Com uma taxa de letalidade de 100%, a raiva tem uma incidência de 60.000 mortes por ano, globalmente, 40% das quais são crianças. O tema deste ano “Quebrando as fronteiras da raiva” destaca a necessidade de ir além da norma e quebrar as fronteiras para atingir a eliminação da raiva humana transmitida por cães e atingir a meta da Iniciativa de Eliminação definida pela Organização Pan-americana da Saúde (OPAS) até 2030.
Em 2024 celebra-se o 18º Dia Mundial da Raiva, data instituída pela Global Alliance for Rabies Control (GARC) e reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). 28 de setembro marca o dia de falecimento, em 1895, de Louis Pasteur, criador da vacina contra a raiva.
A campanha anual objetiva reforçar a conscientização sobre a prevenção, o combate a essa zoonose e as conquistas alcançadas, enfatizando que a estratégia ‘Saúde Única’ não é apenas para alguns selecionados e, sim, algo que deve estar disponível para todos.
O mundo tem as vacinas, os medicamentos, as ferramentas e as tecnologias para quebrar o ciclo da raiva – uma das doenças mais antigas.
Os programas de controle da raiva oferecem um ótimo exemplo para operacionalizar a “Saúde Única”, destacando a importância de integrar os esforços de saúde humana, animal e ambiental, construindo as estruturas e a confiança que são cruciais para estabelecer sistemas para outras doenças zoonóticas, incluindo aquelas que são propensas a pandemias. Este tema exige estratégias inovadoras e colaboração entre vários setores e regiões.
Ao quebrar fronteiras é possível superar barreiras geográficas, socioeconômicas e educacionais, garantindo vacinação generalizada, conscientização e acesso a cuidados médicos. Esta abordagem unificada é crucial na luta contra a raiva, promovendo um mundo onde a doença não seja mais uma ameaça para humanos e animais.
Destaca-se a necessidade de colaborações intersetoriais e transfronteiriças, reunindo governos, organizações de saúde, serviços veterinários e comunidades. Além disso, há um duplo significado no tema, pois a raiva em si não reconhece fronteiras ou limites e, portanto, é uma doença transfronteiriça.
Na região das Américas, a OPAS, por meio do Pan American Center for Foot-and-Mouth Disease and Veterinary Public Health (PANAFTOSA/VPH), é responsável por coordenar o Programa Regional para a Eliminação da Raiva Humana Transmitida por Cães, fornecendo cooperação técnica aos países desde 1983.
Graças aos esforços dos governos e pessoas da região, à colaboração entre países e à cooperação técnica da OPAS, as Américas conseguiram reduzir drasticamente a incidência de raiva humana transmitida por cães em aproximadamente 98%, diminuindo de 300 casos em 1983 para 5 casos registrados em 2024, até setembro.
De 2017 a 2022, o setor de saúde pública na região vacinou aproximadamente 200 milhões de cães e 36 milhões de gatos gratuitamente para prevenir e controlar a disseminação e a transmissão da doença. Durante o mesmo período, dois milhões de pessoas receberam profilaxia antirrábica pós-exposição.
Garantir acesso equitativo a serviços de saúde e profilaxia pós-exposição para comunidades carentes não apenas salva vidas, mas também fortalece os sistemas nacionais de saúde.
A vacinação canina em massa é a ferramenta mais eficaz e constitui a principal ação para a prevenção da raiva em cães. O Programa Regional de Eliminação da Raiva da OPAS, validado pelos Diretores do Programa de Raiva nas Américas (REDIPRA), recomenda manter uma cobertura vacinal de 80% da população canina como estratégia para interromper a circulação do vírus em hospedeiros suscetíveis e prevenir casos de raiva humana transmitida por cães.
Esse progresso é resultado de campanhas regionais de vacinação canina em massa, esforços de conscientização pública e expansão da disponibilidade de profilaxia pré e pós-exposição para 100% da população exposta ao vírus.
As conquistas dos últimos 40 anos mostram que a meta de eliminar a raiva humana de origem canina (variantes 1 e 2) no continente americano está se tornando cada vez mais possível de ser atingida.
A raiva é uma zoonose causada pelo vírus do gênero Lyssavirus, da família Rabhdoviridae. Infecta animais domésticos e selvagens, e se transmite às pessoas pelo contato com a saliva infectada através de mordidas ou arranhões.
A transmissão normalmente se dá pela mordida, mas também existe a possibilidade de ser contraída pelo contato da saliva do animal raivoso diretamente nos olhos, mucosas ou feridas.
Sintomas:
O período entre o acidente com o animal e o aparecimento dos sintomas é extremamente variável. Pode ser de alguns dias a até anos, com uma média de 45 dias no homem, e de 10 dias a 2 meses, no cão. Em crianças, existe tendência para um período de incubação menor que no adulto.
Após o período de incubação, surgem sinais e sintomas clínicos inespecíficos. Nessa fase, o paciente apresenta:
– Mal-estar geral;
– Pequeno aumento de temperatura;
– Anorexia;
– Cefaleia;
– Náuseas;
– Dor de garganta;
– Entorpecimento;
– Irritabilidade;
– Inquietação;
– Sensação de angústia.
À medida em que a infecção progride surgem manifestações mais graves e complicadas, como:
– Ansiedade e hiperexcitabilidade crescentes;
– Febre;
– Delírios;
– Espasmos musculares involuntários generalizados e/ou convulsões.
O paciente se mantém consciente, com períodos de alucinação, até a instalação do coma e a evolução para óbito. Entre o início dos sintomas até a morte decorrem em geral de 2 a 7 dias.
Prevenção:
Atualmente, com a segurança e a eficácia das vacinas para pessoas e animais, a imunização é a estratégia mais importante para o controle da raiva. Por isso, animais domésticos devem ser vacinados anualmente contra a doença.
Também é importante evitar aproximar-se de cães e gatos sem donos, não mexer ou tocar neles, sobretudo quando estiverem se alimentando ou dormindo. Além disso, nunca tocar em morcegos ou outros animais silvestres, principalmente quando estiverem caídos no chão ou forem encontrados em situações não habituais.
Contudo, ao ser agredido por um animal, deve-se lavar o ferimento abundantemente com água e sabão, o mais rápido possível, e aplicar produto antisséptico. É fundamental procurar assistência médica e informar detalhes do acidente ao profissional de saúde, se o animal tem dono, o local do acidente, entre outras informações.
A profilaxia pré-exposição é uma medida de prevenção que deve ser indicada para pessoas com risco de exposição permanente ao vírus da raiva, durante atividades ocupacionais exercidas por profissionais como:
– Médicos veterinários; biólogos; profissionais de laboratório de virologia e anatomopatologia para raiva; estudantes de medicina veterinária, zootecnia, biologia, agronomia, agrotécnica e áreas afins;
– Pessoas que atuam na captura, contenção, manejo, coleta de amostras, vacinação, pesquisas, investigações ecopidemiológicas, identificação e classificação de mamíferos: domésticos (cão e gato) e/ou de produção (bovídeos, equídeos, caprinos, ovinos e suínos), animais silvestres de vida livre ou de cativeiro, inclusive funcionários de zoológicos;
– Espeleólogos, guias de ecoturismo, pescadores e outros profissionais que trabalham em áreas de risco. Pessoas com risco de exposição ocasional ao vírus, como turistas que viajam para áreas de raiva não controlada, devem ser avaliados individualmente, podendo receber a profilaxia pré-exposição dependendo do risco a que estarão expostos durante a viagem.
O número de casos de raiva canina no Brasil caiu de 635 em 2002 para 9 em 2023; em 2024, foram registrados 8 casos, a maioria envolvendo variantes de animais silvestres. Nos últimos dez anos não houve registro de raiva humana transmitida por cães.
Apesar dos avanços no controle da raiva transmitida por cães, o país enfrenta novos desafios, com o aumento de casos de raiva humana causados por variantes do vírus rábico em animais silvestres, especialmente morcegos. Hoje, a transmissão por morcegos é a principal fonte de infecção da raiva em humanos.
Entre 2010 e 2024, foram registrados 47 casos de raiva humana. Desses, nove foram causados por mordidas de cães, 24 por morcegos, cinco por primatas não humanos, dois por raposas, quatro por felinos, e um por bovino. Em dois casos, não foi possível identificar o animal que provocou a agressão. Na história dos casos de raiva humana no país, apenas dois pacientes sobreviveram.
Fontes:
Ministério da Saúde
Organização Mundial da Saúde (OMS)
Organização Pan-americana da Saúde (OPAS)