Ministério da Saúde
Secretaria de Atenção à Saúde

CONSULTA PÚBLICA Nº 03, DE 13 DE SETEMBRO DE 2007

O Secretário de Atenção à Saúde, no uso de suas atribuições, adota a seguinte Consulta pública e determina sua publicação,

Considerando a importância do papel que desempenham os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas para a melhoria da qualidade dos processos de atenção à saúde, para a prescrição segura e eficaz, para a democratização do conhecimento médico, para o aperfeiçoamento da educação médica continuada, para a melhoria da qualidade da informação prestada aos pacientes sobre as opções terapêuticas existentes nas diversas situações clínicas tornando-os partícipes das decisões a serem tomadas e para a melhoria dos processos gerenciais dos programas assistenciais;

Considerando a necessidade de estabelecer Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas para as diversas doenças, que contenham critérios de diagnóstico e tratamento, e, observando ética e tecnicamente a prescrição médica, racionalizem a dispensação dos medicamentos preconizados para o tratamento das doenças, regulamentem suas indicações e seus esquemas terapêuticos e estabeleçam mecanismos de acompanhamento de uso e de avaliação de resultados, garantindo assim a prescrição segura e eficaz;

Considerando a necessidade de que os Protocolos Clínicos e Diretrizes terapêuticas a serem estabelecidos sejam fruto de consenso técnico e científico, que sejam formulados dentro de rigorosos parâmetros de qualidade, precisão de indicação e posologia, que sejam respaldados por estudos clínicos de fase 3, meta-análises de ensaios clínicos nacionais e/ou internacionais;

Considerando a necessidade de se promover ampla discussão desses Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, possibilitando a participação efetiva da comunidade técnico científica, sociedades médicas, profissionais de saúde e gestores do Sistema Único de Saúde - SUS, na sua formulação; e,

Considerando a necessidade de revisar/atualizar o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas -DISTONIAS – Toxina Tipo A aprovado pela Portaria SAS/MS nº 1.014 de 23 de dezembro de 2002, resolve:

Art. 1º - Submeter à Consulta Pública o PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS – DISTONIAS FOCAIS – Toxina Tipo A, constante do Anexo deste Ato, bem como o Termo de Consentimento Informado dele integrante.

Art. 2º - Estabelecer o prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data da publicação desta Consulta Pública, para que sejam apresentadas sugestões, devidamente fundamentadas, relativas ao Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas que trata o Artigo 1º desta Consulta Pública.

§ 1º As sugestões devem ser encaminhadas para o endereço eletrônico: distonias.dae@saude.gov.br.

§ 2º As sugestões enviadas deverão, obrigatoriamente, estar fundamentadas por:

I - Estudos Clínicos de fase 3 – realizados no Brasil ou exterior; e,

II - Meta-análises de Ensaios Clínicos.

§ 3º Caso exista necessidade de enviar volumes, desde que para complementar as sugestões encaminhadas por meio eletrônico, conforme previsto no § 1º deste artigo, deverão ser para o endereço: Ministério da Saúde – Secretaria de Atenção à Saúde – Departamento de Atenção Especializada – Esplanada dos Ministérios – Bloco “G” – 9º andar – sala 916 - CEP 70058-900 – Brasília – DF, com a seguinte identificação: Departamento de Atenção Especializada – DAE/SAS/MS, “Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – DISTONIAS FOCAIS – complementação das sugestões encaminhadas por e-mail no dia _____/_____/2007 (informar a data do envio)”.

§ 4ª As sugestões deverão ser acompanhadas pelos documentos que as fundamentam, conforme previsto no § 2ºdeste artigo. No caso de publicações estrangeiras, as mesmas deverão ser enviadas na versão original, sem tradução.

Art. 3º - Determinar que o Departamento de Atenção Especializada – DAE/SAS/MS, avalie as proposições apresentadas, elaborando a versão final consolidada do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas ora submetido à Consulta Pública, para que, findo o prazo estabelecido no Artigo 2º desta Portaria, esse seja aprovado e publicado, passando a vigorar em todo o território nacional.

Art. 4º - Estabelecer que, durante o período desta Consulta Pública e até a publicação da versão final consolidada, as Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios deverão utilizar o Protocolo aprovado por meio da Portaria SAS/MS/Nº 1.014, de 23 de dezembro de 2002, na regulação da assistência a ser prestada e na dispensação dos medicamentos nele previstos, sendo obrigatória a cientificação do paciente, ou de seu representante legal, dos potenciais benefícios, efeitos colaterais, contra-indicações e riscos relacionados ao uso do medicamento preconizado para o tratamento das Distonias Focais, o que deverá ser formalizado por meio da assinatura do respectivo Termo de Consentimento Informado, conforme modelo integrante do Protocolo.

Art. 5º - Esta Consulta Pública entra em vigor na data de sua publicação.

JOSÉ CARVALHO DE NORONHA

Secretário

ANEXO

Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas

Distonias Focais

Toxina botulínica Tipo A

1. Introdução

Distonia é uma disfunção neurológica caracterizada pela contração involuntária e sustentada de um músculo isolado ou um grupo muscular1, podendo ser primária (idiopática) ou secundária a outras doenças. As distonias podem causar movimentos e posturas anormais, que podem ser incapacitantes e, freqüentemente, dolorosas.1 Entretanto, nem toda contração muscular involuntária constitui uma distonia. Cãibras, tremor, espasticidade, e outros movimentos involuntários, como coréia, não são considerados distonias.

A incidência das formas focais de distonia é estimada em 2 novos casos por milhão de habitantes por ano, resultando em uma prevalência de 29,5 casos por 100.000 habitantes.1,2 Estes dados são maiores do que outras doenças neurológicas bem conhecidas, tais como doença do neurônio motor, miastenia gravis ou doença de Huntington.

De acordo com a distribuição corporal de seu acometimento, as distonias podem ser classificadas em:1, 2

Focal

envolve músculos de uma região limitada do corpo (por exemplo, a face)

Segmentar

envolve grupos musculares contíguos (por exemplo, no membro superior e ombro)

Hemidistonia

afeta os membros do mesmo lado do corpo

Multifocal

envolve segmentos corporais não-contíguos

Generalizada

envolvimento de uma perna e o tronco ou ambas as pernas e qualquer outro

segmento do corpo

O tratamento das distonias se baseia no alívio das contrações musculares, revertendo os movimentos e as posturas anormais e a dor associada. A toxina botulínica representa uma opção reconhecida para este tratamento, porém sua eficácia é restrita às distonias focais, sendo os seus principais benefícios a melhora funcional e a redução da dor.

2. Classificação Cid 10

G 24.0 – distonia induzida por drogas

G 24.1 – distonia familiar idiopática

G 24.2 – distonia não-familiar idiopática

G 24. 3 – torcicolo espasmódico

G 24. 4 – distonia orofacial idiopática

G 24. 5 – blefaroespasmo

G 24. 8 – outras distonias

3. Diagnóstico

O diagnóstico das distonias focais é baseado nos achados clínicos, sendo a investigação complementar indicada para a identificação de possíveis causas secundárias. As características clínicas que constituem os critérios diagnósticos para as distonias focais passíveis de tratamento com toxina botulínica são descritas abaixo.

3.1 Distonias Craniofaciais e Espasmo Hemifacial

3.1.1 Blefaroespasmo

Blefaroespasmo é a contração espasmódica involuntária e bilateral do músculo orbicular dos olhos que causa fechamento ocular forçado, intermitente ou sustentado. Contrações da musculatura frontal e músculos médios e inferiores da face podem ocorrer concomitantemente, na chamada Síndrome de Meige.3 Os primeiros sintomas costumam ser sensação de irritação ocular ou hipersensibilidade à luz, ocasionando aumento da freqüência do piscamento, cuja intensidade vai aumentando gradualmente até tornar-se uma contratura espasmódica, dificultando a abertura ocular. Em alguns casos, pode haver grande dificuldade de visão (cegueira funcional) devido aos espasmos, sendo necessária ajuda para a realização das atividades habituais.4, 5

3.1.2 Espasmo hemifacial

Espasmo hemifacial é um dos mais comuns distúrbios do movimento craniofaciais caracterizado por movimentos involuntários tônicos ou clônicos, irregulares, dos músculos de um só lado da face (orbicular dos olhos, frontal, risório, zigomático maior), além do platisma. O espasmo hemifacial, na verdade, não é uma distonia, mas sim um espasmo muscular freqüentemente associado à compressão do nervo facial por estruturas vasculares, na saída do tronco cerebral.6

3.1.3 Distonia oromandibular

Caracteriza-se por contrações espasmódicas da musculatura mastigatória (temporal e masseter), facial inferior (orbicular da boca, complexo submentoniano, pterigóideos lateral e medial), lingual, labial e, esporadicamente, cervical (platisma). Os espasmos causam dificuldade para abrir e/ou fechar a boca devido ao desvio lateral da mandíbula, trismo ou bruxismo e desvio lateral ou superior ou protrusão da língua.2,7 Desta forma, dificultam a mastigação, deglutição e articulação das palavras e causam limitação funcional e embaraço social para muitos pacientes.8

3.2 Distonia Laríngea ou Disfonia Espasmódica

A distonia laríngea é uma forma de distonia focal que compromete os músculos da prega vocal, da laringe e da faringe envolvidos no processo de vocalização, podendo estar associada a distonia de outros músculos faciais. Existem duas formas de distonia laríngea: distonia adutora e abdutora.

Na distonia adutora, ocorre adução exagerada e irregular da prega vocal, que determina um padrão de voz cansado, com timbre metálico, áspero, tenso-estrangulado, do tipo sufocado, com início e término abruptos (voz entrecortada), devido a quebras curtas na fonação. A fala tem redução da maciez e se torna menos compreensível, embora o canto seja usualmente menos afetado do que a fala propriamente dita, exceto nos casos graves.

Na distonia abdutora, forma menos freqüente, ocorre contração sustentada dos músculos cricoaritenóideos posteriores, com abdução exagerada da prega vocal. A voz fica reduzida em volume, assoprada ou sussurrada, de esforço, resultando em segmentos afônicos e dificultando a compreensão.9, 10

3.3 Distonia cervical ou torcicolo espasmódico

É o tipo mais comum de distonia focal; caracteriza-se por contração involuntária de músculos da região cervical, de forma assimétrica, ocasionando alterações da postura cefálica tais como desvio lateral, para frente, para trás, rotação ou ainda uma combinação desses movimentos. Além disso, é comum a variação na intensidade dos espasmos, que costumam piorar durante períodos de estresse e de cansaço e melhorar com o repouso ou quando em decúbito. Dor é uma manifestação comum das distonias cervicais, estando presente em cerca de dois terços dos pacientes.2, 11, 12

A distonia cervical classifica-se em:

Tipo I: cabeça rotada para um lado, com elevação do ombro ipsilateral

Tipo II: cabeça rotada para um lado

Tipo III: cabeça inclinada para um lado, com elevação do ombro ipsilateral

Tipo IV: cabeça inclinada para trás

3.4 Distonia de membro

3.4.1 Cãibra do Escrivão

Neste tipo de distonia focal, também conhecido como cãibra ocupacional ou de tarefa, ocorre uma excessiva contração muscular simultânea de músculos antagonistas do antebraço apenas durante um ato específico, em geral o de escrever. Normalmente, costuma permanecer restrita ao membro que está sendo utilizado, afetando mais freqüentemente o grupo de músculos flexores do antebraço,13 mas o compartimento extensor também pode estar envolvido. Evolução do quadro pode ocorrer, com as contrações musculares sendo desencadeadas pela realização de outros movimentos ou surgindo mesmo durante o repouso. É possível que este distúrbio seja conseqüência da atividade repetitiva do membro em indivíduos geneticamente predispostos.14

4. Protocolo de tratamento com toxina botulínica

4.1 Critérios de inclusão

Serão incluídos no Protocolo de tratamento com toxina botulínica os pacientes que apresentarem uma das formas de distonia ou espasmo hemifacial como descrito acima, de acordo com os critérios diagnósticos apresentados:

- blefaroespasmo - distonia laríngea

- espasmo hemifacial- distonia cervical

- distonia oromandibular- cãibra do escrivão

4.2 Critérios de exclusão

Serão excluídos do Protocolo os pacientes que apresentarem pelo menos um dos itens a seguir:

· gestantes ou mulheres em amamentação;

· hipersensibilidade à toxina botulínica ou a um de seus componentes;

· doença neuromuscular associada (por exemplo: doenças do neurônio motor, miastenia gravis);

· uso concomitante de potencializadores do bloqueio neuromuscular (por exemplo: aminoglicosídeos);

· presença provável de anticorpos contra a toxina botulínica, definida por perda de resposta terapêutica, após um determinado número de aplicações, em paciente com melhora inicial;

· perda definitiva de amplitude articular por anquilose e / ou retração tendínea.

4.3 Fármaco

A toxina botulínica é uma neurotoxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum. Seu principal mecanismo de ação é o bloqueio da liberação de acetilcolina, que é o principal neurotransmissor da placa motora. Ocorre interrupção da transmissão neuronal com conseqüente bloqueio neuromuscular. Por este motivo, a TBA é usada em condições que se caracterizam por atividade muscular exagerada como é o caso das distonias. Após a injeção local, a TBA difunde-se pelos músculos e outros tecidos. Seu efeito concentra-se próximo ao ponto de aplicação e diminui com o aumento da distância com relação a este ponto. Difusão para músculos vizinhos é possível, especialmente quando volumes elevados são utilizados, podendo ocasionar eventos adversos.15

O uso clínico da TBA começou no início da década de 80 e, desde então, vários estudos, incluindo ensaios clínicos randomizados e metanálises, têm demonstrado sua eficácia e segurança no tratamento das distonias focais. Este protocolo inclui apresentações comerciais da TBA que, individualmente, tiveram sua eficácia clínica demonstrada no tratamento das distonias focais.

Em nosso meio, existem três diferentes apresentações comerciais da toxina botulínica, todas do tipo A, registradas na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e comercializadas pelos laboratórios Allergan, Biosintética e Cristália. Neste protocolo serão utilizadas as nomenclaturas toxina botulínica tipo A 1 – TBA-1, toxina botulínica tipo A 2 – TBA-2 e toxina botulínica tipo A 3 – TBA-3.

As apresentações comerciais de TBA têm formas de armazenamento, diluição e doses de administração diferentes. São produtos biológicos que apresentam mecanismo de ação idêntico, mas diferem em seu comportamento farmacocinético. O médico deverá conhecer suas similaridades e diferenças, pois não há uma razão fixa de equipotência entre elas. Não existem unidades-padrão internacionais e as unidades de uma preparação não são intercambiáveis com as de outra, ou seja, as unidades de uma formulação de toxina são exclusivas para aquele produto.

Em geral, aceita-se uma proporção de 1:1 entre as formulações da TBA-1 e TBA-3.16 Um ensaio clínico randomizado e cruzado, realizado no Brasil, avaliando a eficácia e tolerabilidade da TBA-3 em comparação à TBA-1 no tratamento do blefaroespasmo e do espasmo hemifacial, demonstrou terem ambas eficácia e segurança equivalentes. Quando administradas em doses e pontos de aplicação idênticos, apresentaram os mesmos resultados quanto à melhora subjetiva global, ao tempo para início de resposta, à duração da eficácia e a incidência e gravidade dos efeitos adversos.17

A TBA-2, entretanto, não pode ser administrada de forma idêntica às demais.18 Até o momento, somente quatro estudos randomizados e controlados procuraram estabelecer uma correlação de doses entre essas apresentações e, apesar da dificuldade em estabelecer um consenso sobre a proporção mais adequada, a literatura internacional aceita uma proporção de 1:3 ou 1:4 entre a TBA-1 e a TBA-2.19, 20, 21, 22

As características das apresentações de TBA são apresentadas a seguir.

 

TBA-1

TBA-2

TBA-3

Forma farmacêutica

Pó seco a vácuo

Pó liofilizado injetável

Pó liofilizado injetável

Número de Unidades por frasco

100 U

500 U

100 U

Volume do frasco

10ml

3ml

3ml

Composição

0,5mg de albumina humana e 0,9mg de NaCl

0,125mg de albumina humana e 2,5mg de lactose

5 mg de gelatina, 25 mg de dextrano e 25 mg de sacarose

Armazenagem pré-reconstituição

<-5°C em freezer ou

2 - 8°C em geladeira

2 - 8 °C

2 - 8ºC

Armazenagem pós-reconstituição

4 - 8 °C

4 - 8 °C

2 - 8ºC

Tempo de validade pós -

Reconstituição

4 horas

8 horas

4 horas

4.4 Esquema de administração

Para a aplicação da TBA as seguintes normas técnicas são recomendadas:

· a aplicação deve ser realizada por médico especialista em Neurologia, Neurocirurgia ou Fisiatria e, nos casos de distonia laríngea, por médico especialista em Otorrinolaringologia;

· utilizar sempre soro fisiológico 0,9%, sem conservantes, para diluição;

· evitar o borbulhamento ou a agitação do conteúdo do frasco durante a diluição e a aspiração do medicamento para a seringa de injeção;

· indicar e modificar as injeções (doses e pontos de aplicação) de acordo com o resultado terapêutico obtido após cada aplicação;

· aplicar as injeções em múltiplos pontos em cada músculo (pelo menos 2 pontos, podendo ser mais, nos músculos grandes);

· recomenda-se que a dose máxima para cada aplicação seja 400U da TBA-1 ou TBA-3 ou entre 1000U – 1500U da TBA-2, independentemente do número de músculos envolvidos e do número de pontos de aplicação nos quais será dividida;

· nas crianças, a dose máxima, por sessão de aplicação, deve ser de 12U/kg ou 400U de TBA-1 ou TBA-3 e 10 - 30U/kg (não devendo exceder 1000U) de TBA-2;

· administrar a TBA em todos os músculos desejados na mesma sessão de aplicação;

· respeitar um intervalo mínimo de 3 meses entre as aplicações de TBA (para diminuir o risco de formação de anticorpos contra a toxina), mesmo que sejam em músculos diferentes;

· uso de eletromiografia (EMG) para as aplicações de TBA: segundo a literatura,23 as taxas de melhora são semelhantes entre as aplicações guiadas ou não por EMG, concluindo que seu uso não é necessário na maioria dos pacientes. Mesmo assim, para casos especiais, quando determinados músculos não podem ser adequadamente palpados ou quando o paciente é refratário à abordagem convencional, pode-se utilizar EMG ou eletroestimulação para otimizar a administração da toxina, a critério do Centro de Referência.

4.4.1 Tratamento dos tipos específicos de distonia

Blefaroespasmo

Existem vários estudos avaliando a eficácia da toxina botulínica no tratamento do blefaroespasmo. Uma revisão que analisou 55 estudos, com mais de 2500 pacientes no total24 concluiu ser a TBA altamente efetiva no tratamento desta condição, com uma taxa de sucesso de aproximadamente 90% e duração média de efeito entre 2 e 3.5 meses. Usualmente administra-se a TBA em 3 a 5 pontos do músculo orbicularis oculi, bilateralmente.25 Deve-se evitar a porção central da pálpebra superior, para que não ocorra a indesejada difusão para o músculo elevador da pálpebra superior, com risco de ptose palpebral. Injeções centrais na pálpebra inferior também devem ser evitadas.20 As doses recomendadas para aplicação no músculo orbicularis oculi encontram-se abaixo:15

 

TBA-1 e TBA-3

TBA-2

Dose por ponto

2,5 - 5 U

20 U

Dose total por olho

10 - 30 U

40 - 140 U

Se a resposta clínica inicial for inadequada, as doses podem ser aumentadas em cerca de 2 a 4 vezes. Doses maiores que 5U de TBA-1 ou TBA-3 por sítio não trazem beneficio adicional e não devem ser utilizadas.26,27 Em pacientes com contração concomitante da região da sobrancelha e/ou dos demais músculos faciais (síndrome de Meige) pontos adicionais de injeção podem ser aplicados nos músculos corrugador, frontal, zigomático, rizório ou platisma,28, 29 em doses semelhantes.

B. Espasmo hemifacial

Existem poucos ensaios clínicos randomizados e controlados que avaliaram o uso de TBA para este tratamento. No entanto, há evidências de que o tratamento com TBA melhora cerca de 88% dos casos de espasmo hemifacial.24 As injeções podem ser administradas tanto por via subcutânea quanto intramuscular. A literatura não é conclusiva quanto aos sítios de aplicação e as doses padrão utilizadas, mas, usualmente, doses similares às utilizadas no blefaroespasmo são aplicadas no músculo orbicularis oculi 28 e doses adicionais de 2,5 - 5 U são administradas nos demais músculos faciais, usualmente ao nível do malar e da musculatura zigomática.30 A resposta clínica começa a ser observada cerca de 2 a 4 dias após as injeções e atinge um pico de ação ao fim da primeira semana,31 e o efeito persiste por aproximadamente 16 semanas.29, 31, 32 A dose total utilizada é 17,5 - 50 U de TBA-1/ TBA-3 ou 50 - 200 U de TBA-2.

C. Distonia oromandibular

O tratamento desta condição com TBA requer um detalhado conhecimento da anatomia local. Nos casos em que existe abertura da boca, os principais músculos envolvidos são aqueles do complexo submentoniano e pterigóideo lateral. Quando o espasmo é de fechamento da boca, os principais músculos são o masseter, o pterigóideo medial (ou interno) e o temporal.

O tratamento com TBA, em estudos não controlados, promoveu melhoria em até dois terços dos pacientes.33 As doses recomendadas para este tratamento estão abaixo.26, 33

Músculos / doses totais

TB-A1 e TB-A3

TB-A2

Complexo submentoniano

12,5 - 50 U

40 - 200 U

Masseter

25 - 75 U

75 - 300 U

D. Distonia laríngea ou disfonia espasmódica

Antes de um paciente ser considerado candidato para injeções com TBA, o diagnóstico de distonia laríngea deve ser confirmado por avaliação neurológica e otorrinolaringológica. Os achados clínicos devem ser documentados por videolaringoscopia e a administração da TBA deve ser executada pelo ou com acompanhamento do otorrinolaringologista.

Na disfonia espasmódica adutora (forma mais comum) o músculo tireoaritnóideo deve ser localizado e injeções percutâneas de TBA devem ser realizadas através da membrana cricotireodéia, com uma dosagem recomendada de TBA-1 entre 4 e 10 U, de acordo com a gravidade da distonia.34

Os benefícios do tratamento com TBA verificados envolvem melhora significativa da gravidade dos sintomas sob vários aspectos, conforme demonstrado por vários estudos, incluindo metanálises35, 36 e estudos de coorte.37 A melhoria nos parâmetros fisiológicos, acústicos e auto-perceptuais foi estatisticamente significativa, variando a porcentagem de melhora em cada medida entre 74 a 91%, embora nenhuma diferença tenha sido encontrada entre injeções uni ou bilaterais. A melhora da voz observada com TBA começa após 24 a 72 horas da aplicação e dura por 4 meses.38

E. Distonia cervical

O tratamento da distonia cervical com TBA ocasiona melhora significativa da posição anormal da cabeça e da dor, quando comparado contra placebo.39, 40 Cerca de 80% dos pacientes apresentam melhora do desvio postural e 76% a 93% têm melhora da dor. A melhora clínica tende a ser observada em torno de 7 dias após a aplicação, porém, em alguns casos, pode levar até 4 a 8 semanas para aparecer.41 O pico de resposta se dá em 4 a 6 semanas e a duração de efeito é de cerca de 3 meses.42, 43 A correta seleção dos músculos envolvidos, de acordo com o tipo de distonia cervical, é o fator mais importante para a adequada resposta ao tratamento. As doses e músculos são sumarizados na tabela a seguir:15

Tipo de Distonia Cervical

Músculos Envolvidos

Pontos de

Aplicação

Dose de Toxina Botulinica A

 (unidades)

TBA-1 / TBA-3

TBA-2

Tipo I: Cabeça girando para o lado e elevação do Ombro

Esternocleidomastoideo

mínimo 2

50 - 100

150 - 400U

Elevador da escápula

1 - 2

50

200

Escaleno mínimo

2

25 - 50

75 - 200

Esplênio

1 - 3

25 - 75

75 - 300

Trapézio

1 - 8

25 - 100

75 - 400

Tipo II: Apenas rotação Da Cabeça

Esternocleidomastoideo

mínimo 2

se dose > 25U

25 -100

75 - 400

Tipo III: Cabeça inclinada para um lado com elevação do ombro

Esternocleidomastoideo

mínimo 2

25 - 100

75 - 400

Elevador da escápula

mínimo 2

25 -100

75 - 400

Escaleno

mínimo 2

25 -75

75 - 300

Trapézio

1 - 8

25 -100

75 - 400

Tipo IV: Espasmo muscular bilateral posterior com elevação da face

Esplênio bilateral

2 - 8

50 - 200

150 - 800

Trapézio

1 - 8

25 - 100

75 - 400

F. Cãibra do escrivão

Três ensaios clínicos demonstram uma melhora significativa da postura e/ou da dor associada em pelo menos uma das aplicações.44, 45, 46 A resposta clínica inicia-se, aproximadamente, uma semana após a injeção, com efeito máximo em duas semanas e duração em torno de 3 meses. No entanto, apesar do benefício inicial, somente um terço dos pacientes permanecem em tratamento continuado por mais de 2 anos.47 Pacientes do sexo feminino e aqueles com punho em flexão têm melhor prognóstico, enquanto os com tremor distônico associado apresentam pobre resposta.13 Não há estudos comparativos entre a TBA-1 e TBA-2 para esta distonia. As doses recomendadas para o tratamento desta distonia estão descritas na tabela abaixo:15

Músculos

Dose de toxina botulínica A (Unidades)

TBA-1 / TBA-3

TBA-2

Flexor profundo dos dedos

20 -40

60 -120

Flexor ulnar do carpo

Flexor superficial dos dedos

25 - 50

75 - 150

Flexor radial do carpo

Flexor longo do polegar

10 - 20

30 - 50

Extensor longo do polegar

Pronador redondo

20 - 30

60 - 100

Lumbricais/extensor do dedo índice

5 - 10

15 - 30

Extensor comum dos dedos

15 - 25

50 - 75

4.5 Tempo de Tratamento

O tempo de tratamento é indeterminado e o mesmo deve ser mantido enquanto o paciente apresentar resposta terapêutica e não houver nenhum dos critérios de exclusão. As aplicações devem ocorrer em intervalos maiores de três meses. Será considerada "falha terapêutica" se os pacientes não obtiverem os benefícios esperados com o tratamento ou se apresentarem efeitos adversos graves ou que interfiram com as suas atividades habituais.

4.6 Desenvolvimento de Anticorpos Contra TBA

Embora a maioria dos pacientes continue a responder às injeções de TBA, alguns se tornam menos responsivos ao longo do tempo, ou até mesmo refratários ao tratamento. Ainda que problemas técnicos, tais como local de aplicação ou dose insuficiente possam justificar a perda do benefício de resposta, é freqüente, entre os médicos aplicadores, atribuir-se o fracasso terapêutico ao desenvolvimento de anticorpos neutralizantes para a TBA. Não existem dados comparando a probabilidade de desenvolver anticorpos anti-TBA entre as diferentes preparações de TBA comercialmente disponíveis. Desta forma, a melhor estratégia ainda para evitar a formação de anticorpos neutralizantes da TBA é buscar sempre a menor dose e o maior intervalo interdoses possível, independentemente da apresentação comercial que estiver em uso.

4.7 Efeitos adversos

As injeções de TBA são geralmente bem toleradas, não havendo diferenças significativas entre as apresentações comerciais de TBA com relação a seus efeitos adversos. Os mais comuns estão relacionados aos sítios de injeção ou à fraqueza excessiva dos músculos injetados, a qual, em geral, é transitória, porém pode ter variados graus de intensidade.27, 32 Seu uso repetido pode levar à fraqueza e atrofia dos músculos estriados.27, 48

Efeitos adversos sistêmicos são raros e consistem de um quadro semelhante ao viral, que é transitório, mas pode persistir por algumas semanas. Injeções intravasculares acidentais podem ocasionar fraqueza muscular generalizada.43 Abaixo estão relacionados alguns dos principais efeitos adversos da TBA de acordo com o local de aplicação:

· Relacionados aos sítios de injeção: sensação dolorosa e equimoses ou hematomas locais

· Músculos periorbitais: mais comuns são lacrimejamento, fotofobia e irritação ocular. Pode ocorrer fraqueza muscular excessiva, que impossibilita o fechamento ou a abertura dos olhos. Cerca de 10% dos pacientes desenvolvem ptose palpebral, a qual melhora espontaneamente em menos de 2 semanas.32 Outras complicações incluem visão turva, equimoses locais, exotropia ou endotropia (estrabismo) e diplopia. Alguns pacientes relatam redução acentuada do piscamento, levando a olho seco e queratite.

· Músculos cervicais: disfagia é o efeito adverso mais comum.49 Parece haver relação entre o surgimento de disfagia e a difusão de TBA, seja pela aplicação de altas doses, ou pelos músculos injetados. Boca seca, paralisia da prega vocal e fraqueza da musculatura cervical também podem ocorrer. Comprometimento respiratório é um evento adverso grave que pode ocorrer com injeções na região cervical, em torno da boca e nas cordas vocais. Pneumotórax é uma complicação rara, potencialmente grave, que pode ocorrer por penetração pleural, ao serem realizadas injeções cervicais baixas ou na região dorsal.

4.8 Contra-indicações

Entre as contra-indicações à toxina, incluem-se a hipersensibilidade a ela ou um de seus componentes, o diagnóstico de miastenia gravis ou doenças do neurônio motor. Deve-se evitar a utilização em pacientes gestantes ou que estejam amamentando, assim como em pacientes em uso de aminoglicosídeos e outros potencializadores do bloqueio neuromuscular. Não se deve administrar toxina botulínica a pacientes com infecção local sobre a área a ser injetada. Cuidados especiais devem ser tomados nos pacientes portadores de coagulopatia ou em uso de anticoagulantes.

4.9 Benefícios esperados

Não existe um tratamento que promova a cura definitiva das distonias. Mesmo com sucesso no tratamento com TBA, apenas é possível promover-se um alívio sintomático. Os principais benefícios esperados do tratamento com TBA são:

· diminuição da freqüência e severidade dos espasmos

· diminuição da dor ou desconforto ocasionados pelos espasmos

· melhoria da atividade funcional e qualidade de vida dos pacientes

5. Centros de Referência

Recomenda-se a criação de Centros de Referência, a serem habilitados e cadastrados pelo Gestor Estadual. Estes centros devem ser constituídos por médicos Neurologistas com experiência em distúrbios do movimento, além de Otorrinolaringologistas, quando necessário (distonias laríngeas).

Os Centros de Referência permitirão, além do atendimento de rotina para pacientes com distonia (aplicações da toxina, reavaliações, etc), também a realização de avaliações para aqueles pacientes já em tratamento externo e que forem considerados “casos complexos”, quer seja por dificuldades diagnósticas, ou por prescrição de doses altas da TBA ou periodicidade menor do que a recomendada, ou ainda por falha terapêutica ou ocorrência de efeitos adversos.

Com o objetivo de permitir melhor planejamento e acompanhamento do tratamento de cada paciente, recomenda-se a monitorização de todos os casos com registro de informações relevantes como diagnóstico, sítios de injeções, doses dos medicamentos utilizados, avaliação de respostas, efeitos adversos, entre outras.

A experiência do estado do Rio Grande do Sul com a criação de Centros de Referência em distonia e espasticidade e implantação dos protocolos clínicos do Ministério da Saúde50 para o tratamento com TBA demonstrou, ao longo de 3 anos, uma redução significativa nos gastos públicos com este tratamento, além de permitir uma comunicação ativa e informativa entre a classe médica, contribuindo para o uso racional de medicamentos.51

6. Consentimento Informado

É obrigatória a cientificação do paciente, ou de seu responsável legal, acerca dos potenciais benefícios, efeitos colaterais, contra-indicações e riscos relacionados ao uso do medicamento preconizado neste protocolo, o que deverá ser formalizado por meio da assinatura de Termo de Consentimento Informado.

7. Referências Bibliográficas

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Termo de Consentimento Informado

Toxina botulínica Tipo A

Eu _________________________________________ (nome do(a) paciente), abaixo identificado(a) e firmado(a), declaro ter sido informado(a) claramente sobre todas as indicações, contra-indicações, principais efeitos colaterais e riscos relacionados ao uso do medicamento toxina botulínica tipo A indicados para o tratamento das distonias.

Estou ciente de que este medicamento somente pode ser utilizado por mim, comprometendo-me a devolvê-lo caso o tratamento seja interrompido.

Os termos médicos foram explicados e todas as minhas dúvidas foram resolvidas pelo médico _____________________ (nome do médico que prescreve).

Expresso também minha concordância e espontânea vontade em submeter-me ao referido tratamento, assumindo a responsabilidade e os riscos pelos eventuais efeitos indesejáveis.

Assim declaro que:

Fui claramente informado de que o medicamento que passo a receber pode trazer os seguintes benefícios:

- diminuição da freqüência e severidade dos espasmos;

- diminuição da dor ou desconforto ocasionados pelos espasmos;

- melhoria da atividade funcional e qualidade de vida dos pacientes.

Fui também claramente informado a respeito das seguintes contra-indicações, potenciais efeitos colaterais e riscos:

- medicamento classificado na gestação como categoria C (estudos em animais mostraram anormalidades nos descendentes, porém não há estudos em humanos; o risco para o bebê não pode ser descartado, mas um benefício potencial pode ser maior que os riscos);

- os efeitos colaterais já relatados são: tontura, fraqueza, cansaço, mal-estar, dificuldade para engolir, náuseas, boca seca, secura e irritação nos olhos, visão dupla e turva, lacrimejamentos, sensibilidade a luz, reações alérgicas na pele;

- pode ocorrer dor no local de aplicação da injeção;

- a toxina botulínica vem sendo comercializada por três laboratórios com diferentes nomes comerciais e com diferentes doses preconizadas. Se forem dispensados diferentes nomes comerciais as doses podem ser ajustadas.

Estou ciente de que posso suspender o tratamento a qualquer momento, sem que este fato implique qualquer forma de constrangimento entre mim e meu médico, que se dispõe a continuar me tratando em quaisquer circunstâncias.

Autorizo o Ministério da Saúde e as Secretarias de Saúde a fazer uso de informações relativas ao meu trata­mento desde que assegurado o anonimato.

Declaro, finalmente, ter compreendido e concordado com todos os termos deste Consentimento Informado.

Assim, o faço por livre e espontânea vontade e por decisão conjunta, minha e de meu médico.

O meu tratamento constará do seguinte medicamento:

- toxina botulínica tipo A-1 (TBA-1)

- toxina botulínica tipo A-2 (TBA-2)

- toxina botulínica tipo A-3 (TBA-3)

Paciente:

Documento de identidade:

Sexo:

Masculino ( ) Feminino ( )

Idade:

Endereço:

Cidade:

CEP:

Telefone: (  )

Responsável legal (quando for o caso):

Documento de identidade do responsável legal:

 

 

 

Assinatura do paciente ou do responsável legal

 

 

 

Médico Responsável:

CRM:

UF:

Endereço:

Cidade:

CEP:

Telefone: (  )

 

 

 

 

 

 

Assinatura e carimbo do médico

 

Data

 

                       

Observações:

O preenchimento completo deste Termo e sua respectiva assinatura são imprescindíveis para o fornecimento do medicamento.

Este Termo será preenchido em duas vias: uma será arquivada na farmácia responsável pela dispensação dos medicamentos e a outra será entregue ao paciente.

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