Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) divulgou nota técnica sobre os graves impactos ambientais e à saúde causados pelas queimadas descontroladas no Brasil, que atingiram mais de 5,5 milhões de hectares em agosto de 2024.
O documento, produzido pelo Grupo de Trabalho de Meio Ambiente da SBPC, destaca os riscos trazidos pela fumaça gerada pelas queimadas, composta por partículas finas e gases tóxicos, que têm provocado um aumento de internações por problemas respiratórios e mortes por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) em várias regiões do país, especialmente entre crianças, idosos e pessoas com condições pré-existentes.
Contexto
As queimadas descontroladas e incêndios florestais que ocorrem no Brasil nesta segunda metade do ano, especialmente em regiões de biomas sensíveis, têm gerado impactos ambientais severos e consequências preocupantes para a saúde pública. A fumaça resultante desses eventos carrega uma mistura de poluentes particulados e gases, que comprometem a qualidade do ar e expõem a população e o ambiente a riscos substanciais.
A fumaça oriunda da queima de biomassa é composta por material particulado fino (MP2.5), monóxido de carbono (CO), ozônio (O3), e uma série de compostos orgânicos voláteis (COVs), que, quando inalados, são capazes de penetrar nos pulmões e na circulação e podem provocar problemas respiratórios, cardiovasculares e outros efeitos adversos à saúde.
Evidências e dados relevantes
Somente em agosto de 2024, mais de 5,5 milhões de hectares foram queimados no Brasil, contemplando áreas nativas de diferentes biomas, áreas agrícolas e urbanas. A seca prolongada, associada à baixa umidade e ondas de calor, criou um ambiente favorável para a propagação do fogo, o que tem mudado a paisagem de centenas de municípios do Brasil. No campo da saúde, os efeitos estão sendo percebidos no dia a dia de brasileiros e brasileiras de vários estados do Norte, Centro-Oeste, Sudeste e Sul. Em São Paulo, há registros de óbitos acima do esperado por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), em consequência da intensificação dos incêndios recentes. Outras capitais brasileiras registram aumento de internações por problemas respiratórios nas unidades de emergência. Este cenário é indicativo do impacto que a poluição do ar está exercendo, principalmente sobre as populações mais vulneráveis, como crianças, idosos e indivíduos com condições respiratórias pré-existentes.
Análise Crítica das Ações Governamentais
Apesar das ações implementadas recentemente, como a Política Nacional da Qualidade do Ar (PNQAr), o painel VigiAr e o fortalecimento das operações de combate às queimadas descontroladas, esses esforços têm sido insuficientes frente à magnitude dos desafios impostos. Em um evento recente organizado pelo Ministério do Meio Ambiente e das Mudanças Climáticas sobre episódios críticos de poluição do ar, foi destacado que, apesar dessas iniciativas, os parâmetros para a definição de tais episódios permanecem desatualizados há mais de 35 anos. Isso coloca o Brasil em descompasso com as recomendações internacionais sobre os impactos da poluição na saúde humana e agrava os danos à saúde pública. A ausência de uma estratégia coordenada e a falta de clareza nas diretrizes de proteção à saúde da população expõem a necessidade urgente de uma revisão e intensificação das políticas públicas.
Recomendações Técnicas
– Fortalecimento da Legislação e Fiscalização Ambiental: É crucial intensificar as medidas legislativas e de fiscalização para prevenir a ocorrência de queimadas descontroladas e criminosas e mitigar seus impactos, priorizando ações preventivas e de controle.
– Monitoramento Contínuo da Qualidade do Ar: A implementação de um sistema de monitoramento contínuo da qualidade do ar, com ampla cobertura geográfica e temporal, é fundamental para a identificação precoce dos riscos e para a tomada de decisões rápidas e informadas.
– Campanhas de Conscientização e Orientação à População: Devem ser desenvolvidas campanhas educativas que orientem a população sobre os riscos da exposição à fumaça de eventos de fogo, incluindo a divulgação de alertas e diretrizes claras para a redução da exposição durante os episódios críticos.
– Articulação com o Setor de Saúde e Preparação do Sistema de Saúde: É imprescindível que o setor de saúde seja integrado de forma mais eficaz na resposta aos impactos das queimadas descontroladas e da poluição decorrente. Isso inclui o fortalecimento da capacidade de atendimento em unidades de saúde, especialmente nas regiões mais afetadas, e estabelecimento de protocolos de emergência para o manejo de surtos de internações durante períodos de queimadas intensas.
– Investimento em Ciência e Tecnologia: É extremamente importante o investimento em pesquisa científica e inovação tecnológica voltada para o monitoramento, previsão e mitigação dos impactos das queimadas descontroladas e incêndios florestais, além do desenvolvimento de alternativas sustentáveis para a gestão.
Conclusão
A crise das queimadas descontroladas e incêndios florestais no Brasil demanda uma resposta imediata, robusta e coordenada entre todos os setores da sociedade e diferentes níveis de governo. Somente com ações integradas, envolvendo a prevenção ambiental e o fortalecimento da saúde pública, será possível mitigar os impactos desses eventos atuais e de episódios futuros, com vistas a proteger a saúde da população e garantir a preservação dos nossos biomas. A preparação e o alinhamento entre políticas ambientais e de saúde são essenciais para enfrentar os desafios impostos, prevenindo maiores danos e promovendo o bem-estar coletivo.
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