Ministério da Saúde
Gabinete do Ministro

PORTARIA Nº 1.052, DE 8 DE MAIO DE 2007

Aprova e divulga o Plano Diretor de Vigilância Sanitária

O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE, no uso das atribuições que lhe confere o inciso II do parágrafo único do art. 87 da Constituição Federal, e

Considerando a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes;

Considerando a Lei nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999, que define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e cria a Agência Nacional de Vigilância Sanitária;

Considerando a deliberação da I Conferência Nacional de Vigilância Sanitária - I CONAVISA, realizada em 26 de novembro de 2001;

Considerando a Portaria nº 399/GM, de 22 de fevereiro de 2006, que aprova as Diretrizes Operacionais do Pacto pela Saúde 2006;

Considerando a Portaria nº 3.085/GM, de 1º dezembro de 2006, que regulamenta o PlanejaSUS;

Considerando a aprovação do Plano Diretor de Vigilância Sanitária na reunião da Comissão Intergestores Tripartite, realizada no dia 14 de dezembro de 2006;

Considerando a aprovação do Plano Diretor de Vigilância Sanitária na reunião do Conselho Nacional de Saúde, realizada no dia 14 de fevereiro de 2007; e

Considerando a necessidade de aprimoramento do processo de planejamento das ações de vigilância sanitária, resolve:

Art. 1º  Aprovar e dar divulgação ao Plano Diretor de Vigilância Sanitária, na forma do Anexo  a esta Portaria.

Art. 2º  Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

JOSÉ GOMES TEMPORÃO

PLANO DIRETOR DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - PDVISA

EIXO I - ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DO SISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA NO ÂMBITO DO SUS

O reconhecimento da Vigilância Sanitária - Visa como responsabilidade indelegável do Estado e como um componente indissociável do SUS é a base estratégica do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária - SNVS. Nesse sentido, tem-se o entendimento de que esse campo da saúde pública é, também, uma arena de conflitos e um espaço privilegiado de intervenção para a defesa dos interesses sanitários e coletivos. Portanto, cabe à Vigilância Sanitária, em articulação com as demais práticas de saúde, atuar no âmbito da proteção contra danos, riscos e determinantes dos problemas de saúde que afetam a população.

Assim, a intersetorialidade é adotada, prioritariamente, como prática de gestão, permitindo o estabelecimento de espaços compartilhados para o desenvolvimento das ações e serviços de saúde, tanto no âmbito da saúde como na relação com outros setores governamentais e não-governamentais.

No processo de fortalecimento do SNVS, os princípios e diretrizes do SUS estão permanentemente presentes. A busca, na atenção à saúde, pelos princípios da universalidade, integralidade, eqüidade, descentralização da gestão e das ações, regionalização e hierarquização dos serviços de saúde e participação social orientarão sempre o estabelecimento de políticas e a pauta de negociação entre os gestores das três esferas de governo.

Nesse sentido, a descentralização das ações de Vigilância Sanitária é, além de um princípio norteador, uma estratégia de fortalecimento desse setor nas três esferas de governo. Por isso, a revisão das responsabilidades dos gestores do Sistema ultrapassa o campo das intenções normativas e incorpora o estabelecimento de metas de cobertura e definição de indicadores de desempenho, acompanhados por processos que viabilizem o controle social. O redirecionamento pretendido ajusta-se à capacidade de gestão de cada esfera de governo e à adoção do princípio da autoridade territorial, equilibrado pelo compromisso com a avaliação e o gerenciamento do risco sanitário.

A heterogeneidade decorrente das especificidades locais implicará a construção de pactos que expressem tal diversidade ou a utilização exclusiva da classificação das ações por níveis de complexidade. Nesse sentido, estabelece-se como ação essencial a revisão do processo de planejamento e execução das ações de Vigilância Sanitária sob uma nova ótica, a da responsabilidade sanitária, por meio da definição de um elenco norteador de ações que permita assimilar as diversidades locais, os problemas de saúde e as necessidades de intervenção diante da estrutura existente. Dessa forma, o elenco de ações deverá ser pactuado locorregionalmente como parte integrante de um processo de desenvolvimento dos serviços de Vigilância Sanitária capaz de subsidiar a descentralização e de gerar ações mais efetivas para a promoção e a proteção da saúde da população.

Há de se considerar também, no delineamento do processo de descentralização, o princípio da complementaridade das ações, sempre que o nível de execução preferencial não contar com as condições necessárias para seu desempenho.

Na lógica da descentralização, as pactuações e as programações das ações de Vigilância Sanitária devem levar em consideração o aporte de recursos financeiros dos entes federados e as novas perspectivas do financiamento setorial.

Assim, o financiamento das ações de Vigilância Sanitária acompanha as diretrizes do Pacto de Gestão para o financiamento do SUS. Nessa perspectiva compõe junto com o componente “Vigilância Epidemiológica e Ambiental” o Bloco da Vigilância em Saúde. O objetivo é que os recursos sejam alocados com vistas à superação das desigualdades de acesso e à garantia da integralidade da atenção à saúde.

Na área de organização do SNVS, as diretrizes preconizadas visam incrementar a capacidade de gestão dos órgãos que o integram nas esferas municipal, estadual e federal, por meio do delineamento das relações entre seus componentes, do estabelecimento das responsabilidades sanitárias respectivas e da adoção de instrumentos e mecanismos que garantam maior eficácia, eficiência e efetividade.

Nesse contexto, determinadas diretrizes visam à superação das deficiências de estrutura ainda observadas, como aquelas relativas à organização dos serviços e dos processos de trabalho em Vigilância Sanitária, ao estabelecimento de suporte jurídico e à gestão do trabalho, em termos qualitativos e quantitativos, assim como à implantação do Sistema Nacional de Informação em Vigilância Sanitária - Visa, que se articule com os sistemas de informações de base nacional do SUS.

Além disso, deve-se destacar a necessária articulação efetiva das políticas e práticas de Vigilância Sanitária, Vigilância Epidemiológica, Vigilância Ambiental e Saúde do Trabalhador, enfatizando-se o princípio da integralidade.

Ainda a discussão sobre o papel da rede laboratorial integrante do SNVS deve ser aprofundada na perspectiva da estruturação e manutenção de uma rede regionalizada e hierarquizada, com tecnologias adequadas aos diversos objetos de regulação da Vigilância Sanitária e com a perspectiva da retroalimentação dos conhecimentos e informações nela produzida aos demais componentes do Sistema. Para isso, é urgente a implementação de uma linha de financiamento específica para custear a estruturação e a execução das ações laboratoriais em Vigilância Sanitária, como também a definição de uma rede complementar que garanta a execução de ações laboratoriais de interesse da Vigilância Sanitária não existentes nos laboratórios de Saúde Pública.

A concretização dessas diretrizes parte dos Planos de Ação realizados em cada esfera de governo como um componente do processo de planejamento e formulação de seus Planos de Saúde, com o propósito precípuo de consolidar o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária no âmbito do Sistema Único de Saúde.

Diretrizes do Eixo I

1. Reafirmação do caráter indissociável da Vigilância Sanitária, como componente do SUS, respeitando seus princípios e diretrizes:

a) adequação dos processos de trabalho de Vigilância Sanitária visando à integração com as demais políticas e práticas de saúde;

b) estímulo à construção de práticas de gestão que incentivem a intersetorialidade, institucionalizadas formalmente, compartilhando espaços de ações e serviços com outros setores governamentais e não governamentais que possuam interface com o campo de atuação da Vigilância Sanitária e respeitando as especificidades locais; e

c) desenvolvimento, na esfera federal, de mecanismos que garantam a integração da ANVISA com as demais áreas responsáveis por ações de promoção e proteção à saúde.

2. Revisão do processo de planejamento e execução das ações de Vigilância Sanitária, sob a ótica da responsabilidade sanitária, com a definição do elenco norteador para subsidiar a descentralização da gestão e das ações, mediante:

a) a análise dos riscos sanitários, da situação de saúde e das necessidades sociais;

b) o levantamento e análise dos recursos físicos, financeiros e humanos existentes e os necessários ao desenvolvimento das ações de Vigilância Sanitária; e

c) a definição de agendas de prioridades locorregionais, com vistas a intervenções.

3. Definição das relações e responsabilidades sanitárias das três esferas de governo, estabelecendo formas de articulação e execução de ações de Vigilância Sanitária de maneira integrada e consoante com os princípios do SUS:

a) articulação, cooperação e apoio efetivo entre Ministério da Saúde, ANVISA, Estados, Distrito Federal e Municípios, visando à consolidação do processo de estruturação do SNVS, por meio da pactuação entre as três esferas de governo;

b) definição e implementação de instrumentos de pactuação e gestão que favoreçam maior eficiência, eficácia e efetividade à ação de Vigilância Sanitária, reconhecendo e respeitando a diversidade e especificidade locorregional; e

c) aprofundamento da estruturação do SNVS para o gerenciamento dos riscos e controle sanitário de portos, aeroportos e fronteiras, por meio da pactuação e do fortalecimento da articulação entre as esferas de governo.

4. Fortalecimento da Vigilância Sanitária em todas as esferas de governo:

a) indução política da estruturação da Vigilância Sanitária a fim de que cada esfera de governo tenha estrutura e estratégias para o gerenciamento do risco sanitário local;

b) promoção da qualificação dos profissionais que atuam em Vigilância Sanitária;

c) estímulo à introdução da temática de Vigilância Sanitária na pauta dos espaços colegiados de gestão, discussão técnica e pactuação do SUS; e

d) apoio jurídico à Vigilância Sanitária, fortalecendo suas ações locais.

5. Desenvolvimento de processos de planejamento, monitoramento, avaliação e auditoria compartilhados e contínuos, nas três esferas de governo, para melhor apoiá-las no processo de assunção de suas responsabilidades:

a) desenvolvimento de processos e instrumentos de avaliação dos serviços e das ações de Vigilância Sanitária - expressos nos Relatórios de Gestão das três esferas de governo - visando à redução dos riscos e agravos à saúde; e

b) definição de metas de cobertura e de indicadores de desempenho e incorporação dos resultados das avaliações ao processo decisório nas três esferas de governo.

6. Constituição de uma política de financiamento para investimento e custeio, em consonância com as diretrizes do Pacto pela Saúde, por parte das três esferas de governo, com vistas à estruturação dos serviços e à operacionalização das ações de Vigilância Sanitária - Visa, adotando a eqüidade e a transparência na aplicação dos recursos como princípios norteadores.

7. Estruturação e implantação de um Sistema Nacional de Informação, que promova transparência e subsidie o processo de gestão do SNVS, integrado aos sistemas de base nacional do Ministério da Saúde.

8. Harmonização da Gestão do Trabalho e Educação em Vigilância Sanitária com as diretrizes da Política Nacional de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde.

9. Articulação do Sistema Nacional de Laboratórios de Saúde Publica como suporte das ações de Vigilância Sanitária:

a) desenvolvimento de tecnologias de comunicação, para permitir a troca ágil de informações referentes à comunicação do risco sanitário;

b) definição de uma linha de financiamento para custeio e investimento; e

c) reestruturação da rede complementar de laboratórios.

10. Articulação efetiva das políticas e práticas de Vigilância Sanitária, Vigilância Epidemiológica, Vigilância Ambiental e Vigilância da Saúde do Trabalhador.

11. Consolidação da responsabilidade dos componentes do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária de exercer seu poder de polícia em relação às condições e ambientes de trabalho.

EIXO II - AÇÃO REGULATÓRIA: VIGILÂNCIA DE PRODUTOS, DE SERVIÇOS E DE AMBIENTES

A reconfiguração da ordem econômica mundial recente e, principalmente, as expectativas de contínuas mudanças decorrentes da globalização e da rapidez da circulação de informações tornam as práticas de Vigilância Sanitária crescentemente relevantes. Os novos padrões de produção e circulação de mercadorias e seus possíveis efeitos sobre a saúde das populações têm levado à necessidade de adoção de medidas de proteção da saúde ao mesmo tempo ágeis, firmes e criativas por parte dos órgãos públicos, privados e da sociedade em geral.

No que tange à Vigilância Sanitária, a reorientação das ações de regulação constituirá medida fundamental para responder às novas exigências sociais e políticas geradas com a expansão do mercado de consumo e a diversificação dos produtos e dos serviços ofertados pelos setores produtivos.

A Vigilância Sanitária pode ser vista como espaço de intervenção do Estado, cujo objetivo é adequar o sistema produtivo de bens e de serviços de interesse sanitário, bem como os ambientes, às demandas sociais e às necessidades do sistema de saúde. Sua principal função é atuar no sentido de prevenir, eliminar ou minimizar o risco sanitário envolvido em suas áreas de atuação, promovendo e protegendo a saúde da população.

Desse modo, suas ações têm o propósito de implementar concepções e atitudes éticas a respeito da qualidade das relações, dos processos produtivos, do ambiente e dos serviços. Em virtude de seu papel regulador, essas ações representam uma importante possibilidade de articular os poderes governamentais, impulsionar a participação social e aperfeiçoar as relações sociais.

O processo de estruturação da Vigilância Sanitária acompanhou as mudanças e as reformas do Estado. A partir do início da década de 1990, a reforma do Estado visava, sobretudo, à redução do tamanho do Estado e à mudança de regras macroeconômicas. O foco estava na agilização administrativa e no atendimento das demandas do setor produtivo. Com a criação do Mercosul, em 1991, a Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária passou a se responsabilizar também pelos processos de harmonização da regulamentação sanitária. Na segunda metade dessa mesma década, ocorreu nova onda de reformas e foi criada a Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Pode-se afirmar que em cada época foi adotado um conceito e um modelo de regulação, embora esse termo seja relativamente recente. Classicamente, o termo regulação tem uma carga conceitual pautada nos processos econômicos e de reestruturação do papel do Estado, capitaneada pela reforma neoliberal produzida nas últimas décadas. A partir desse conceito, limita-se o papel do Estado no processo de produção e consumo de bens, produtos e serviços, a “regulador” do mercado. Utilizado sem muitos problemas nos campos abarcados pelas agências criadas para regular as atividades econômicas privatizadas (energia elétrica, telefonia etc.), mostra-se limitado quando aplicado aos objetos de trabalho da saúde e, mais especificamente, da Vigilância Sanitária. Diante dessa constatação, torna-se necessário que seja traduzido para essa área que, idealmente, deve estar voltada à gestão do risco sanitário.

Para grande parte dos autores, o processo de regulação abrange: aprovação de regras pertinentes (regulamentos, normas, resoluções etc.); implementação concreta desses regulamentos (autorizações, licenças, registros etc.); fiscalização de seu cumprimento e imposição de sanções ou penalidades perante as infrações. Portanto, regulação conjuga os três tipos de poder: normativo, executivo e parajudicial. Ela cumpre vários objetivos: restringir práticas empresariais, regular mercados, controlar qualidade e preço, afastar a concorrência desleal e, ainda, corrigir informações aos consumidores. Esse processo também merece uma reflexão profunda para sua transposição para a área da Vigilância Sanitária.

Assim, a regulação nessa área ganha um complemento ao conceito. Trata-se aqui não apenas de regulação, mas regulação sanitária. Esta não se limita apenas a uma função de árbitro entre produtores e consumidores, diferencia-se por vários aspectos:

a) as características particulares dos produtos, bens e serviços que, ao ser utilizados, podem ter efeitos danosos à saúde;

b) são, muitas vezes, objetos de difícil materialização (o meio ambiente, o ar que respiramos, a fonte de água que bebemos), ou que são consumidos à medida que são produzidos (serviços de saúde);

c) necessidade de se conhecer ampla e previamente a realidade social e sanitária na qual esses produtos e serviços se inserem ou serão consumidos; e

d) não se trata de processo de consumo como os demais, mas de processo que envolve sujeitos e cidadãos ou coletividades que consomem bens ou serviços essenciais à sua vida.

Um segundo conceito deve ser considerado para a correta compreensão da regulação e sua aplicação na área da Vigilância Sanitária.  Ele está explícito na própria definição da função dessa área, que é a de atuar no sentido de prevenir, eliminar ou minimizar risco sanitário.  O conceito de risco tem sido objeto de muitas reflexões, pois, mais uma vez, sua transposição para a Vigilância Sanitária não pode se dar de forma direta e linear.  O termo risco não deve ser tomado apenas na sua concepção estatística no sentido de probabilidade de ocorrência de eventos danosos.  Muitas vezes o risco coloca-se como possibilidade, sem que haja, de fato, dados quantitativos, mas sim indícios, baseados na racionalidade e nos conhecimentos científicos disponíveis.  Essa concepção, aliada ao contexto de incertezas produzido pelas rápidas mudanças no sistema produtivo, é base, até mesmo, para que a Vigilância Sanitária adote em seu processo de regulação o princípio da precaução. Assim, além dos objetivos acima descritos no conceito mais clássico de regulação, na Vigilância Sanitária ele ganha outro objetivo fundamental – o de preservar e promover a saúde dos indivíduos, do meio ambiente e dos locais de trabalho.

A partir desses conceitos, pode-se pensar no modelo de regulação sanitária do País, que deve estar orientado pela identificação e avaliação dos riscos e busca de mecanismos que garantam a segurança sanitária e a proteção da saúde. A escolha entre alternativas para a regulação, diante das análises produzidas e das situações de incerteza científica, significa gerenciar os riscos, e estas escolhas não podem estar reduzidas a atos administrativos de natureza cartorial ou fiscalizatória. Também é preciso reconhecer que o processo de regulação se dá num contexto de conflitos de interesses, que podem gerar embates. Para minimizar suas fragilidades, é fundamental que as decisões estejam baseadas em conhecimentos científicos sólidos e ampla divulgação de informações, para que a sociedade organizada possa interferir no processo.

Com esse sentido ampliado de regulação, estratégias como o aprimoramento dos processos produtivos e do controle da qualidade dos produtos e serviços oferecidos, bem como a comunicação do risco e o estímulo ao consumo consciente são algumas das possibilidades de implementação da regulação com o objetivo de proteger a saúde da população. Nesse sentido, essas práticas deverão ser continuamente promovidas e aprimoradas para tornar as ações de vigilância mais efetivas, o que implica repensar os instrumentos e a incorporação adequada dos conhecimentos e tecnologias constantemente produzidos.

Dessa forma, a atribuição legal da Vigilância Sanitária diz respeito aos processos de regulação do risco sanitário, mas não deve se restringir apenas a uma perspectiva fiscalizatória e sim ampliar, a partir de uma visão que permita incorporar às práticas de proteção, aquelas de promoção da saúde. Importantes ações, hoje ainda incipientes na Vigilância Sanitária, tais como o monitoramento da propaganda, as notificações pós-comercialização, a comunicação do risco (alertas sanitários para a sociedade em geral), o monitoramento e a avaliação dos produtos e medicamentos registrados, em especial os novos ou com novas indicações, ao longo de sua comercialização e a educação em saúde visando ao consumo seguro de produtos e medicamentos poderiam ser exemplificadas como ações de promoção da saúde.

Outro aspecto considerado essencial para o adequado desenvolvimento da função de regulação é o reconhecimento do caráter intersetorial dos objetos das ações de Vigilância Sanitária, o que torna necessária a articulação com os diversos órgãos e instituições responsáveis pela normatização e acompanhamento de produtos, serviços e ações. Portanto, a criação de estratégias de integração e discussão com os diferentes atores envolvidos com a temática da Vigilância Sanitária constituem estratégias fundamentais de trabalho.

Entretanto, tendo em vista que a Vigilância Sanitária está organizada como um sistema em todo o território nacional, a regulação deve ser concebida considerando o papel dos três componentes do sistema – federal, estadual e municipal – potencializando seu caráter universal e de integralidade.

Ainda sobre o princípio constitucional da integralidade no SUS, é importante que ele seja aplicado, nas atribuições de regulação em Vigilância Sanitária, para compreender todo o ciclo produtivo de bens e serviços de interesse à saúde, desde a garantia da qualidade dos insumos importados, passando pela garantia dos procedimentos de produção ou de processamentos internos até o monitoramento da propaganda para seu consumo, sejam eles produtos ou serviços.

Uma outra importante diretriz para a Vigilância Sanitária diz respeito à sua articulação com a política de saúde do País. As ações de regulação devem se pautar por prioridades definidas nessa política, considerando programas e projetos desenvolvidos pelo Sistema Único de Saúde.

De forma geral, a circulação de informações e dos novos conhecimentos tem sido enormemente amplificada com a revolução tecnológica produzida pela informática. A incorporação desses conhecimentos e de evidências científicas bem embasadas é fundamental para dar consistência à regulação de áreas importantes como a de medicamentos e de produtos para a saúde. Portanto, são fundamentais investimentos vigorosos e ininterruptos em pesquisas e na capacitação de profissionais para acessar e analisar criticamente seus resultados.

O desenvolvimento e a implantação de um sistema de informação é hoje uma necessidade que deve ser vista como prioridade para o fortalecimento do SNVS. Seu papel seria o de consolidar as informações produzidas no próprio sistema, produzir alertas e auxiliar na tomada de decisões e definição de prioridades para a Vigilância Sanitária, além disso, deverá ter a capacidade de interoperabilidade com os sistemas e bancos de dados nacionais do Ministério da Saúde.

No aspecto do trabalho respaldado por evidências científicas, a discussão sobre o papel dos laboratórios deve ser aprofundada na perspectiva da estruturação e manutenção de uma rede com tecnologias recentes e adequadas aos diversos objetos de regulação e da retroalimentação dos conhecimentos e informações neles produzidas aos demais componentes do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária - Visa.

Por fim, deve-se ressaltar que a Vigilância Sanitária, em sua função reguladora, é muitas vezes vista, equivocadamente, como um entrave à produção local. No entanto, é importante destacar que o papel regulador, adequadamente conduzido, constitui-se em um instrumento de promoção da qualidade dos produtos e serviços, recebendo, até mesmo, o reconhecimento internacional e contribuindo para o desenvolvimento nacional.

Diretrizes do Eixo II:

1. Institucionalização de ações de caráter intersetorial com os diversos órgãos que tenham interface com ações de Vigilância Sanitária - VISA

a) articulação com outros órgãos responsáveis por ações regulatórias, reconhecendo seus limites de competência;

b) articulação das ações de Vigilância Sanitária com as prioridades das demais políticas públicas, nas três esferas de governo;

c) articulação com os diversos órgãos e entidades de proteção do consumidor, defesa da cidadania, regulação econômica e monitoramento de mercado, bem como com os órgãos responsáveis pelo controle de qualidade e avaliação de conformidade; e

d) articulação com as empresas empregadoras, sindicatos, estabelecimentos privados de prestação de servicos de saúde, operadoras de planos de saúde e Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para a redução de riscos sanitários e melhoria das condições de vida e saúde.

2. Aprimoramento da aplicação do princípio da precaução como um valor fundamental para as ações de Vigilância Sanitária, para a avaliação de novas tecnologias e para a tomada de decisões, de forma que proteja e promova a saúde da população.

3. Sistematização e incorporação dos conhecimentos produzidos no próprio SNVS às práticas de Vigilância Sanitária, a partir das ações de registro, fiscalização e monitoramento, dentre outras.

4. Promoção do acesso aos conhecimentos científicos pertinentes às ações de regulação para os profissionais do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.

5. Promoção de mecanismos de disseminação efetiva das comunicações de risco sanitário à população.

6. Articulação entre as diversas esferas de governo para a definição de prioridades da regulação sanitária e execução das ações de Vigilância Sanitária.

7. Articulação com a rede de Laboratórios de Saúde Pública nas diversas esferas de governo, como componente essencial ao exercício da ação regulatória.

8. Elaboração e revisão da legislação, do marco regulatório, dos regulamentos técnicos e dos processos de trabalho em Vigilância Sanitária, de forma participativa e tripartite, à luz dos conhecimentos recentes e das referências internacionais:

a) harmonização das ações e instrumentos de controle sanitário e adoção de procedimentos operacionais padronizados em Vigilância Sanitária; e

b) aprimoramento dos instrumentos inerentes ao processo regulatório, visando à racionalização das atividades da Vigilância Sanitária.

9. Consolidação e ampliação, em âmbito nacional, da estratégia de vigilância e monitoramento de eventos adversos e queixas técnicas relacionadas ao uso de produtos e serviços de saúde.

10. Articulação da ação regulatória da Visa com as diretrizes e estratégias da política de desenvolvimento nacional, levando em consideração os riscos sanitários, contribuindo para o aprimoramento da qualidade de produtos, processos e serviços.

EIXO III - A VIGILÂNCIA SANITÁRIA NO CONTEXTO DA ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE

A Vigilância Sanitária, concebida como campo de saúde coletiva, é indissociável do conjunto de ações que integram as políticas de saúde. Nessa dimensão, há a necessidade de articulação permanente das ações de Vigilância Sanitária nas distintas esferas de governo e destas com as ações de saúde desenvolvidas no âmbito do SUS. A adoção de práticas de saúde resolutivas, seguras, éticas e humanizadas, acompanhadas de iniciativas para a qualificação dos trabalhadores de saúde e a consolidação do controle social, constituirão dimensões essenciais para a qualidade e a integralidade da atenção à saúde prestada à população.

A integralidade pode refletir três grandes sentidos diferentes: o primeiro, refere-se às práticas dos profissionais de saúde; o segundo, refere-se à organização dos serviços e o terceiro, aplica-se às respostas governamentais aos problemas de saúde.

O avanço para a integralidade na atenção deverá estar expresso prioritariamente na estrutura e na organização dos serviços, nos instrumentos de planejamento e gestão adotados nos três níveis de governo, nos processos de trabalho e qualificação dos trabalhadores de saúde e no estímulo ao desenvolvimento de políticas intersetoriais. Essas diretrizes devem gerar as condições necessárias para a inserção da Vigilância Sanitária nos distintos níveis de complexidade da atenção à saúde do SUS.

Na atenção básica, a busca pela reestruturação da prática focada no atendimento integral e por serviços de qualidade, eficientes e resolutivos, deve ser objetivo norteador da Vigilância Sanitária em sua inserção nesse nível de atenção. Espera-se que além das ações assistenciais, sejam realizadas ações de promoção de saúde e de prevenção de agravos - incluindo aqueles relativos ao consumo de bens e serviços e as interações com o ambiente de trabalho e de vida, ações típicas do campo da Vigilância Sanitária - pelas equipes de saúde da família e das unidades básicas de saúde, com destaque para o agente de saúde.

Contudo, não se propõe que os profissionais de atenção básica devam incorporar a atribuição de polícia administrativa inerente aos profissionais de Vigilância Sanitária. A atenção básica em sua responsabilidade local deve incorporar o olhar que configura as ações de Vigilância Sanitária na história natural dos agravos e determinantes de saúde, desenvolvendo tecnologias de cuidado no contexto da integralidade.

Os profissionais de saúde, de forma geral, devem estar preparados para realizar ações próprias de assistência à saúde, para atuar na identificação de riscos sanitários potenciais e danos à saúde da população de seu território, bem como saber agir de forma multidisciplinar e intersetorial na proteção e promoção da saúde.

A Vigilância Sanitária deverá, também, articular-se às ações e aos programas desenvolvidos pelo SUS, destinados aos grupos vulneráveis de nossa sociedade, em virtude da necessidade de ações de promoção e proteção à saúde.

Trabalhar a integralidade no SUS não é apenas favorecer o trabalho conjunto de setores nos diferentes níveis de complexidade da assistência, mas descompartimentalizar as diversas ações locais, desenvolvendo um processo de trabalho condizente com a realidade local que ao mesmo tempo preserve as especificidades dos setores e compartilhe suas tecnologias, na constituição da qualidade de vida e da cidadania.

Diretrizes do Eixo III

1. Articulação permanente entre as ações de Vigilância Sanitária e os demais serviços e ações de saúde desenvolvidos no âmbito do SUS, garantindo a transversalidade nos diversos níveis de atenção à saúde.

2. Articulação das ações de Vigilância Sanitária, Epidemiológica, Ambiental e de Saúde do Trabalhador, no sentido de consolidar a vigilância dos determinantes do processo saúde-doença, com vistas à atenção integral à saúde.

3. Promoção e fortalecimento do trabalho conjunto da Vigilância Sanitária com a atenção básica, contribuindo para a reflexão de saberes e práticas multidisciplinares e intersetoriais, favorecendo a integralidade das ações de saúde, nas três esferas de governo:

a) desenvolvimento de novos processos de trabalho que incorporem as tecnologias de Vigilância Sanitária às ações básicas de saúde, com enfoque no risco sanitário; e

b) descompartimentalização dos processos de trabalho nas ações locais, preservando especificidades e compartilhando tecnologias, conhecimentos e experiências.

4. Revisão do processo de planejamento e execução das ações de Vigilância Sanitária, considerando a responsabilidade sanitária, o território, o risco sanitário, a transcendência de eventos de interesse da saúde e as prioridades nacionais e locorregionais de saúde, visando à integralidade das ações de atenção à saúde.

5. Articulação na definição de políticas de formação de trabalhadores do SUS para promover a integração da Vigilância Sanitária com as demais áreas da saúde no cumprimento do princípio da integralidade.

EIXO IV - PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO, PESQUISA E DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO

A pesquisa e o desenvolvimento tecnológico em Vigilância Sanitária assumem caráter importante na construção de uma agenda de atuação, devidamente articulada com a Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde (PNCTIS) do Ministério da Saúde.

No entanto, verifica-se uma lacuna no campo da produção do conhecimento em Vigilância Sanitária que precisa ser preenchida, quer seja por estratégias como o desenvolvimento de estudos sobre a função regulatória e seus impactos nos problemas de saúde, quer seja no controle de inúmeros riscos à saúde relacionados a processos produtivos e a bens de consumo e dos potenciais efeitos adversos de numerosas e complexas exposições relacionadas às diversas tecnologias utilizadas nos serviços de saúde.

É consenso que a pesquisa é ferramenta importante para a tomada de decisões na definição de políticas e no planejamento em saúde, contribuindo para a melhoria das ações de promoção, proteção e recuperação da saúde e a diminuição das desigualdades sociais. Nesse sentido, e em consonância com a PNCTIS, a Vigilância Sanitária incorpora como princípios básicos: o respeito à vida e à dignidade humana das pessoas, a melhoria da saúde da população brasileira, a busca da eqüidade em saúde, a inclusão e o controle social e o respeito à pluralidade filosófica e metodológica. A Vigilância Sanitária incorpora também as estratégias de ação da PNCTIS para a produção de conhecimento, pesquisas e desenvolvimento tecnológico no setor, como: a sustentação e o fortalecimento do esforço nacional em ciência, tecnologia e inovação em saúde, a criação do sistema nacional de inovação em saúde, a superação das desigualdades regionais, o aprimoramento da capacidade regulatória, a difusão dos avanços científicos e tecnológicos, bem como a formação e a capacitação de recursos humanos.

Observa-se também que as rotinas dos profissionais de Vigilância Sanitária são baseadas não só no aparato legal da legislação vigente, mas num somatório entre este e o conhecimento implícito das questões que perpassam as atividades relacionadas a produtos, serviços e ambientes.

A sistematização dessa prática profissional, realizada por meio de diversas abordagens metodológicas, possibilita avanços importantes para a melhoria dos processos de trabalho.

A busca de mecanismos de disseminação e intercâmbio da produção de conhecimento em Visa também tem sido bastante discutida pelo SNVS. Destacam-se, nesse sentido, os Simpósios Brasileiros de Vigilância Sanitária (Simbravisa), realizados pela Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco), que demonstram claramente as contribuições dos profissionais de Vigilância Sanitária para o acúmulo de conhecimentos relativos às ações desenvolvidas nesse campo.

O acelerado avanço tecnológico na área da saúde, paralelo à alta velocidade de incorporação dessas novas tecnologias no mercado, tende a provocar um déficit de conhecimento por parte dos gestores e dos profissionais que, muitas vezes, desconhecem a eficácia, a efetividade e a segurança na escolha da tecnologia apropriada para determinada situação. Para tanto, há necessidade de articulação com a Política Nacional de Gestão de Tecnologias em Saúde (PNGTS), a qual contempla os aspectos referentes à avaliação de tecnologia em saúde, desencadeando um amplo processo de produção, atualização, revisão e disseminação desses conhecimentos e sua aplicabilidade no setor, proporcionando informações úteis e adequadas para a tomada de decisão.

Outra questão de relevância é o desenvolvimento de padrões de ética nos estudos e pesquisas realizados. O crescimento acentuado das pesquisas no Brasil, se por um lado representa um avanço no desenvolvimento científico e tecnológico, por outro, aumenta as possibilidades de risco, engendrando novas formas de ameaças à saúde humana. Portanto, requer um cuidadoso acompanhamento dos centros de pesquisa, dos protocolos de pesquisa e o estabelecimento de critérios rigorosos de credenciamento e acompanhamento pelas comissões de ética.

A disseminação e difusão dos avanços científicos e tecnológicos por meio do estabelecimento de mecanismos de comunicação social apresentam-se como um meio para a apropriação dos conhecimentos produzidos e dos benefícios decorrentes dos estudos desenvolvidos por parte dos pesquisadores, setor regulado, gestores e trabalhadores do SUS e sociedade civil. Para tanto, faz-se necessária a constituição de canais de divulgação que permitam a introdução de formas de comunicação acessíveis e compreensíveis para o público em geral.

Além disso, entende-se como questão de importância fundamental para consolidação do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, o desenvolvimento de estratégias para a formação, a qualificação e a capacitação de profissionais que atuam no âmbito do Sistema de Saúde. Essas estratégias deverão contemplar o desenvolvimento de competências dos profissionais para uma atuação crítica e autônoma, minimizando-se, assim, a importação acrítica de padrões, modelos, protocolos de avaliação, critérios científicos e normas.

Desse modo, considera-se essencial a necessidade do desenvolvimento de estudos e pesquisas, de forma contínua e sistemática, acerca das tecnologias, produtos, serviços e ambientes de interesse à saúde, considerando a relação risco-custo-benefício, acompanhando seus efeitos adversos e promovendo estratégias continuadas para seu uso racional.

Diretrizes do Eixo IV

1. Estímulo à Produção de Conhecimento em Vigilância Sanitária, buscando integrá-la à Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde do SUS:

a) produção e disseminação do conhecimento em Vigilância Sanitária, com a participação de outros atores sociais, tais como: segmentos da sociedade civil organizada, setor regulado, instituições de ensino e pesquisa, profissionais de saúde etc.;

b) consolidação e ampliação dos Centros Colaboradores em Vigilância Sanitária, de acordo com as potencialidades regionais, articulando-os com os demais órgãos do SNVS, para o apoio ao desenvolvimento da Vigilância Sanitária; e

c) aprimoramento dos instrumentos de disseminação do conhecimento, para tornar mais efetiva a comunicação entre o SNVS e a população.

2. Consolidação do campo da Vigilância Sanitária nos espaços acadêmicos de formação e de produção científica, ensino e pesquisa e reconhecimento dela como campo de pesquisa, inerente ao campo da Saúde Coletiva, ressaltando a necessidade de interlocução com outras áreas, tendo em vista seu caráter interdisciplinar, multiprofissional e intersetorial.

3. Fomento à produção de conhecimento e ao desenvolvimento tecnológico voltados para o aprimoramento do SNVS, na perspectiva da diversidade de abordagens metodológicas:

a) participação com outros setores governamentais envolvidos na Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde para a elaboração de um plano de incorporação tecnológica a partir da identificação das necessidades de aquisição de equipamentos e tecnologias, com vistas à avaliação do impacto social, econômico, ambiental e sanitário decorrente de sua utilização;

b) aporte de recursos de forma contínua e sistemática ao desenvolvimento de pesquisas e tecnologia nos serviços de Vigilância Sanitária;

c) fomento à efetivação de estudos sobre os determinantes dos riscos sanitários decorrentes dos novos arranjos demográficos e epidemiológicos e dos modos de produção e consumo, objetivando a ampliar a efetividade na proteção da saúde;

d) estímulo à realização de estudos sobre a função regulatória e seus impactos nos problemas de saúde e no controle de inúmeros riscos à saúde relacionados a processos produtivos, bens de consumo, serviços e ambientes;

e) fomento à efetivação de parcerias entre o SNVS e instituições de ensino e pesquisa - nacionais e internacionais - para o desenvolvimento de projetos em Vigilância Sanitária, de forma que aprimore suas práticas e bases de ação; e

f) incentivo à produção de pesquisa pelos serviços de Vigilância Sanitária.

4. Contribuição da Vigilância Sanitária no processo de identificação das necessidades de aquisição de equipamentos e tecnologias e na definição de mecanismos de incorporação tecnológica e de pesquisas, que contemplem as singularidades regionais, para avaliação do impacto social, econômico, ambiental e sanitário decorrente de seu uso.

5. Utilização das diretrizes e definições estabelecidas na Política Nacional de Gestão de Tecnologias em Saúde (PNGTS) como base para a avaliação de tecnologia em saúde, envolvendo as três esferas de governo, com vistas a subsidiar a tomada de decisão acerca da incorporação crítica e independente de produtos e processos.

6. Incorporação e utilização do conhecimento acerca dos avanços tecnológicos e biotecnológicos em saúde, com ênfase na biossegurança, considerando as implicações e repercussões no campo da bioética e da ética em pesquisa:

a) utilização de mecanismos e critérios para avaliação do uso de produtos e serviços sujeitos à Vigilância Sanitária e outras inovações tecnológicas, visando ao desenvolvimento de pesquisas, considerando a avaliação de impactos e suas conseqüências para a saúde.

7. Promoção sistemática de eventos para a ampla difusão de conhecimentos sobre os determinantes do processo saúde-doença, fatores de risco e situação de saúde da população.

EIXO V - CONSTRUÇÃO DA CONSCIÊNCIA SANITÁRIA: MOBILIZAÇÃO, PARTICIPAÇÃO E CONTROLE SOCIAL

A Constituição Federal de 1988 possibilitou novas experiências de exercício da cidadania na medida em que criou espaços de participação representativos e democráticos para elaboração de políticas públicas e instrumentos de controle em sua implementação.

A Lei nº 8.142/90 dispõe sobre as instâncias de participação e controle social no Sistema Único de Saúde, regulamentando preceitos constitucionais no bojo da reforma democrática do Estado brasileiro. O Ministério Público, o Poder Legislativo e o Judiciário têm também atribuições relacionadas à defesa da cidadania em seus diversos aspectos, incluindo o que se refere ao direito à saúde.

No que diz respeito ao entendimento entre o que é participação e controle social não se tem como preocupação um aprofundamento conceitual desses objetos neste texto. Entretanto, é válido apontar que alguns autores definem controle social como a forma e os mecanismos com os quais a sociedade organizada fiscaliza e controla o poder público em relação às suas ações e gastos financeiros, exercendo assim seu direito de cidadãos em requererem do Estado a definição de prioridades. Por sua vez, outros autores consideram que a participação social deve também ser considerada como um exercício pleno de cidadania e de direito, descrita na Constituição, na qual a lógica não se restringe apenas à fiscalização, mas amplia sua contribuição à política pública que o Governo vem estabelecendo em suas ações de Estado.

Considerando as prerrogativas legais da Vigilância Sanitária – de interferir no espaço em que atuam forças de mercado e no jogo de interesses econômicos, cujos resultados influenciam diretamente as condições de vida e de saúde das pessoas –, os mecanismos de participação e controle social são essenciais para que todos os agentes que atuam na saúde e na produção de produtos e bens de consumo não comprometam as ações de Vigilância Sanitária fundamentais para o cumprimento da missão legal do Sistema Nacional de Vigilancia Sanitaria. Torna-se fundamental o debate público das decisões que possam afetar a segurança das pessoas e da coletividade, até mesmo na feitura das normas administrativas.

Observa-se que a Vigilância Sanitária esteve, em alguns momentos, na pauta das discussões dos mecanismos de participação e controle social, como: a I Conferência Nacional de Saúde do Consumidor, em 1986; a 11ª Conferência Nacional de Saúde, em 2000, na qual se apontou a necessidade de realização da conferência temática de Vigilância Sanitária; e a I Conferência Nacional de Vigilância Sanitária, realizada em 2001, cujo tema central tratou da efetivação do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, com vistas à proteção e à promoção da saúde, assim como à construção da cidadania.

Outro espaço de participação e controle social que hoje se encontra em funcionamento no Conselho Nacional de Saúde é a Comissão Intersetorial de Vigilância Sanitária e Farmacoepidemiologia, descrita no artigo 13, inciso III, da Lei nº 8.080/90, que tem por finalidade a articulação das políticas e programas de interface da Vigilância Sanitária com as demais áreas da saúde.

A exemplo das demais áreas da Saúde Coletiva, já existem, hoje, instâncias formais de participação e controle social direcionadas à Vigilância Sanitária. Entretanto, igualmente às demais áreas da saúde, tal participação e controle só podem ser exercidos mediante o conhecimento pela sociedade do que é Vigilância Sanitária e mediante o reconhecimento de sua importância como campo de promoção e proteção da saúde. Assim, entendendo que essa discussão atualmente é frágil, é importante enfatizar a necessidade de se promover ações que elevem a consciência sanitária da população de forma que tal participação e controle se efetivem.

Por sua natureza, a Vigilância Sanitária pode ser concebida igualmente como espaço de exercício da cidadania e do controle social, que, por sua capacidade transformadora da qualidade dos produtos, dos processos e das relações sociais, exige ação interdisciplinar e interinstitucional.

É importante, ainda, ressaltar a necessidade de mediação entre diferentes instâncias, para envolver o Executivo, o Legislativo, o Judiciário e outros setores do Estado e da sociedade, ampliando o compromisso desses com a concretização do SUS.

A Vigilância Sanitária entende que a parceria com a sociedade é fundamental para a concretização de suas ações visto que esta tem seu campo de atuação relacionado à defesa do consumidor real ou potencial de produtos e serviços, garantindo o direito do cidadão a uma vida saudável. Assim sendo, faz-se necessário desenvolver atividades de educação para a saúde, de democratização da informação, de transparência das suas ações e o estabelecimento de mecanismos de escuta da sociedade, possibilitando assim o incremento da consciência sanitária.

A comunicação e a educação podem ganhar expressão concreta nas ações de mobilização dos profissionais de saúde, da comunidade e dos movimentos sociais, para que esses atores reconstruam suas práticas. O desenvolvimento de instrumentos e mecanismos que possibilitem o diálogo entre os segmentos da sociedade, como os fóruns de discussão e as audiências públicas, são outras estratégias de estímulo à participação da sociedade que podem estimular o debate dos principais desafios da área.

Por fim, é imprescindível, para a melhoria contínua das ações de Vigilância Sanitária, a conscientização da população de seus direitos, para que possa efetivamente cobrá-los, pensando a saúde como parte de um projeto de vida baseado na autonomia, na democracia e na justiça social.

Diretrizes do Eixo V

1. Promoção de espaços compartilhados de atuação dos setores envolvidos na produção de saúde, fortalecendo parcerias intersetoriais e intra-setoriais, para desenvolvimento de ações voltadas à informação, mobilização, participação e efetivo controle social, com vistas a garantir os direitos à saúde de toda a população.

2. Promoção de ações que contribuam para elevar a consciência sanitária da sociedade, na percepção do risco sanitário e na compreensão do funcionamento do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, incluindo os aspectos da universalidade, do acesso, da democratização da informação, da comunicação e da transparência:

a) promoção de ações educativas e de comunicação que possam difundir a Vigilância Sanitária como uma política pública e responsabilidade indelegável do Estado;

b) desenvolvimento de processos de educação e de comunicação social, destinados à conscientização da sociedade quanto ao consumo de produtos e à utilização de serviços que têm impacto na saúde, observando-se a diversidade cultural, regional e social do País; e

c) sensibilização e qualificação dos trabalhadores de saúde, para atuação junto à comunidade, fortalecendo a compreensão, a mobilização e a informação em Vigilância Sanitária.

3. Fortalecimento e qualificação do controle social na temática de Vigilância Sanitária:

a) garantia do acesso à informação em Vigilância Sanitária;

b) aperfeiçoamento dos mecanismos de consultas e audiências públicas, a fim de possibilitar maior participação da sociedade na elaboração de normas sanitárias, nas três esferas de governo;

c) fortalecimento dos fóruns de discussão no âmbito da Vigilância Sanitária, com a participação dos órgãos de governo, do setor produtivo e dos segmentos da sociedade civil organizada;

d) estímulo à constituição de grupos técnicos para aprofundamento, reflexão e elaboração de subsídios, relativos ao tema Vigilância Sanitária, visando potencializar os trabalhos dos Conselhos de Saúde;

e) desenvolvimento de ações educativas em Vigilância Sanitária para os conselheiros de saúde;

f) articulação com os Conselhos de Saúde para a inserção da Visa de uma forma mais sistemática na dinâmica das ações pertinentes ao controle social; e

g) incentivo à inserção da Vigilância Sanitária na composição do temário das Conferências de Saúde, nas três esferas de governo.

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