Ministério da Saúde
Secretaria de Atenção à Saúde

PORTARIA Nº 225, DE 10 DE MAIO DE 2010

O Secretário de Atenção à Saúde, no uso de suas atribuições,

Considerando a necessidade de se estabelecer parâmetros sobre a hiperfosfatemia na insuficiência renal crônica no Brasil e de diretrizes nacionais para diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos indivíduos com esta doença;

Considerando que os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) são resultado de consenso técnico-científico e são formulados dentro de rigorosos parâmetros de qualidade, precisão de indicação e posologia;

Considerando a Consulta Pública SAS/MS Nº 16, de 23 de dezembro de 2009;

Considerando a Portaria SAS/MS Nº 375, de 10 de novembro de 2009, que aprova o roteiro a ser utilizado na elaboração de PCDT, no âmbito da Secretaria de Atenção à Saúde - SAS; e

Considerando a avaliação da Secretaria de Atenção à Saúde - Departamento de Atenção Especializada, resolve:

Art. 1º Aprovar, na forma do Anexo desta Portaria, o PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS - HIPERFOSFATEMIA NA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA.

§ 1º O Protocolo objeto deste Artigo, que contêm o conceito geral da hiperfosfatemia na insuficiência renal crônica, critérios de diagnóstico, critérios de inclusão e de exclusão, tratamento e mecanismos de regulação, controle e avaliação, é de caráter nacional e deve ser utilizado pelas Secretarias de Saúde dos Estados e dos Municípios na regulação do acesso assistencial, autorização, registro e ressarcimento dos procedimentos correspondentes.

§ 2º É obrigatória a observância desse Protocolo para fins de dispensação de medicamento nele previsto.

§ 3º É obrigatória a cientificação do paciente, ou de seu responsável legal, dos potenciais riscos e efeitos colaterais relacionados ao uso de medicamento preconizado para o tratamento da hiperfosfatemia na insuficiência renal crônica, o que deverá ser formalizado por meio da assinatura do respectivo Termo de Esclarecimento e Responsabilidade, conforme o modelo integrante do Protocolo.

§ 4º Os gestores estaduais e municipais do SUS, conforme a sua competência e pactuações, deverão estruturar a rede assistencial, definir os serviços referenciais e estabelecer os fluxos para o atendimento dos indivíduos com a doença em todas as etapas descritas no Anexo desta Portaria.

Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 3º Fica revogada a Portaria SAS/MS Nº 845, de 31 de outubro de 2002, publicada no Diário Oficial da União Nº 213, de 04 de novembro de 2002, Seção 1, pag. 78.

ALBERTO BELTRAME

ANEXO

PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS

Hiperfosfatemia na insuficiência renal crônica

1. METODOLOGIA DE BUSCA DA LITERATURA

Considerou-se para a estratégia de busca que o tratamento padrão da hiperfosfatemia é o uso de quelantes a base de cálcio e que já encontra-se bem estabelecida a eficácia idêntica das alternativas terapêuticas carbonato de cálcio e sevelamer quanto à capacidade de reduzir níveis de fósforo(1). Considerou-se ainda que a questão em aberto na literatura é a potencial redução da mortalidade associada a menor incidência de calcificações ectópicas com o uso do sevelamer, a estratégia sistemática de busca restringiu-se a estudos que avaliaram mortalidade como desfecho: "sevelamer AND mortality". Através desta estratégia, pesquisando-se no Pubmed(R) em 01 de dezembro de 2009, foram encontradas 11 publicações classificadas como ensaios clínicos randomizados. Considerando-se, também, a necessidade de avaliar o medicamento lantânio, medicamento novo com potencial de inclusão no protocolo, estratégia de busca semelhante foi realizada: "lanthanum AND mortality". Esta estratégia resultou em duas publicações classificadas como ensaio clínico randomizado. Uma atualização ampla, porém não sistemática da literatura foi realizada para os demais aspectos do protocolo.

2. INTRODUÇÃO

A concentração plasmática de fosfato, que geralmente permanece normal nos estágios iniciais da insuficiência renal crônica (IRC), aumenta progressivamente nos estágios mais avançados da doença. Na fase inicial, há adaptação renal caracterizada por diminuição na reabsorção renal tubular de fósforo, causando assim aumento na fosfatúria nos néfrons remanescentes. Esse processo é basicamente mantido por aumento nos níveis de hormônio da paratireóide (PTH). À medida que a taxa de filtração glomerular cai abaixo de aproximadamente 25ml/minuto, esse mecanismo compensatório não é mais suficiente para manter os níveis de fosfato dentro da normalidade, surgindo então a hiperfosfatemia.(1-4)

Tabela I. Classificação da insuficiência renal crônica de acordo com a depuração da creatinina endógina (DCE).1
Estágio CDE
1 > 90
2 60-89
3 30-59
4 15-29
5 < 15
5D <15 em diálise

Dentre as consequências da hiperfosfatemia citam-se hiperparatireoidismo secundário, calcificações metastáticas, osteíte fibrosa cística e a sua própria contribuição para a progressão da insuficiência renal. A retenção de fosfato é a causa do hiperparatireoidismo secundário da IRC. Este, quando não tratado, pode levar a uma morbidade significativa devido à dor, osteopenia, aumento do risco de fraturas e anemia. Postula-se ainda sua contribuição para hipertensão, doença vascular aterosclerótica, prurido e disfunção sexual.(3,5)

A hiperfosfatemia também promove, junto com o cálcio, a deposição de cristais de fosfato de cálcio em tecidos moles, particularmente nas paredes de vasos e em regiões periarticulares. A ocorrência dessas calcificações extra-articulares é favorecida pela idade, hiperparatireoidismo secundário e ingestão excessiva de cálcio, fosfato e vitamina D. Evidência epidemiológica demonstra associação entre o produto cálcio-fósforo elevado, níveis elevados de fósforo e aumento de mortalidade.(1,3,5) Essas associações têm sido consideradas secundárias à calcificação das artérias coronárias com consequente doença cardíaca isquêmica, infarto miocárdico e parada cardíaca. Além disso, o produto cálcio-fósforo elevado pode causar alterações na microcirculação cardíaca, predispondo os pacientes a arritmias e morte súbita. Esses aspectos assumem relevância maior quando se observa que a parada cardíaca por causa desconhecida, infarto agudo do miocárdio e todas as outras mortes por causas cardíacas, representam aproximadamente a metade de todas as causas de óbito em pacientes que estão em diálise crônica.(1)

Atualmente está bem estabelecido na literatura que o controle da hiperfosfatemia através de dieta e medidas farmacológicas, juntamente com a administração de análogos da vitamina D, podem prevenir ou minimizar o hiperparatireoidismo secundário.(6,7)

Os estudos que utilizaram o lantânio no tratamento da hiperfosfatemia na insuficiência renal crônica mostraram segurança e eficácia semelhante ao sevelâmer.(8,9) Entretanto, em virtude do elevado custo do lantânio, o mesmo não foi incorporado neste protocolo.

3. CLASSIFICAÇÃO ESTATÍSTICA INTERNACIONAL DE DOENÇAS E PROBLEMAS RELACIONADOS À SAÚDE CID 10

-N18.0 Doença renal em estágio final

-E83.3 Distúrbios do metabolismo do fósforo

4. DIAGNÓSTICO

O diagnóstico da hiperfosfatemia é laboratorial, sendo que o ponto de corte utilizado para dosagem sérica do fósforo é 4,5mg/dl.

5. CRITÉRIOS DE INCLUSÃO

CRITÉRIOS DE INCLUSÃO PARA O USO DE QUELANTES À BASE DE CÁLCIO (CARBONATO)

-apresentar IRC em fase não dialítica com níveis de fósforo acima de 4,5mg/dl; ou

-apresentar IRC em fase dialítica com níveis de fósforo acima de 5,5mg/dl que não apresentem cálcio sérico acima do normal, corrigido para albumina sérica.

Em ambos os casos o paciente deverá estar utilizando dieta pobre em fósforo.

CRITÉRIOS DE INCLUSÃO PARA O USO DE SEVELAMER

Serão incluídos no protocolo para o uso do sevelamer os pacientes que apresentarem todos os critérios abaixo:

-insuficiência renal crônica em programa regular de diálise há, pelo menos, 3 meses;

-maior que 18 anos de idade;

-fósforo sérico persistentemente igual ou superior a 5,5mg/dl, com cálcio sérico aumentado (após corrigido para albumina sérica) ou PTH abaixo de 150 pg/mL, em pelo menos três determinações a intervalos mensais;

- uso prévio de quelantes à base de cálcio e apresentação, durante o seu uso, de níveis séricos de cálcio acima do normal (para os valores de referência do laboratório) ou PTH abaixo de 150pg/mL, em pelo menos 3 determinações mensais ou contra-indicação para o uso destes quelantes;

-uso de líquido de diálise contendo menor conteúdo de cálcio, isto é, 2,5 mEq/L;

-estar em acompanhamento com nutricionista, aderente à dieta pobre em fósforo;

6. CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO

Hipersensibilidade ou qualquer uma das contra-indicações aos medicamentos do protocolo.

7. TRATAMENTO

O objetivo do tratamento é reduzir os níveis séricos de fósforo para valores normais em pacientes com IRC 3-5 e 5,5mg/dl ou menor em pacientes com IRC 5D.(1,3) A redução da absorção gastrointestinal de fósforo é crucial para a prevenção da hiperfosfatemia e, consequentemente, do hiperparatireoidismo em pacientes com redução funcional de néfrons.

7.1 TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

DIETA

Uma vez que o fósforo é proveniente da dieta, principalmente das proteínas, os pacientes com IRC avançada, em fase não dialítica, deverão ser submetidos em programas de dieta com restrição protéica. Porém, naqueles que estão na fase dialítica, a restrição protéica deve ser evitada em função do desenvolvimento de desnutrição, ficando limitada ao controle dos excessos na ingestão de leite e derivados. No entanto, mesmo com dieta e tratamento dialítico, a maioria dos pacientes permanece com balanço de fósforo positivo e necessita fazer uso de quelantes do fósforo.(3)

Os pacientes com doença renal crônica em estágio avançado são colocados em dietas com restrição de fósforo, nas quais a ingestão diária oscila entre 540mg e 1.000mg. Entretanto esses pacientes devem ingerir no mínimo 1g de proteína por quilograma de peso, tornando-se difícil conseguir restringir a ingestão de fósforo para menos de 1.000mg por dia. Considerando-se que aproximadamente 60% a 70% são absorvidos, em torno de 4.000 a 5.000mg de fósforo entram no fluido extracelular semanalmente. A maioria dos pacientes hemodialisam 3 vezes por semana, e aproximadamente 800mg de fósforo são removidos por sessão. Com isso, a maioria dos pacientes bem nutridos apresenta um balanço de fósforo positivo. Dieta com restrição de fósforo, além de ser de difícil execução, na grande maioria dos casos, não é suficiente para manter a fosfatemia em níveis desejáveis, ou seja, abaixo de 5,5mg/dl. Portanto, mais de 95% dos pacientes com IRC em fase avançada necessitam fazer uso de quelantes de fósforo junto com a dieta.(3)

Os pacientes devem ser orientados em relação ao consumo excessivo de alimentos ricos em fosfatos, especialmente leite e derivados. O fósforo dietético deve ser restringido a 800 - 1.000mg ao dia, ajustado para as necessidades proteicas, quando o fósforo sérico está elevado: acima de 4,5mg/dl para pacientes com IRC estágios 3 e 4 e acima de 5,5mg/dl para pacientes estágio 5D.(1,2)

DIÁLISE

Para pacientes em programa de terapia renal substitutiva, a concentração de cálcio do dialisato é de grande importância na prevenção da hipercalcemia. Quando se utilizam concentrações de 3,5mEq/l, a cada sessão de 4 horas de hemodiálise, um balanço positivo de 900mg de cálcio pode ocorrer, comparado com balanço neutro de cálcio quando as concentrações de cálcio do dialisato são de 2,5mEq/l. Desta forma, até 2.700mg de cálcio podem ser poupados semanalmente ajustando-se o banho da diálise.(3)

7.2 TRATAMENTO FARMACOLÓGICO

Os medicamentos que contêm cálcio, como o carbonato de cálcio, são atualmente os de primeira escolha. Eles quelam o fósforo na luz intestinal, diminuindo sua absorção no tubo digestivo. O principal problema associado a esses medicamentos à base de cálcio é que eles frequentemente resultam em episódios transitórios de hipercalcemia, exigindo que se reduza a dose de análogos da vitamina D e que se ajuste a concentração de cálcio na solução de diálise.(6,10-12)

O cloridrato de sevelamer é um polímero quelante de fósforo que não contém cálcio nem alumínio e vem sendo proposto como uma alternativa para o controle da hiperfosfatemia em pacientes com IRC em estágios avançados. Os estudos clínicos com esse medicamento foram restritos a pacientes em programa de hemodiálise. Estudos de fase II abertos, de titulação de dose e não comparados com pacientes em hemodiálise, demostraram que o sevelamer é bem tolerado nessa população e reduz os níveis séricos de fósforo bem como o produto cálcio-fósforo.(13-15)

Chertow e colaboradores(16) realizaram estudo de fase II randomizado duplo-cego e controlado contra placebo em 36 pacientes (12 no grupo placebo e 24 no ativo) com seguimento de 8 semanas, tendo observado bioequivalência entre o sevelamer e quelantes à base de cálcio na redução dos níveis de fósforo.

Bleyer e colaboradores,(17) em estudo de fase III randomizado cruzado e aberto, compararam o sevelamer com o acetato de cálcio em 84 pacientes em hemodiálise com fósforo sérico maior do que 6mg/dl. Após um período de washout de 2 semanas, os pacientes foram randomizados para receber sevelamer ou acetato de cálcio por 8 semanas seguidas por 2 semanas de novo washout e após, mais 8 semanas com a troca de medicamentos. As doses foram ajustadas para se obter a máxima redução nos níveis de fósforo. Tanto o sevelamer quanto o acetato de cálcio reduziram os níveis de fósforo em aproximadamente 2mg/dl (P<0,0001). Durante o tratamento com sevelamer, 5% dos pacientes apresentaram pelo menos um episódio de calcemia superior a 11mg/dl, enquanto no grupo dos que receberam acetato de cálcio, 22% o fizeram (P<0,05). Os níveis de PTH diminuíram nos dois grupos, no entanto, mais acentuadamente no grupo tratado com acetato de cálcio. O produto cálcio-fósforo diminuiu nos dois grupos, sem diferença estatística entre eles (P= 0,66). Quanto aos efeitos adversos, não houve diferença entre os dois grupos. Devido ao fato de o sevelamer diminuir os níveis de fósforo e não aumentar os de cálcio, há a hipótese de que o uso desse medicamento possa evitar ou retardar calcificações extra-esqueléticas, principalmente em vasos. Está bem estabelecido que indivíduos idosos com IRC e em hemodiálise apresentam alta prevalência de doença c a r d i o v a s c u l a r.

Goodman e colaboradores,(18) em estudo transversal, estudaram a presença de calcificações coronarianas, através de tomografia computadorizada com emissão de elétrons, em 39 pacientes jovens (entre 7 e 30 anos, com média de 19±7 anos) com IRC e em diálise quando comparados com 60 indivíduos sadios da mesma faixa etária. Enquanto apenas 3 dos 60 controles apresentavam calcificações coronarianas, 14 entre os 16 indivíduos entre 20 e 30 anos do grupo em diálise exibiam essa condição. Dentre o grupo dos pacientes em diálise, os que apresentavam calcificações, além de serem mais velhos (P<0,001), também mostravam os valores médios de fósforo, produto cálcio-fósforo e ingestão de cálcio,sob a forma de quelantes de fósforo, superiores aos dos pacientes sem calcificações.

Chertow e colaboradores(19) publicaram um estudo multicêntrico randomizado comparando o sevelâmer com quelantes à base de cálcio em pacientes em hemodiálise. Duzentos pacientes que, após um período de washout de 2 semanas, isto é, suspensão de todos quelantes, apresentavam fósforo sérico igual ou superior a 5,5mg/dl foram randomizados para receber sevelâmer ou quelante à base de cálcio (acetato ou carbonato de cálcio) e seguidos durante 52 semanas. Nesse período foram submetidos a tomografia computadorizada com emissão de elétrons para avaliar a presença e o grau de calcificação aórtica e coronariana antes de iniciar o tratamento, em 26 e 52 semanas. A análise dos exames foi realizada por um único aferidor, o qual não tinha conhecimento dos grupos. Os resultados mostraram que os pacientes do grupo que usou sevelâmer não apresentaram progressão nas calcificações enquanto os que usaram quelantes à base de cálcio o fizeram de forma significativa.(19)

Assim como no estudo de Bleyer,(17) ocorreu redução nos valores do produto cálcio- fósforo, sem diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos (P=0,12).

Pela existência de dados na literatura relacionando a presença de calcificações vasculares com aumento no risco de eventos cardiovasculares e mortalidade,(20-23) postulou-se que a utilização de quelantes livres de cálcio, como o sevelâmer, por apresentar menor incidência de hipercalcemia, apresentaria menor incidência de calcificações ectópicas vasculares e, consequentemente, poderia diminuir a mortalidade destes pacientes.

O primeiro estudo encontrado desenhado primariamente para avaliar mortalidade foi o de Suki e colaboradores.(24,25) Este foi um ensaio clínico aberto, multicêntrico, que objetivou avaliar mortalidade total e por causa específica (cardiovascular, infecção ou outras) em 2103 pacientes em terapia hemodialítica. Entre os 1068 pacientes que finalizaram o estudo, não foi observada diferença em mortalidade. Este estudo sugeriu que no subgrupo de pacientes acima de 65 anos pudesse haver benefício do sevelâmer. Entretanto, deve-se ter cautela com análise de subgrupo de um estudo aberto e com grande perda de seguimento.

Outro estudo publicado no mesmo ano foi o de Block e colaboradores(26), no qual mortalidade era um desfecho secundário num estudo desenhado para avaliar índice de calcificação coronariana: 127 pacientes foram seguidos por 44 meses após randomização para sevelâmer ou quelantes a base de cálcio. Neste estudo houve uma diferença limítrofe (P = 0,05) sugerindo benefício do uso de s e v e l â m e r.

Uma análise secundária definida a priori do ensaio clínico DCOR (Dialysis Clinical Outcomes Revisited), utilizou como fonte de informações registros do sistema de saúde americano Medicare & Medicaid, uma vez que ocorreram muitas perdas de seguimento pelo estudo clínico. Observou-se que os grupos (quelante com cálcio ou sevelâmer) eram semelhantes entre si exceto pela maior percentagem de pacientes com evidência de doença aterosclerótica no grupo de quelantes a base de cálcio. Realizando-se ajustes para as características basais dos pacientes, não se observaram diferenças nas taxas de mortalidade total (17,7 versus 17,4 mortes/100 pacientes-ano; P = 0,9) ou cardiovascular (9 versus 8,2 mortes/100 pacientes-ano; P = 0,4). Primeira hospitalização, hospitalizações por causa-específica e eventos mórbidos também não diferiram. Desta forma, o benefício teórico de redução de mortalidade baseado em desfechos intermediários de redução de índice de calcificação arterial com o uso de quelante livre de cálcio não se confirmou.(3) O uso de sevelâmer deve ser considerado, portanto, uma alternativa com eficácia semelhante aos quelantes a base de cálcio.

Nos pacientes em que os níveis de fósforo permanecerem elevados apesar de doses altas de quelantes a base de cálcio, a fim de se evitar hipercalcemia, pode-se utilizar hidróxido de alumínio por um período limitado (2 a 4 semanas). Trata-se de um quelante mais potente do que aqueles à base de cálcio, porém seu uso tem sido evitado e, quando usado, deve ser limitado devido aos efeitos tóxicos no sistema nervoso central, ossos e tecido hematopoiético. Nos pacientes que persistirem com níveis elevados de cálcio e fósforo, podese considerar a suspensão ou ajustes na dose de análogos da vitamina D (quando em uso) ou redução dos níveis de cálcio no dialisato (concentração máxima de cálcio 2,5 -3,0mEq/l). O hidróxido de alumínio pode causar toxicidade neurológica, esquelética e hematológica em pacientes em diálise e, portanto, é raramente usado atualmente, exceto por curtos períodos de tempo.(3)

Após considerarem-se essas variáveis, permanecendo o paciente hipercalcêmico e hiperfosfatêmico, pode-se indicar cloridrato de sevelâmer. Esse fármaco deve ter sua utilização restrita aos pacientes em hemodiálise, pois os estudos clínicos incluíram apenas esse grupo de pacientes.

7.3 FÁRMACOS

Carbonato de cálcio: comprimido de 500mg

Cloridrato de Sevelâmer: comprimido revestido de 800mg

7.4 ESQUEMAS DE ADMINISTRAÇÃO

- Carbonato de cálcio: utilizar 0,5 a 4g por via oral, preferencialmente dividida em três vezes, junto com cada refeição, ajustado de acordo com os níveis de fósforo e cálcio;

-Cloridrato de Sevelâmer: iniciar com 800mg junto com as três principais refeições, devendo a dose ser ajustada de acordo com os níveis de fósforo, visando redução para valores abaixo de5,5mg/dl. É importante seu uso via oral junto com as refeições, duas ou três vezes por dia. A dose pode ser aumentada ou diminuída em um comprimido por refeição em intervalos de duas semanas. A dose máxima recomendada é de 7200mg/dia. Deve-se sempre utilizar a menor dose possível com base na dosagem de fósforo sérico.

Recomendações para titulação da dose:

Fósforo sérico Dose de sevelâmer
>6 mg/dl aumentar 1 comprimido por refeição em intervalos de 2 semanas até dose máxima
3,5-6 mg/dl manter a dose vigente
<3,5 mg/dl diminuir 1 comprimido por refeição

7.5 TEMPO DE TRATAMENTO - CRITÉRIOS DE INTERRUPÇÃO

Considerando-se que a insuficiência renal crônica é uma doença sem reversão, a hiperfosfatemia a ela associada também o costuma ser. Desta forma,o tratamento é por tempo indeterminado. Ajustes de doses devem ser feitos periodicamente, sempre ajustandose aos níveis alvos de fósforo, de maneira que raramente o tratamento quelante é interrompido. Reduções de dose são descritos no item acima (Esquema de Administração).

O uso do sevelamer é contra-indicado em pacientes que desenvolvam hipofosfatemia ou obstrução intestinal.

7.6 BENEFÍCIOS ESPERADOS

-Redução nos níveis séricos de fósforo para menos de 6mg/dl (para pacientes em diálise) e 4,5mg/dl (para pacientes em fase pré-dialítica);

-Diminuição dos episódios de hipercalcemia;

-Redução do produto cálcio-fósforo;

- Controle do hiperparatireoidismo secundário;

- Controle da osteodistrofia renal.

8. MONITORIZAÇÃO

Deve ser feita através dos níveis de fósforo sérico, cálcio e bicarbonato, os quais devem ser controlados periodicamente: a cada 12 meses para pacientes com IRC estágio 3, a cada 3 meses para pacientes com IRC estágio 4, mensalmente para os pacientes em diálise e a cada 2 semanas durante os ajustes de doses dos quelantes de fósforo, independente do estágio da IRC. Mudanças de doses devem ser feitas conforme item 7.4, esquema de administração.

9. REGULAÇÃO/CONTROLE/AVALIAÇÃO PELO GESTOR

Há de se observar os critérios de inclusão e exclusão de doentes neste Protocolo, a duração e a monitorização do tratamento, bem como para a verificação periódica das doses de medicamento(s) prescritas e dispensadas, da adequação de uso e do acompanhamento pós-tratamento.

10. TERMO DE ESCLARECIMENTO E RESPONSABILIDADE

É obrigatória a cientificação do paciente, ou de seu responsável legal, dos potenciais riscos, benefícios e efeitos colaterais relacionados ao uso do medicamento preconizado neste Protocolo, o que deverá ser formalizado por meio da assinatura de Termo de Esclarecimento e Responsabilidade.

11. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. K/DOQI clinical practice guidelines for bone metabolism and disease in chronic kidney disease. Am J Kidney Dis 2003 Oct;42(4 Suppl 3):S1-201.

2. Improving GlobalOutcomes (KDIGO) CKD-MBD Work Group. KDIGO clinical practice guideline for the diagnosis, evaluation, prevention, and treatment of chronic kidney disease-mineral and bone disorder (CKD-MBD). Kidney Intern 2009;76(Suppl 11 3 ) : S 1 - S 1 3 0 .

3. Cronin RE, Quarles LD. Treatment of hyperphosphatemia in chronic kidney disease. In: Berns JS, Post TW, editors. UpToDate. 17.2 ed. Waltham, MA: UpToDate; 2009.

4. Drueke TB. Renal osteodystrophy: management of hyperphosphataemia. Nephrol Dial Transplant 2000;15 Suppl 5:32-3.

5. Block GA, Hulbert-Shearon TE, Levin NW, Port FK. Association of serum phosphorus and calcium x phosphate product with mortality risk in chronic hemodialysis patients: a national study. Am J Kidney Dis 1998 Apr;31(4):607-17.

6. Llach F, Yudd M. The importance of hyperphosphataemia in the severity of hyperparathyroidism and its treatment in patients with chronic renal failure. Nephrol Dial Transplant 1998;13 Suppl 3:57-61.

7. Slatopolsky E, Bricker NS. The role of phosphorus restriction in the prevention of secondary hyperparathyroidism in chronic renal disease. Kidney Int 1973 Aug;4(2):141-5.

8. Mehrotra R, Martin KJ, Fishbane S, Sprague SM, Zeig S, Anger M. Higher strength lanthanum carbonate provides serum phosphorus control with a low tablet burden and is preferred by patients and physicians: a multicenter study. Clin J Am Soc Nephrol 2008 Sep;3(5):1437-45.

9. Hutchison AJ, Maes B, Vanwalleghem J, Asmus G, Mohamed E, Schmieder R, et al. Efficacy, tolerability, and safety of lanthanum carbonate in hyperphosphatemia: a 6-month, randomized, comparative trial versus calcium carbonate. Nephron Clin Pract 2005;100(1):c8-19.

10. Loghman-Adham M. Phosphate binders for control of phosphate retention in chronic renal failure. Pediatr Nephrol 1999 Oct;13(8):701-8.

11. Slatopolsky E, Weerts C, Lopez-Hilker S, Norwood K, Zink M, Windus D, et al. Calcium carbonate as a phosphate binder in patients with chronic renal failure undergoing dialysis. N Engl J Med 1986 Jul 17;315(3):157-61.

12. Slatopolsky E, Weerts C, Norwood K, Giles K, Fryer P, Finch J, et al. Long-term effects of calcium carbonate and 2.5 mEq/liter calcium dialysate on mineral metabolism. Kidney Int 1989 Nov;36(5):897-903.

13. Slatopolsky EA, Burke SK, Dillon MA. RenaGel, a nonabsorbed calcium-and aluminum-free phosphate binder, lowers serum phosphorus and parathyroid hormone. The RenaGel Study Group. Kidney Int 1999 Jan;55(1):299-307.

14. Chertow GM, Burke SK, Dillon MA, Slatopolsky E. Long-term effects of sevelamer hydrochloride on the calcium x phosphate product and lipid profile of haemodialysis patients. Nephrol Dial Transplant 1999 Dec;14(12):2907-14.

15. Goldberg DI, Dillon MA, Slatopolsky EA, Garrett B, Gray JR, Marbury T, et al. Effect of RenaGel, a non-absorbed, calcium- and aluminium-free phosphate binder, on serum phosphorus, calcium, and intact parathyroid hormone in end-stage renal disease patients. Nephrol Dial Transplant 1998 Sep;13(9):2303-10.

16. Chertow GM, Burke SK, Lazarus JM, Stenzel KH, Wombolt D, Goldberg D, et al. Poly[allylamine hydrochloride] (RenaGel): a noncalcemic phosphate binder for the treatment of hyperphosphatemia in chronic renal failure. Am J Kidney Dis 1997 Jan;29(1):66-71.

17. Bleyer AJ, Burke SK, Dillon M, Garrett B, Kant KS, Lynch D, et al. A comparison of the calcium-free phosphate binder sevelamer hydrochloride with calcium acetate in the treatment of hyperphosphatemia in hemodialysis patients. Am J Kidney Dis 1999 Apr;33(4):694-701.

18. Goodman WG, Goldin J, Kuizon BD, Yoon C, Gales B, Sider D, et al. Coronary-artery calcification in young adults with end-stage renal disease who are undergoing dialysis. N Engl J Med 2000 May 18;342(20):1478-83.

19. Chertow GM, Burke SK, Raggi P. Sevelamer attenuates the progression of coronary and aortic calcification in hemodialysis patients. Kidney Int 2002 Jul;62(1):245-52.

20. Raggi P, Callister TQ, Cooil B, He ZX, Lippolis NJ, Russo DJ, et al. Identification of patients at increased risk of first unheralded acute myocardial infarction by electron-beam computed tomography. Circulation 2000 Feb 29;101(8):850-5.

21. Mautner SL, Mautner GC, Froehlich J, Feuerstein IM, Proschan MA, Roberts WC, et al. Coronary artery disease: prediction with in vitro electron beam CT. Radiology 1994 Sep;192(3):625-30.

22. Arad Y, Spadaro LA, Goodman K, Newstein D, Guerci AD. Prediction of coronary events with electron beam computed tomography. J Am Coll Cardiol 2000 Oct;36(4):1253-60.

23. Margolis JR, Chen JT, Kong Y, Peter RH, Behar VS, Kisslo JA. The diagnostic and prognostic significance of coronary artery calcification. A report of 800 cases. Radiology 1980 Dec;137(3):609-16.

24. Suki WN, Zabaneh R, Cangiano JL, Reed J, Fischer D, Garrett L, et al. Effects of sevelamer and calcium-based phosphate binders on mortality in hemodialysis patients. Kidney Int 2007 N o v ; 7 2 ( 9 ) : 11 3 0 - 7 .

25. Suki WN. Effects of sevelamer and calcium-based phosphate binders on mortality in hemodialysis patients: results of a randomized clinical trial. J Ren Nutr 2008 Jan;18(1):91-8.

26. Block GA, Raggi P, Bellasi A, Kooienga L, Spiegel DM. Mortality effect of coronary calcification and phosphate binder choice in incident hemodialysis patients. Kidney Int 2007 Mar;71(5):438-41.

TERMO DE ESCLARECIMENTO E RESPONSABILIDADE

SEVELÂMER

Eu, __________________________(nome do(a) paciente), declaro ter sido informado(a) claramente sobre os benefícios, riscos, contra-indicações e principais efeitos adversos relacionados ao uso do medicamento sevelâmer, indicado para o tratamento da hiperfosfatemia na insuficiência renal crônica.

Os termos médicos foram explicados e todas as minhas dúvidas foram resolvidas pelo médico ______________________________ (nome do médico que prescreve).

Assim declaro que:

Fui claramente informado(a) de que o medicamento que pas-so a receber pode trazer as seguintes melhorias:

-Redução nos níveis séricos de fósforo para menos de 6mg/dl (para pacientes em diálise) e 4,5mg/dl (para pacientes em fase pré-dialítica);

-Diminuição dos episódios de hipercalcemia;

-Redução do produto cálcio-fósforo;

-Controle do hiperparatireoidismo secundário e da osteodistrofia renal.

Fui também claramente informado a respeito das seguintes contra-indicações, potenciais efeitos adversos e riscos:

-não se sabe ao certo os riscos do uso deste medicamento na gravidez, portanto, caso engravide, devo avisar imediatamente ao meu médico;

- os efeitos adversos mais comuns incluem diarréia, vômitos, náuseas, gases, má digestão, azia, aumento ou diminuição da pressão arterial, tosse, dor de cabeça, infecções e dor.

- o risco de ocorrência de efeitos adversos aumenta com a superdosagem.

Estou ciente de que este medicamento somente pode ser utilizado por mim, comprometendo-me a devolvê-lo caso não queira ou não possa utilizá-lo ou se o tratamento for interrompido. Sei também que continuarei a ser assistido, inclusive em caso de eu desistir de usar o medicamento.

Autorizo o Ministério da Saúde e as Secretarias de Saúde a fazer uso de informações relativas ao meu tratamento, desde que assegurado o anonimato.

Local: Data:
Nome do paciente:
Cartão Nacional de Saúde:
Nome do responsável legal:
Documento de identificação do responsável legal:
Assinatura do paciente ou do responsável legal
Médico Responsável: CRM: UF:
Assinatura e carimbo do médico
Data:____________________

Observação:

Este Termo é obrigatório ao se cadastrar o usuário para a solicitação do medicamento do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica e deverá ser preenchido em duas vias, ficando uma arquivada na farmácia e a outra entregue ao usuário ou seu responsável legal.

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