A saúde humana e a animal estão indissoluvelmente ligadas. Os seres humanos dependem dos animais para sua nutrição, companhia, desenvolvimento tecnológico, socioeconômico e científico. Por esse motivo, o tema desse Dia Mundial das Zoonoses é “Uma Saúde”.
Zoonoses são doenças transmitidas pelos animais aos seres humanos.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), existem mais de 200 tipos de zoonoses. Cerca de de 60% das doenças infecciosas humanas têm sua origem em animais; pelo menos 75% das doenças infecciosas emergentes dos ser humano, incluindo Ebola, HIV e gripe, têm origem animal; 5 novas doenças humanas aparecem todos anos e 3 delas são de origem animal. Por todo o mundo, as zoonoses respondem por 62% da Lista de Doenças de Notificação Compulsória.
Inserida no conceito de Saúde Única, reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como a interdependência das saúdes humana, animal e ambiental, a preocupação quanto às zoonoses sempre foi pauta pública mundial, mas ganhou destaque com a pandemia provocada pelo Covid-19, que acredita-se ter sido originada em morcegos e transmitida aos seres humanos por meio de pangolins (espécie de tamanduás escamados).
A zoonose é uma doença infecciosa causada por um patógeno que se originou em animais, mas pulou para os seres humanos, diretamente ou através de uma espécie intermediária. Os animais, portanto, desempenharam um papel essencial na manutenção de infecções zoonóticas – bacterianas, virais ou parasitárias – na natureza.
Atualmente, o que se conhece é apenas uma pequena parcela dos vírus que existem na natureza. Muitos deles são descobertos quando uma nova zoonose é detectada. Ao todo, cerca de três quartos das novas doenças (ou doenças conhecidas que ressurgem em novas formas), sejam elas virais ou bacterianas, foram transmitidas por animais.
Uma zoonose pode ser transmitida, dentre outras maneiras, por mordidas e arranhões, contaminação de comida e água, além de contato com fezes e carcaças. Outra forma comum de transmissão acontece durante o abate de animais.
A transmissão pode ocorrer diretamente do hospedeiro. E há casos com animais intermediários, como suspeitam os cientistas que estudam a Covid-19. A contaminação do novo coronavírus, seja de animal para humanos, seja entre humanos, ocorre por gotículas respiratórias ou saliva, espalhadas pelo contato próximo.
Spillover é um termo em inglês que pode ser traduzido como transbordamento e é usado no contexto da ecologia para dizer que um vírus ou micróbio conseguiu se adaptar e migrar de uma espécie de hospedeiro para outra. Foi o que ocorreu com o agente infeccioso causador da Covid-19.
As zoonoses geram impactos não apenas à saúde pública, mas também causam graves perdas econômicas. A busca de soluções para esses problemas, dada a sua complexidade, implica em uma abordagem de cooperação em nível intersetorial e requer contribuição, intervenção e colaboração de equipes profissionais dos setores da saúde humana, animal e ambiental.
Nesse sentido, os governos precisam formular e adotar políticas de saúde pública que levem em consideração os vários fatores que aumentam o risco e dificultam o controle das zoonoses, tais como, mudanças climáticas, desmatamento, incêndios florestais que afetam a biodiversidade genética da vegetação e a destruição do habitat animal, aumento da relação entre humanos e animais selvagens, animais abandonados nas vias públicas, viagens intercontinentais, entre outros.
A definição clássica de zoonoses é a de doenças que são transmitidas de animais para humanos, ou de humanos para os animais.
A transmissão pode ocorrer de forma direta, principalmente através do contato com secreções (saliva, sangue, urina, fezes) ou contato físico, como arranhaduras ou mordeduras. De forma indireta, pode acontecer por meio de vetores como mosquitos e pulgas, por contato indireto com secreções, pelo consumo de alimento contaminado com o agente (viral, bacteriano, fúngico ou parasitário), entre outras.
Exemplos de zoonoses:
Ebola: A última epidemia do vírus ocorreu de 2013 a 2016, e matou 11,3 mil pessoas na África, especialmente na Libéria, Serra Leoa e Guiné. Com uma taxa de fatalidade de 50%, acredita-se que o hospedeiro primário do ebola tenha sido o morcego de fruta. A partir dele, chimpanzés, gorilas, macacos, antílopes e porcos-espinhos foram contaminados, e através do contato com sangue, secreção, órgãos e outros fluidos corporais desses animais, o homem também contraiu a doença.
HIV: O vírus presente em quase 38 milhões de pessoas no mundo tem sua mais provável origem no vírus da imunodeficiência símia (SIV) presente em chimpanzés. Acredita-se que o homem tenha sido contaminado pela carne dos animais, que eram caçados para servir de alimento na África. No corpo humano, o vírus sofreu mutações e, de pouco em pouco, se espalhou pelo mundo, sendo descoberto apenas em 1983, quando ganhou o nome de vírus da imunodeficiência humana (HIV). Já a relação com o primata só seria feita 15 anos depois, em 1999.
Sarampo: Presente em todos os continentes do mundo, o sarampo infecta de 20 milhões a 30 milhões de pessoas e mata cerca de 1 milhão anualmente. Ainda que estabelecida nas populações humanas há dezenas de milhares de anos, acredita-se que o vírus tenha se originado na peste bovina e chegado ao homem pela criação de gado. Para as populações de chimpanzés e gorilas, o sarampo é fatal e impõe riscos à preservação dos primatas. Para visitar esses animais em alguns passeios ecoturísticos, é preciso comprovar que a carteira de vacinação está em dia.
COVID-19: A doença causada pelo vírus SARS-CoV-2 é uma dessas situações que assola o mundo hoje. Um dos casos mais famosos é a peste bubônica, no século 14, transmitida pelos ratos.
Raiva: pode ser passada para os humanos e sua contaminação acontece pelo depósito da saliva, contendo vírus rábico, em pele ou mucosa, pela mordedura ou arranhadura do animal, assim como pela lambedura de pele com ferimento já existente ou de mucosa mesmo íntegra.
Toxoplasmose: é transmitida pelos gatos e sua contaminação ocorre por meio da ingestão dos “ovos” do parasita que são eliminados nas fezes de gatos contaminados.
Leishmaniose: é transmitida pela picada de um mosquito (fêmea) infectado pelo protozoário.
Prevenção e controle:
As ações de prevenção de zoonoses caracterizam-se por serem executadas de forma temporária ou permanente, dependendo do contexto epidemiológico, por meio de ações, atividades e estratégias de educação em saúde, manejo ambiental e vacinação animal.
Os métodos de prevenção de doenças zoonóticas diferem para cada patógeno, mas várias práticas são eficientes na redução do risco nos níveis comunitário e pessoal:
– Diretrizes seguras no cuidado com os animais no setor agropecuário ajudam a reduzir o potencial surto de zoonoses de origem alimentar por ingestão de carnes, ovos, laticínios ou mesmo vegetais;
– Padrões para água potável e remoção de resíduos, bem como proteções para águas superficiais no ambiente natural;
– Campanhas educativas para promover a lavagem das mãos após o contato com animais e outros ajustes comportamentais.
Em relatório lançado no Dia Mundial das Zoonoses, instituído em 6 de julho de 2020, a Organização das Nações Unidas (ONU) identificou a abordagem da Saúde Única (One Health) como a melhor forma de prevenir e responder aos surtos de doenças zoonóticas e futuras pandemias.
O documento “Prevenir a Próxima Pandemia: Doenças Zoonóticas e Como Quebrar a Cadeia de Transmissão”, é um esforço conjunto do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e do Instituto Internacional de Pesquisa Pecuária (ILRI).
De acordo com o estudo, entre as tendências que impulsionam o surgimento de doenças zoonóticas estão a crescente demanda por proteína animal, a expansão agrícola intensiva e não sustentável, o aumento da exploração da vida selvagem e a crise climática.
“Se continuarmos explorando a vida selvagem e destruindo os ecossistemas, podemos esperar um fluxo constante de doenças transmitidas de animais para seres humanos nos próximos anos” (Inger Andersen, diretora-executiva do PNUMA).
O dia 06/7 foi escolhido para lembrar o combate às zoonoses porque nesta data, em 1885, o cientista francês Louis Pasteur administrou, pela primeira vez, com sucesso a vacina antirrábica por ele desenvolvida em um jovem que havia sido mordido por um cão.
Fontes:
Centro Pan-Americano de Febre Aftosa e Saúde Pública Veterinária (PANAFTOSA/SPV-OPAS/OMS)
Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo
KIMURA, Leda Maria Silva. Principais zoonoses
Ministério da Saúde
Núcleo de Telessaúde da Unifesp