Ministério da Saúde
Agência Nacional de Vigilância Sanitária

RESOLUÇÃO-RDC Nº 118, DE 11 DE JUNHO DE 2001 (*)

A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no uso da atribuição que lhe confere o art. 11, inciso IV, do Regulamento da ANVISA, aprovado pelo Decreto n° 3,029, de 16 de abril de 1999, c/c o § 1' do art. 111. do Regimento Interno aprovado
pela Portaria n° 593, de 25 de agosto de 2000, em reunião realizada em 6 de junho de 2001,

considerando o disposto no Art. 7 0, Capítulo II, da Lei n.° 9382, de 26 de janeiro de 1999;

considerando a ocorrência da epizootia de encefalopatia espongiforme bovina (EEB) em países europeus;

considerando a ocorrência de casos da nova variante da Doença de Creutzfeldt-Jakob - nvDCJ em humanos, constatada em países europeus, e a forte suspeita de sua relação com a encefalopatia espongiforrne bovina;

considerando os países de risco definidos pelo Escritório Internacional de Epizootias - OIE;

considerando a necessidade de adotar medidas para prevenir a população brasileira contra as encefalopatias espongiformes transmissíveis;

considerando a existência de evidências epidemiológicas que demonstram a relação dessas enfermidades- em seres humanos com o consumo de produtos cárneos e derivados, elaborados de ruminantes infectados;

considerando a possibilidade de transmissão de substâncias patogênicas a humanos .por produtos de origem animal utilizados em procedimentos de diagnóstico e tratamento;

considerando o risco potencial de transmissão da doença pela utilização de tecidos e órgãos humanos de pessoas de países onde a nvDCJ vem se manifestando;

considerando as medidas brasileiras adotadas no sentido de proibir, por tempo indeterminado, a importação de ruminantes vivos, das espécies bovina, ovina, caprina, bubalina e ruminantes silvestres e seus produtos derivados para consumo humano e ou alimentação animal e ouvida a Comissão Especial constituída na Portaria 216, de 16 de fevereiro de 2001, do Ministro de Estado da Saúde, resolve:

Art.1° PROIBIR, em todo o território nacional, transitoriamente e em caráter de emergência, o ingresso, a comercialização e a exposição ao consumo, dos

Parágrafo primeiro. Produtos para uso em seres humanos contendo matéria-prima originária de animais ruminantes das espécies
bovina, ovina. caprina, bubalina e de ruminantes silvestres, provenientes do Reino Unido (Inglaterra, Escócia. País de Gales, Irlanda do Norte, Ilha de Man, Jersey e Guernsey), da República da Irlanda, Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Grécia, Itália, Liechtenstein. Luxemburgo, Holanda, Portugal, República Tcheca e Suíça.

Parágrafo segundo. Incluem-se entre tais produtos, fios para sutura cirúrgica, válvulas cardíacas 'biológicas, enxertos de dura-máter, ossos -bovinos para implantes, albumina de origem bovina , medicamentos à base de gangliosídeos e os demais materiais implantáveis, injetáveis, ingeríveis ou aplicáveis ao organismo humano por qualquer outra via .

Parágrafo quarto. Ficam também- excluídos, em caráter transitório, os medicamentos de uso oral contendo substâncias discriminadas no caput deste artigo classificadas na categoria IV de grau de infectividade, constantes no Anexo 4 desta RDC (infectividade não detectável) e surfactantes pulmonares, ficando definido o prazo de 90 dias a contar desta publicação para que seja apresentada certificação de origem e de conformidade com .as. monografias da farmacopéia europeia. Neste prazo a Agência Nacional- de Vigilância Sanitária publicará normas complementares específicas sobre estes. produtos.

Art. 2º PROIBIR, em todo o território nacional, transitoriamente e em caráter de emergência, o ingresso, a comercialização e a. exposição ao consumo, dos produtos, órgãos e tecidos de uso em assistência à saúde cuja composição inclua substâncias de origem
humana de pessoas residentes no Reino Unido e na República da Irlanda. A proibição inclui sangue e seus derivados, hormónios hipofisários humanos, comem, ossos humanos para enxertos e quaisquer outros materiais implantáveis, injetáveis, ingeriveis ou aplicáveis ao organismo humano por 'qualquer outra via

Art, 3º PROIBIR a utilização de componentes de sangue e tecidos humanos obtidos de pessoas de qualquer nacionalidade que enham residido no Reino Unido ou na República da Irlanda por período igual ou superior a seis meses a partir de 1980, bem como de pessoas que apresentem distúrbios clínicos compatíveis com a Doença de Cieutzfeldt-Jakob (DCJ),

Art. 4° CONDICIONAR a reutilização de materiais e instrumental médico-cirúrgico utilizado em pessoas com quadro clínico indicativo de DCJ adoção de medidas de processamento constantes no Anexo 1 desta RDC.

Art, 5º OBRIGAR a adoção de precauções para o manuseio de pacientes, tratamento de artigos e superfícies, manipulação e descarte de 'materiais e amostras de tecidos constantes nos Anexos 2 e 3 desta RDC.

Art. 6º A proibição mencionada nos artigos 1° e 2° é extensiva para os procedimentos de importação já iniciados e os produtos em trânsito em portos, aeroportos e fronteiras.

Art. 7º Os importadores, distribuidores, comerciantes, varejistas, prestadores de serviço e os proprietários de quaisquer outros estabelecimentos que tenham os produtos acima discriminados para comercialização ou uso devem recolher os mesmos e comunicar o fato, no prazo de 20 dias a contar desta publicação, à Agência Nacional de Vigilância Sanitária não podendo expor ao consumo, ficando o seu não cumprimento sujeito às penalidades previstas em lei.

Art. 8° A autoridade sanitária de portos, aeroportos e fronteiras poderá, no momento da importação de outros produtos não referidos supra, exigir a comprovação de que são isentos de substâncias obtidas das espécies animais citadas no Art. 1°

Art, 9° A Agência Nacional de Vigilância Sanitária adotará medidas específicas em relação a produtos não discriminados nesta Resolução e que venham a ser considerados de risco potencial previstos

Art.'10 Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação:

GONZALO VECINA NETO

Diretor

ANEXO 1

Procedimentos para o processamento de materiais utilizados em pacientes,com suspeita de DCJ ou nvDCJ:

I. Deve ser dada preferência a materiais e instrumentos descartáveis, que devem ser encaminhados para incineração após o uso;

2. Os instrumentos cirúrgicos e outros materiais reutilizáveis devem ser mantidos molhados ou úmidos até o processamento;

3. Até que seja realizado o descarte ou o processamento, os materiais deverão ser identificados de forma visível como de "RISCO BIOLÓGICO";

4. A limpeza deve ocorrer tão rapidamente quanto possível para evitar que resíduos de tecidos, líquidos ou secreções fiquem aderidos;

5. Materiais potencialmente contaminados não devem entrar em contato com outros

6. As superfícies onde os materiais serão dispostos devem ser cobertas com campos inipermeãseis, enviados pata incineração após. Caso não seja possível, as superfícies deverão ser descontaminadas conforme descrito no Anexo 2,

7. Os materiais resistentes a autorias agem deverão passar por uni dos seguintes processos PRECEDENDO A ESTERILIZAÇÃO DE ROTINA:

7.1 Imersão em hidróxido de sódio (NaOH) * IN por urna hora;

7.2. Esterilização em autoclave gistvitacional a 132° C por uma hora (tempo de exposição).

8. Materiais não resistentes a autoclavagem deverão ser submetidos a imersão em NaOH 2N ou hipoclorito de sódio 5% ** por uma hora.

9. Eletrodos para eletromiografia inseridos por via percutânea, eletrodos corticais, de profundidade e outros materiais utilizados diretamente em tecido nervoso deverão ser submetidos aos procedimentos descritos no item 7 ou, quando não for possível, incinerados.

10. Instrumentos sensíveis como- fibroseópios, microscópios e dispositivos para .monitoração intracardíaca deverão, na Medida do possível, ser encapados ou envolvidos em material impermeável e descartável antes -do uso. As partes que entrarem em contato com os tecidos internos dos -pacientes deverão passar pelo procedimento de descontaminação-mais efetivo que possa ser aplicado ***, por limpeza mecânica para eliminação de resíduos aderidos e, se possível, ser submetidos a uni dos processos descritos nos itens 7 -e 8. O mesmo aplica-se a partes que possam ser desmontadas ou desconectadas.

11. Processadores automatizados usados para a lavagem dos materiais não poderão ser utilizados antes de adotados- os procedimentos descritos acima e deverão ser acionados para um ciclo vazio antes de receberem outros produtos.

12. Os cuidados aqui descritos aplicam-se também à prática odontológica.

Obs. Como regra, NaOH não corrói aço inoxidável, mas na prática, algumas ligas de aço podem ser danificadas, sendo recomendável testar uma amostra ou consultar o fabricante antes de submeter uma grande quantidade de instrumentos ao processo. NaOH pode ser utilizado como banho para autoclas a oem de instrumentos, mass é corrosivo para vidro e alumínio, Hipoclorito de sódio não é corrosivo para vidro ou alumínio, mas corrói aço inoxidável, incluindo os componentes de autoclaves. não podendo ser utilizado como banho para autoclavagem. Se o hipoclorito for utilizado para limpar um instrumento, o mesmo deve ser completamente enxaguado antes de ser levado à autoclave.

__________________________________________________________________________________________________________

* A manipulação das soluções deve obedecer os cuidados adequados para proteção dós trabalhadores.

**A solução de hipoclorito de sódio deve ser preparada no mesma dia.

*** Limpeza mecânica exaustiva, lavagens repetidas vezes com solução- detergente/proteinase, seguidas de desinfecção com glutaraldeído, tiocianato de .guanidiniutu 4M ou uréia 6M.

São ineficazes para a inativação da proteína prionica: Formol. B-propiolactona, peróxido de Hidrogênio, óxido de etileno, amónia . ácido peracético, fenóis , ácido hiclroclorico, calor seco <300ºC, radiação ionizante, ultravioleta e micro-ondas

ANEXO 2

Procedimentos de biossegurança para o manuseio de pacientes, amostras e outros materiais potencialmente contaminados por DCJ ou nvDCJ.

1. As precauções pessoais adotadas na assistência a pacientes com suspeita de DCI ou nvDCJ , no manuseio de materiais e nos procedimentos de limpeza são as mesmas preconizadas para a prevenção das hepatites B e C.

2. Exposição acidental de profissionais de saúde:

2.1. Em caso de exposição de pele íntegra a materiais possivelmente infectados, lavar imediatamente com água morna, sem esfregar, enxaguar e secar. Aplicar, por um minuto, hipoclorito de sódio 0,5%;

2.2. Exposição percutânea deve ser seguida por lavagem com água morna e sabão, enxaguar e secar;

2.3. Contato com mucosas deve ser seguido por lavagem com água morna (boca) ou solução salina (olhos)

2.4. As ocorrências devem ser comunicadas de maneira análoga a outras exposições acidentais e tais registros &Verão ser mantidos por pelo menos vinte anos caso o diagnóstico do paciente relacionado à exposição não seja descartado posteriormente.

3. Amostras de tecidó de sistema nervoso retiradas para analise histopatológica deverão ser encaminhados para laboratórios de referência definidos pelo sistema de vigilância epidemiológica oficial.

Obs.: Cuidados com o manuseio de amostras nos laboratórios de referência serão tratados em documento específico, não sendo objeto desta RDC.

4. Superfícies que tenham entrado em contato com instrumentos, materiais, tecidos ou fluídos corporais potencialmente contaminados deverão, após limpeza mecânica rigorosa, ser inundadas com NaOH 2N ou hipoclorito de sódio 5% por uma hora, e completamente enxaguadas com água após.

5. Recipientes e tubos de drenagem utilizados em pacientes com suspeita de DCS ou nvDCJ deverão ser descartados como resíduos sólidos, conforme descrito adiante.

6. Indumentária e material (luvas, escovas, tecidos, aventais etc.) utilizado para limpeza das superfícies descritas ncsitera4 ou para manipulação de materiais potencialmente contaminados, inclusive resíduos devem ser incinerados após o uso.

7. Os resíduos sólidos resultantes da atenção a pacientes com suspeita de DCJ ou. nvDCJ deverão ser acondicionados em sacos brancos leitosos. impermeáveis, resistentes, duplos, identificados como RESIDUO BIOLOGICO. Materiais pérfuro-cortantes deverão estar conddos em recipientes, estanques, rígidos e porn tampa.

8. Os resíduos referidos acima de verão ser incinerados.

ANEXO 3

Procedimentos para o manuseio de cadáveres.

I. Os cuidados habitualmente adotados para o controle de infecção no manuseio de cadáveres aplicam-se na remoção de corpos
de pacientes falecidos por DCJ ou nvDC.J ou suspeitos das doenças.

2. O corpo deverá ser colocado em uma bolsa seladaantes de sua remoção. Caso haja, extravasamento de fluidos, especialmente em caso de solução de continuidade da caixa craniana ou perda de líquido céfalo-raquidiano, a bolsa deverá ser forrada tons, material absorvente.

3. Além da equipe :necessária aos procedimentos, de necropsia, deve-se evitar a presença de outras pessoas no ambiente.. Todos devem ser informados da possibilidade diagnostica, dos riscos e cuidados a serem observados.

4. A equipe de necropsia deverá estar: devidamente paramentada, incluindo aventais, gorros cirúrgicos, luvas, duplas e visor facial que cubra completamente os olhos o nariz e a boca.

5. Dar-se-á preferência à utilização de instrumental descartável. Caso não seja possível, deverão ser adotadas as precauções discriminadas no Anexo 1, itens 7 e 8.

6. Recomenda-se a utilização de-serras manuais para evitar a geração de partículas e aerossóis. Só serão admitidas serras elétricas Se operadas em bolsas específicas para conter, os aerossóis ou se os profissionais utilizarem capacetes de "ar mandado' :contendo filtros adequados.

7. Salvo em instalações " com características de segurança especial, o exame post mortem deverá restringir-se ao cérebro, evitando-se a necrOpsia completa. Antes da abertura do crânios serão colocados forros plásticos sob -a cabeça, protegidos por material absorvente para garantir a contenção de líquido e resíduos.

8. Os cuidados referidos no Anexo 2, inclusive quanto à destinação de resíduos, aplicam-se também aos procedimentos de necropsia.

ANEXO 4

Infectividade relativa de tecidos e fluidos corporais de animais infectados.

Categoria 1 - Alta infectividade.

Cérebro , medula espinhal, olhos

Categoria II - Média infectividade

fico, linfonodos, colo proximal, baço, amígdalas, dura-mates, glândula pineal, placenta, líquor, hipófise, adrenal.

Categoria III - Baixa infectividade.

Colo distai, mucosa nasal, nervos periféricos, medula- óssea, fígado, pulmão, pâncreas, timo.

Categoria IV - Infectividade não detectada

Sangue, fezes, coração, rins, glândula mamária, leite, ovário.

saliva, glândulas salivares, vesícula seminal, músculo esquelético, tessutura

ticulos, tireóide, útero, tecido fetal, bile, cartilagem, osso (exceto crânio e coluna vertebral), tecido conjuntivo, pelo, pele, urina,

Bibliografia consultada:

JARVIS, W.R. Precautions for Creutzfeldt-Jakob Disease. Infection Control, 3 (3): 238-9, 1982.

Cominittee on Health Cate lssues, Atnerican Neurological

Association. Precautions in Handling Tissues, Fluids, and Other Contam inated Materiais from Patients with Documented or Suspected

Creutzfeldt-Jakob Disease. Ann, Neurol, 19 (1): 75-77, 1986.

BROWN,P et al. A simple and effective method for inactivating virus infectivity in formalia-fixed tissue samples from patients with Creutzfeldt-Jakob disease, Neurology, 40: 887-890, 1990:

European Agency for the Evaluation of Medicinal Products. Committee for Proprietaly Medicinal Products. 'Note for Guidance on Minimising the risk of transmitting animal spongiform encephalopathy agents via medicinal products, Revision September 2000 (CPMP/BWP/1230/98/Rev.1)

Infection Control Guidelines for Transmissible Spongiform Encephalopathies. Geneva: World Health Organization, 1999. WHO/CDS/CSR/AP11/2000,3,

Healthcare Infection Control Practices Advisory Committee (HICPAC). Draft Guideline for Environmental Infection Control in Healthcare Facilities. Atlanta: Centers for Disease Control and Prevention, 2001.

SCHATZMAYR, H,G. Prfons e sua Importância em Biossegurança in: Teixeira, P. (org.) e Valle, S. (org.), Biossegurança: uma abordagem multidsciplinar pp. 273-93. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1996.

(*) Republica por ter saído com incorreção, do original, no D.O. nº 115-E, de 15-6-2001, Seção 1, pág 87.

Saúde Legis - Sistema de Legislação da Saúde