuma resposta, conforme definido no item 9.3 deste protocolo, puder ser observada. Lesões irreversíveis presentes já ao início do tratamento como osteonecrose, compressão vertebral e fibrose do fígado e do baço não poderão ser utilizadas como parâmetros/desfechos para cálculo da dose de início, da dose de manutenção ou dos reajustes de dose.
Doses iniciais de 30 U/kg a cada 15 dias são preconizadas para crianças com menos de 12 anos ou para adolescentes com idade inferior a 19 anos e que não tenham completado crescimento ósseo, conforme radiografia para determinação da idade óssea.
A utilização de doses iniciais de 60 U/kg a cada 15 dias fica recomendada somente aos casos de doença grave, independente da faixa etária dos mesmos. Todos os pacientes utilizando doses de 60 U/kg a cada 15 dias deverão ser reavaliados a cada seis meses nos Centros de Referência com vistas à otimização da dose. Nos pacientes com DG tipo 3, a melhora neurológica é improvável e de difícil aferição, e não pode ser considerada como critério para ajuste de dose.
O esquema de ajuste posológico da TRE preconizado por este protocolo foi baseado nas evidências disponíveis, juntamente com dados que comprovam a sua efetividade (41).
8.2. INIBIÇÃO DE SÍNTESE DE SUBSTRATO
O miglustate está aprovado, pelas agências americana (FDA), européia (EMA) e brasileira (ANVISA) de regulação de medicamentos, para tratamento dos pacientes com DG I com sintomas leves a moderados para os quais a TRE é considerada inadequada.
O miglustate é um imino açúcar análogo à glicose, que age como inibidor da atividade da glicosilceramida sintase, e que parece cruzar a barreira hemato-encefálica42. Este medicamento foi inicialmente estudado em altas doses (até três gramas por dia por via oral) como um fármaco potencialmente anti-retroviral42, mas se mostrou associado à mielosupressão e não foi aprovado pelo FDA como antiretroviral43. A justificativa para a indicação de miglustate na DG seria a de que o seu uso associar-se-ia à diminuição das concentrações lisossômicas tóxicas do glicocerebrosídeo (substrato da betaglicosidase que se encontra acumulado na DG). Evidências histológicas desta redução foram descritas em modelo animal (44). Além disso, como o miglustate é uma molécula pequena, haveria o potencial de este medicamento ser mais eficaz do que a imiglucerase no tratamento da doença óssea e do sistema nervoso central nestes pacientes. Um ensaio clínico aberto, randomizado e controlado, incluindo 30 pacientes com DG tipo 3, entretanto, não demonstrou benefícios significativos do uso de miglustate durante 24 meses nas manifestações neurológicas da doença (45). Meta-análise publicada em 2010 mostrou que o miglustate, apesar não alterar o envolvimento da medula óssea, freqüentemente aumenta a densidade mineral óssea dos pacientes, embora estudos adicionais sejam necessários para confirmar estes achados (31).
No estudo realizado por Cox et al (46), de fases I e II e aberto, participaram vinte e oito pacientes adultos com DG tipo 1 que não desejavam ou não toleravam a TRE. Estes pacientes receberam 100-300mg de miglustate três vezes ao dia, durante 12 meses. Seis pacientes haviam sido previamente tratados com TRE (mas estavam sem receber TRE por pelo menos três meses antes da inclusão no estudo). Vinte e dois (78,5%) pacientes completaram o estudo. Não foi encontrado aumento estatisticamente significativa de hemoglobina e plaquetas; e houve diminuição estatisticamente significativa da atividade da quitotriosidase e dos volumes hepático (12,1%) e esplênico (19%). O evento adverso mais comum foi diarréia (79%) e as causas de interrupção da participação no estudo foram queixas gastrointestinais (n= 2), razões pessoais (n= 2) e doença grave pré-existente (n= 2).
Heitner et al (47) realizaram um estudo com 18 pacientes adultos com DG leve ou moderada, que não desejavam ou não toleravam a TRE. Os pacientes receberam 50mg de miglustate três vezes ao dia, durante seis meses; a extensão era opcional, e nessa a dose de miglustate utilizada foi de 100mg três vezes ao dia. Dezessete pacientes completaram os seis meses de estudo e 16 pacientes a fase de extensão. Os resultados encontrados aos seis meses foram: diminuição significativa dos volumes hepático e esplênico e da atividade da quitotriosidase; sem aumento significativo de hemoglobina e plaquetas. Aos 12 meses os resultados foram semelhantes àqueles dos seis meses. Não houve eventos adversos graves e os eventos adversos mais comuns foram diarréia (94%) e perda de peso (67%).
O estudo realizado por Elstein et al48 foi uma extensão do estudo de Cox et al46, onde os pacientes receberam 100 - 300mg de miglustate três vezes ao dia, durante 24 meses. Os resultados obtidos foram comparados em relação ao período basal do estudo anterior-mente relatado, perfazendo um total de 36 meses de avaliação. Foram incluídos 18 pacientes adultos com DG tipo 1 que não desejavam ou não toleravam a TRE; desses, 14 pacientes (77,7%) completaram os 24 meses de estudo. Encontrou-se redução significativa dos volumes hepático (17,5%) e esplênico (29,6%). No subgrupo de pacientes com anemia no período basal, houve aumento estatisticamente significativo dos níveis de hemoglobina; e não foi encontrado aumento estatisticamente significativo de plaquetas. Houve diminuição da prevalência e da magnitude de diarréia e perda de peso em relação ao estudo de Cox et al (46); e não foram relatados novos casos de neuropatia periférica.
Estudo realizado por Pastores et al49 incluiu 10 pacientes adultos com DG tipo 1 leve ou moderada e que não desejavam ou não toleravam a TRE , ou estavam sem receber TRE por pelo menos três meses. Estes pacientes receberam 100mg de miglustate três vezes ao dia durante 12 meses, com opção de extensão de mais 12 meses. Desses pacientes, sete finalizaram os 24 meses de estudo. Não foi encontrada diminuição significativa dos volumes hepático e esplênico; não houve aumento significativo de hemoglobina e plaquetas. Encontrou-se diminuição significativa da atividade da quitotriosidase e a doença óssea manteve-se estável. O tratamento foi bem tolerado, não houve evidência de eventos adversos clinicamente significativos nas funções neurológicas ou neuropsicológicas. Os eventos adversos mais comuns foram flatulência e diarréia. As causas de interrupção do estudo foram falta de adesão em um paciente e eventos adversos em dois pacientes.
O estudo de Giraldo et al (50) comparou grupos sem e com uso prévio de TRE nos meses zero, seis e 12 de tratamento com miglustate (dose de 300mg/dia), com 40 controles históricos em TRE. Participaram do estudo 26 pacientes com DG tipo I, com idade superior a 21 anos. As análises foram feitas com 25 pacientes (10 sem terapia prévia; 15 com TRE prévia), pois um paciente teria abandonado o estudo no seu início. As variáveis analisadas foram: estado clínico, hemoglobina, plaquetas, biomarcadores, organomegalia (por ressonância magnética), avaliação neurológica e cognitiva, questionário de qualidade de vida (SF-36) e infiltração da medula óssea por ressonância. Dos pacientes do grupo sem TRE prévia, nove completaram seis meses de tratamento e seis completaram 12 meses de tratamento. A comparação com controles históricos em TRE, considerando seis meses de tratamento, mostrou que houve maior diminuição do volume hepático no grupo tratado com TRE (p<0,05); não houve diferença entre os dois grupos em relação à redução do volume esplênico e da atividade da quitotriosidase, e dos níveis de hemoglobina e plaquetas. Em relação aos pacientes do grupo com TRE prévia, doze pacientes completaram 12 meses de tratamento e permaneceram com os parâmetros estáveis. Um dos pacientes foi excluído do estudo aos dois meses por falta de adesão. Três apresentaram distúrbios gastrintestinais, três tremor leve e um perda moderada de peso.
O estudo de Elstein et AL (17) foi um estudo de fase II, controlado, aberto e randomizado, com duração de seis meses, no qual foram incluídos 36 pacientes adultos com DG tipo 1 que estivessem a pelo menos dois anos em tratamento de TRE e que eram clinicamente estáveis por pelo menos 6 meses. Esses pacientes foram randomizados em três grupos: grupo a) permaneciam em TRE; grupo b) utilizaram TRE + miglustate; grupo c) utilizaram somente miglustate. Após o término do estudo, os pacientes foram monitorados por 18 meses adicionais. Dos 36 pacientes, trinta e três completaram seis meses de estudo. Desses que completaram os seis meses, vinte e nove optaram por participar da fase de extensão de mais 18 meses, contudo somente 15 pacientes completaram esta fase. As variáveis analisadas foram: volumes hepático e esplênico (por tomografia), exame físico, exames laboratoriais, questionários de qualidade de vida. Ao término do estudo, os pacientes do grupo C apresentaram níveis estáveis do volume hepático e esplênico e atividade da quitotriosidase e níveis de hemoglobina; relataram maior conveniência da terapia com miglustate em relação à TRE; e apresentaram redução significativa do número de plaquetas em relação ao grupo A. A terapia combinada não mostrou benefício, embora o grupo B tenha apresentado maior redução do volume hepático em relação ao grupo A. Na fase de extensão, a maioria dos pacientes permaneceu estável clinicamente. Em relação à segurança, na fase randomizada (seis meses iniciais), dos 12 pacientes do grupo C, dois abandonaram o estudo por evento adverso, assim como 1/12 (8,3%) pacientes do grupo B. Nenhum paciente do grupo A abandonou o estudo. Na fase de extensão, dos 29 pacientes que participaram, seis abandonaram o estudo por efeito adverso e os demais abandonaram por outras razões.
O estudo de Giraldo et al (51) foi um estudo aberto, prospectivo, que avaliou a terapia com miglustate como terapia de manutenção em pacientes com GD tipo 1 que tinham previamente feito uso de TRE. Vinte e oito pacientes foram incluídos no estudo, tendo sido analisados os seguintes parâmetros relativos aos meses 6, 12, 24, 36 e 48 de tratamento: visceromegalia, hemoglobina, plaquetas, biomarcadores, infiltração da edula óssea, estado de saúde e tolerabilidade/segurança. Houve melhora dos biomarcadores, e os outros parâmetros mantiveram-se estáveis.
A dose de miglustate utilizada para tratamento da DG é de 100 mg, por via oral, três vezes ao dia (43). Os eventos adversos mais comumente associados ao uso de miglustate são perda de peso (60%); eventos gastrointestinais (acima de 80%); e tremores (30%). Tais eventos provocam a descontinuação do medicamento em 20%-30% dos casos46-49 .Os eventos gastrointestinais (dor abdominal; diarréia; flatulência) podem ser manejados por meio de dieta específica e de uso concomitante de agentes constipadores. Neuropatia periférica e disfunção cognitiva são também relatados, mas a associação causal com o uso de miglustate ainda não está estabelecida.
Segundo relatório da EMA, estudo pré-clínicos demonstram que o miglustate predispõe à catarata e ao desenvolvimento de tu-mores (pelo menos de testículo e de intestino), assim como prejudica a espermatogênese e os parâmetros espermáticos, reduzindo a fertilidade. Não existem dados em gestantes, mas em animais parece haver toxicidade reprodutiva, incluindo distócia. O miglustate não mostrou potencial mutagênico ou clastogênico nos testes padrões de genotoxicidade.
8.3. CRITÉRIOS DE TRATAMENTO
8.3.1. TRE
Apesar dos estudos com imiglucerase, alfavelaglicerase e taliglucerase alfa terem sido realizados, na sua maioria, com doses de 30 e 60U/kg/inf, para fins deste protocolo considerar-se-á equivalência de dose entre as três formas de enzimas recombinantes - ou seja: poderão ser utilizadas doses entre 15 a 60 U/kg/inf, a cada 15 dias, para qualquer das três enzimas. O aumento da doses dependerá de avaliação do Centro de Referência e deverá requerer laudo médico e exames demonstrando, no início do tratamento, piora ou ausência de resposta clínica (conforme definido no item 9.3 deste protocolo). Após ocorrência de resposta clínica, o quadro clínico deverá ser mantido estável, e a presença de estabilidade indicará a possibilidade de redução de dose. A redução de dose deverá ocorrer na seguinte seqüência: de 60 U/kg/inf para 45 U/kg/inf a cada 15 dias; depois para 30 U/kg/inf a cada 15 dias; e, posteriormente, para 15 U/kg/in a cada 15 dias. O aumento da dose deverá ocorrer na seguinte seqüencia: de 15 U/kg/inf para 30 U/kg/inf a cada 15 dias; depois para 45 U/kg/inf a cada 15 dias; e, posteriormente, para 60 U/kg/in a cada 15 dias. Cada ajuste deve ter um intervalo mínimo de seis meses. A dose máxima de enzima recombinante permitida por este PCDT é de 60 U/kg/inf a cada 15 dias. A dose mínima recomendada por este PCDT para crianças com DG tipo I e adolescentes em fase de crescimento (conforme comprovado por radiografia para determinação de idade óssea, sem critérios de doença grave, é de 30 U/kg/inf a cada 15 dias.
A dose de início e dose mínima de manutenção de tratamento preconizada por este PCDT encontra-se descrita na tabela 1.
Tabela 1 - Doença de Gaucher: dose de início e de manutenção de tratamento com TRE
Características do paciente | Presença de doença grave* | Dose de início da enzima recombinante (U/kg/inf a cada 15 dias) | Dose mínima de manutenção (U/kg/inf a cada 15 dias)** |
Adultos (19 ou mais anos) ou adolescentes que já ultrapassaram a fase de crescimento | Não | 15 | 15 |
Crianças e adolescentes menos de 19 anos) em fase de crescimento | Não | 30 | 30 |
Adultos (19 ou mais anos) ou adolescentes que já ultrapassaram a fase de crescimento | Sim | 60 | 15 |
Crianças e adolescentes (menos de 19 anos) em fase de crescimento | Sim | 60 | 30 |
*conforme definido no item 2.1; **os critérios para ajuste de dose são descritos no item 9.3 do PCDT.
8.3.2. INIBIÇÃO DE SÍNTESE DE SUBSTRATO
Recomenda-se que pacientes com DG que preencham os critérios de inclusão para tratamento sejam inicialmente tratados com TRE. O uso do miglustate é reservado aos pacientes que apresentarem contraindicação médica ao uso da TRE.
8.4 FÁRMACOS
a) Imiglucerase: frasco-ampola de 200 U ou 400 U
b) Alfavelaglicerase: frasco-ampola de 200 U ou 400 U
c) Miglustate: cápsulas de 100 mg
8.5 ESQUEMAS DE ADMINISTRAÇÃO
Recomenda-se que as infusões sejam feitas com filtro 0,2 micra.
a) Imiglucerase: 15 a 60 U/kg/Inf a cada 15 dias conforme critérios de tratamento. As infusões, inicialmente, devem ser feitas em um período de duas horas;
b) Alfavelaglicerase: 15 a 60 U/kg/Inf a cada 15 dias con-forme critérios de tratamento. As infusões, inicialmente, devem ser feitas em um período de 1 a 2 horas;
c) Miglustate: 1 cápsula via oral até 3 vezes ao dia (100 mg). Iniciar com uma cápsula ao dia, e aumentar gradativamente para três (em 2 semanas).
Em função da possibilidade de ocorrência de reações alérgicas, a TRE deve ser preferencialmente realizada em ambiente hospitalar e com o uso filtros, sob supervisão médica, em serviços especializados referenciais. Após seis meses de tratamento, a critério do médico do Centro de Referência, as infusões poderão ser transferidas, de forma supervisionada e após treinamento da equipe envolvida, para local mais próximo da residência do paciente (52).
8.6 TEMPO DE TRATAMENTO - CRITÉRIOS DE INTERRUPÇÃO
O tratamento é contínuo. A interrupção do mesmo deve ser considerada se ocorrer piora do quadro clínico do paciente após 24 meses de tratamento regular e com todos os ajustes possíveis de dose, e nos casos de baixa adesão ao tratamento (aqui definida como a ocorrência de menos de 50% das infusões previstas para um período de seis meses, no caso das enzimas recombinantes, ou da ingestão de menos de 50% das cápsulas de miglustate previstos para um período de seis meses). Nos casos de baixa adesão, o paciente deverá ser inserido em programa educativo, de forma a garantir o retorno imediato ao tratamento quando houver garantia de melhora da adesão.
8.7 BENEFÍCIOS ESPERADOS
O objetivo do tratamento é a prevenção do desenvolvimento de novas manifestações clínicas (principalmente aquelas irreversíveis) e a promoção de uma melhor qualidade de vida aos pacientes, e não a normalização dos parâmetros laboratoriais ou de imagem. Sabe-se que, em geral, pacientes que fazem uso da TRE apresentam, após três a 12 meses de tratamento, melhora no quadro de citopenia e redução no tamanho do fígado e do baço; a resposta às manifestações ósseas, entretanto, usualmente ocorre mais tardiamente. Esta sequencia temporal de eventos ainda não é bem determinada para o miglustate.
9. MONITORIZAÇÃO
A monitorização dos pacientes deve ser principalmente baseada na anamnese e no exame físico, sendo as manifestações clínicas os principais parâmetros a ditarem a necessidade de exames laboratoriais ou de imagem adicionais. Abaixo segue a avaliação mínima preconizada por este protocolo, e que é necessária para a dispensação do medicamento (início e manutenção do tratamento) (Tabela 2). Demais avaliações não são obrigatórias, mas podem ser inseridas na dependência da estrutura e condições de cada Centro de Referência.
Tabela 2 - Doença de Gaucher: avaliação mínima recomendada*
Avaliação | Antes do início do tratamento | Monitorização |
Anamnese | Sim | Sim |
Exame físico, incluindo medida do tamanho do fígado e do baço | Sim | Sim |
Medida da atividade da beta-glicosidase | Sim | Sim |
Hemograma/ plaquetas | Sim | Sim |
Ferritina/AST/ALT/GGT/ Bilirrubinas /tempo de protrombina | Sim | Sim |
Ecografia abdominal | Sim | Somente nos casos em que for necessário o aumento da dose da enzima por piora deste parâmetro detectada por exame físico. |
Densitometria óssea | Sim | Idade inferior a 19 anos: sim. Nos demais casos, fazer somente se suspeita de osteoporose. |
Radiografia de coluna vertebral, quadril e de ossos longos | Sim | Fazer somente se piora de sintomatologia óssea |
Radiografia para determinação de idade óssea | Fazer em adolescentes ou pacientes com desenvolvimen to puberal atrasado | Fazer pacientes com desenvolvimento puberal atrasado ou para confirmar que adolescente está em fase de crescimento |
Dosagem de vitamina B12 | Medir na presença de manifestações clínicas sugestivas de deficiência de vitamina B12 | Medir na presença de manifestações clínicas sugestivas de deficiência de vitamina B12 |
*exame de urina, creatinina, radiografia de tórax, espirometria e ecocardiograma serão necessários para demonstrar a presença de critérios de gravidade (envolvimento renal, cardíaco ou pulmonar, conforme item 2.1.
9.1. MONITORIZAÇÃO MÍNIMA RECOMENDADA PARA PACIENTES EM TRATAMENTO
- Avaliação clínica: deve ser realizada a cada seis meses, nos Centros de Referência, com questionamento direto sobre estado geral de saúde e de qualidade de vida, e ocorrência de dor, fadiga, fraturas e sangramentos e de sintomas sugestivos de deficiência de vitamina B12. No caso de pacientes em uso de miglustate, deve ser averiguada a ocorrência de diarréia, dor abdominal, neuropatia, tremores e perda de memória. Devem ser obrigatoriamente aferidos peso, altura, tensão arterial, e medida do tamanho do fígado e do baço. Em crianças/adolescentes, também deve ser aferido o estágio puberal. No caso de pacientes em uso de miglustate e de pacientes com DG tipo 3, realizar exame neurológico.
- Hemograma/plaquetas: devem ser realizados a cada seis meses enquanto houver alteração. Caso haja persistência ou piora da anemia, excluir outras causas para este achado (incluindo anemia ferropriva, verminose e deficiência de vitamina B12, esta última por meio da dosagem dessa vitamina). Após normalização dos níveis de hemoglobina, o hemograma poderá ser realizado anualmente. A contagem de plaquetas também poderá ser realizada anualmente após ocorrer normalização dos seus valores.
- Ferritina/AST/ALT/GGT/Bilirrubinas/tempo de protrombina: devem ser realizados a cada 12 meses. Se piora destes parâmetros, excluir potenciais fatores causadores, tais como uso de medicamentos (por exemplo, anticoncepcionais orais) e outras doenças hepáticas.
- Ecografia abdominal com medida do tamanho do fígado e do baço: necessária para o início do tratamento e para ajuste de dose da enzima por piora da hepatoesplenomegalia detectada por exame físico.
- Densitometria óssea: em crianças e adolescentes até 19 anos, poderá ser realizada a cada 2 anos (como não existem parâmetros de normalidade para esta faixa etária, o indivíduo será o seu próprio controle). Em pacientes adultos, deve ser realizada antes do início do tratamento caso seja detectada osteoporose, deverão ser seguidas as medidas preconizadas pelo PCDT para osteroporose; caso não sejam detectadas alterações, a densitometria deverá ser repetida somente no caso de surgimento de manifestações clínicas ou se piora de sintomatologia pré-existente.
- Radiografia de coluna vertebral, quadril e de ossos longos: realizar somente se surgimento de manifestações clínicas sugestivas de doença óssea, ou se piora de sintomatologia pré-existente.
- Radiografia para determinação de idade óssea: realizar no caso de desenvolvimento puberal atrasado, e sempre que for necessário determinar, para ajuste de dose, se o paciente adolescente está em fase de crescimento. Se idade óssea inferior a idade cronológica, encaminhar paciente para avaliação endocrinológica.
- Medida de vitamina B12 no plasma: realizar na presença de manifestações clínicas sugestivas de deficiência de vitamina B12. Se níveis diminuídos, suplementar vitamina B12.
9.2. MONITORIZAÇÃO MÍNIMA RECOMENDADA PARA PACIENTES ASSINTOMÁTICOS OU OLIGOSSINTOMÁTICOS QUE NÃO PREENCHEM CRITÉRIOS PARA INÍCIO DE TRATAMENTO
- Avaliação clínica: deve ser realizada a cada seis meses, com questionamento direto sobre estado geral de saúde e de qualidade de vida, e ocorrência de dor, fadiga, fraturas e sangramentos e de sintomas sugestivos de deficiência de vitamina B12. Devem ser obrigatoriamente aferidos peso, altura, pressão arterial, e medida do tamanho do fígado e do baço. Em crianças/adolescentes, também deve ser aferido o estágio puberal.
- Hemograma/plaquetas: devem ser realizados a cada 6 meses.
- Ferritina/AST/ALT/GGT/Bilirrubinas/tempo de protrombina: devem ser realizados a cada 12 meses. Se piora destes parâmetros, excluir potenciais fatores causadores, tais como uso de medicamentos (por exemplo, anticoncepcionais orais) e outras doenças hepáticas.
- Densitometria óssea: em crianças e adolescentes, poderá ser realizada a cada dois anos (como não existem parâmetros de normalidade para esta faixa etária, o indivíduo será o seu próprio controle). Em adultos, a densitometria deverá ser repetida somente no caso de surgimento de manifestações clínicas ou se piora de sintomatologia pré-existente.
- Radiograifa de coluna vertebral, quadril e de ossos longos: realizar somente se surgimento de manifestações clínicas sugestivas de doença óssea.
- Raodiografia para determinação de idade óssea: realizar no caso de desenvolvimento puberal atrasado. Se idade óssea inferior a idade cronológica, encaminhar paciente pra avaliação endocrinológica.
- Medida de vitamina B12 no plasma: realizar na presença de manifestações clínicas sugestivas de deficiência de vitamina B12. Se níveis diminuídos, suplementar vitamina B12.
9.3. RESPOSTA TERAPÊUTICA
Considerando a variabilidade dos métodos de aferição empregados para avaliação da hemoglobina/plaquetas/tamanho fígado e baço, a melhora ou piora de tais parâmetros é definida, neste Protocolo, como uma variação, respectivamente, igual ou maior do que 20% (para melhora da hemoglobina e plaquetas) ou redução igual ou maior do que 20% (para melhora da hepatoesplenomegalia), em relação aos valores basais ao início do tratamento ou em relação ao reajuste de dose. Se a variação do parâmetro for mantida dentro desta faixa (ou seja, entre -20 e + 20%), o mesmo será considerado estável. A piora dos níveis de hemoglobina e plaquetas é definida como uma variação superior a -20% em relação aos valores basais ao início do tratamento ou em relação ao ajuste de dose; a piora da hepatoesplenomegalia, por sua vez, é definida como uma variação superior a +20%. Os demais parâmetros serão avaliados de forma subjetiva, devendo a sua melhora/piora/estabilidade ser documentada por meio de laudo médico.
9.3.1. PACIENTES SEM DOENÇA GRAVE
A resposta clínica ao tratamento para estes pacientes é definida, neste protocolo, como a presença de pelo menos um dos itens abaixo, desde que passados pelo menos seis meses do início do tratamento ou do aumento da dose da enzima:
- aumento da hemoglobina;
- aumento da contagem de plaquetas;
- redução do tamanho do fígado;
- redução do tamanho do baço;
- redução das dores ósseas;
- redução do sangramento;
- aumento da capacidade funcional;
- melhora da qualidade de vida.
9.3.2 Pacientes com doença grave
No caso dos pacientes com doença grave, a resposta clínica ao tratamento é definida como o desaparecimento de todos os seguintes critérios de gravidade (conforme item 2.11 deste PCDT):
a) sintomas gerais incapacitantes: dores ósseas NÃO decorrentes de lesão óssea irreversível (tais como osteonecrose, osteosclerose, e compressão vertebral), dor abdominal, fadiga, limitação funcional aeróbica caracterizada por dispnéia aos médios ou grandes esforços ou caquexia;
b) contagem de plaquetas igual ou menor do que 20.000/mm3;
c) contagem de plaquetas entre 20.000 e 50.000/mm3 associada a episódios recorrentes de sangramento. Tais episódios devem ser clinicamente significativos e secundários à DG, devendo ser comprovados por laudo médico;
d) hemoglobina menor do que 8 g/dL;
e) falência renal (clearance da creatinina menor do que 30 ml/kg/min), secundária à DG;
f) acometimento hepático (aumento de, no mínimo, duas vezes de AST e ALT, ou prolongamento do tempo de protrombina (abaixo de 70% em relação ao controle), tendo sido descartadas hepatites infecciosas, uso de medicamentos como anticoncepcionais e de antiinflamatórios não-esteroides como causa dessas alterações;
g) acometimento cardio-pulmonar clinicamente significativo, evidenciado, respectivamente, por meio de ecocardiograma ou radiografia simples ou espirometria, secundário à DG.
9.3.3. Ajustes de dose
Considerando pacientes em TRE, assim que a resposta clínica for atingida, a dose da enzima deverá ser gradualmente diminuída conforme o esquema proposto no item 8.3.1 deste PCDT. Caso ocorra, em um intervalo mínimo de 6 meses após o início do tratamento ou ajuste da dose, piora clínica (conforme definido no item 9.3 deste PCDT), a dose da enzima poderá ser gradualmente aumentada (até um máximo de 60 U/kg/inf).. Caso os parâmetros forem mantidos estáveis após 6 meses do ajuste da dose que sucedeu a resposta clínica, a dose da enzima poderá ser novamente diminuída. Os ajustes de dose deverão ser feitos até ser determinada a dose mínima de manutenção eficaz para cada indivíduo.
Portanto, hemograma, plaquetas, estimativa do tamanho do fígado e do baço e questionamento sobre dores ósseas/sangramento/capacidade funcional/qualidade de vida deverão ser realizados no período basal, antes do reajuste de doses e a cada 6 meses de tratamento até a sua normalização. Após a normalização dos parâmetros laboratoriais, eles deverão ser pesquisados a cada 12 meses.
Não havendo resposta adequada, desde que excluídas outras causas para tanto, ajustes de doses até a dose limite superior (60 U/kg/inf) deverão ser decididos no Centro de Referência.
10. SITUAÇÕES ESPECIAIS
Em caso de gestação e lactação, a indicação de TRE deverá ser considerada mediante análise de risco-benefício para o caso específico. Demais situações deverão ser avaliadas em serviço especializado referencial.
11. REGULAÇÃO/CONTROLE/AVALIAÇÃO PELO GESTOR
Devem ser observados os critérios de inclusão e exclusão neste protocolo, a monitorização do tratamento, bem como a verificação periódica das doses do medicamento prescrito e dispensado e da adequação de uso.
12. TERMO DE ESCLARECIMENTO E RESPONSABILIDADE - TER
É obrigatória a informação ao paciente ou a seu responsável legal dos potenciais riscos, benefícios e efeitos colaterais ao uso de medicamento preconizado neste Protocolo, o que deverá ser obrigatoriamente formalizado por meio da assinatura de Termo de Esclarecimento e Responsabilidade, quando utilizado medicamento do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica.
13. REFERÊNCIAS
1. Barton NW, Brady RO, Dambrosia JM, Bisceglie AM, Doppelt SH, Hill SC, et al. Replacement therapy for inherited enzyme deficiency: macrophage-targeted glucocerebrosidase for Gaucher's disease. N Engl J Med 1991;324:1464-70.
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TERMO DE ESCLARECIMENTO E RESPONSABILIDADE
Imiglucerase, alfavelaglicerase e miglustate.
Eu,_________________________________________ (nome do(a) paciente), declaro ter sido informado(a) claramente sobre os benefícios, riscos, contra-indicações e principais efeitos adversos relacionados ao uso do(s) medicamento(s) imiglucerase, alfavelaglicerase ou miglustate indicado(s) para o tratamento da doença de Gaucher.
Os termos médicos foram explicados e todas as minhas dúvidas foram resolvidas pelo médico ______________________ (nome do médico que prescreve).
Assim declaro que:
Fui claramente informado(a) de que o medicamento que pas-so a receber pode trazer as seguintes melhorias:
- melhora da anemia, trombocitopenia;
- diminuição do tamanho de fígado e baço;
- prevenção de fraturas;
- melhora da qualidade de vida.
Fui também claramente informado a respeito das seguintes contra-indicações, potenciais efeitos adversos e riscos:
- na gravidez: estudos em animais com imiglucerase e alfavelaglicerase não mostraram anormalidades nos descendentes, porém não há estudos em mulheres grávidas; o risco para o bebê é muito improvável; entretanto o médico deve avaliar se os benefícios são maiores que os riscos; o miglustate é contraindicado durante a gravidez e 90 dias após a suspensão do tratamento, tanto para mulheres quanto para homens;
- na amamentação: não se sabe se os medicamentos são excretados no leite materno, portanto, durante a amamentação, o médico deve avaliar se os benefícios são maiores que os riscos;
- para imiglucerase e alfavelaglicerase: os efeitos adversos mais comuns já relatados foram dor de cabeça e reações alérgicas (que incluem vermelhidão, coceira, tosse, sensação de formigamento, dor no peito, falta de ar e diminuição da pressão arterial); outros eventos já relatados incluem dor abdominal, sensação de calor, dores nas articulações, tonturas e irritação da pele;
- para miglustate: os efeitos adversos mais comuns já relatados foram perda de peso, diminuição do apetite, tremores, tonturas, dor de cabeça, cãibras nas pernas, náuseas, vômitos, diarreia, prisão de ventre e gases.
- medicamentos contraindicados em casos de hipersensibilidade (alergia) conhecida ao fármaco;
Estou ciente de que este medicamento somente pode ser utilizado por mim, comprometendo-me a devolvê-lo caso não queira ou não possa utilizá-lo ou se o tratamento for interrompido. Sei também que continuarei ser atendido, inclusive em caso de eu desistir de usar o medicamento.
Autorizo o Ministério da Saúde e as Secretarias de Saúde a fazer uso de informações relativas ao meu tratamento, desde que assegurado o anonimato.
Meu tratamento constará de um dos seguintes medicamentos:
( ) imiglucerase
( ) alfavelaglicerase
( ) miglustate
Local: Data: | ||
Nome do paciente: | ||
Cartão Nacional de Saúde: | ||
Nome do responsável legal: | ||
Documento de identificação do responsável legal: | ||
_____________________________________ Assinatura do paciente ou do responsável legal | ||
Médico Responsável: | CRM: | UF: |
___________________________ Assinatura e carimbo do médico Data:____________________ |
Observação: Este Termo é obrigatório ao se solicitar o fornecimento de medicamento do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica e deverá ser preenchido em duas vias, ficando uma arquivada na farmácia e, a outra, entregue ao usuário ou a seu responsável legal.